11.5.06

Os vencedores da Expovinis

Eis aqui os melhores vinhos apresentados a mais recente edição (a 10ª) da Expovinis Brasil 2006, realizada no início do mês em São Paulo.

Foram selecionados 54 vinhos, agrupados em estilos: oito rosados, 15 brancos (Sauvignon Blanc, Chardonnays e de outras castas), 11 espumantes (Champagne e outros espumantes) e 20 tintos leves (seis nacionais, sete ao estilo de Bordeaux e sete outros: de Portugal, Espanha e Itália). A seleção é a seguinte:

  • Rosados: Torres Santa Digna Cabernet Sauvignon 2005 (Reloco).
  • Brancos com a Sauvignon Blanc: Hunter’s 2004 (Premium).
  • Brancos com a Chardonnay: Trinity Hill 1999 (Premium).
  • Brancos de outras castas: Lodge Hill Jim Barry Riesling 2003 (KMM).
  • Espumantes Cava Brut Nature Juvé y Camps (Península) e Cava Cordoníu Cuvée Raventós (Interfood).
  • Champagnes: Piper-Heidsieck Jean Paul Gaultier Cuvée Special Brut (Interfood).
  • Tintos leves: Quinta de Sauguinhal Óbidos 2000 (Adega Alentejana).
  • Tintos ao estilo Bordeaux: St Hallett Old Block Shiraz 2001 (KMM) e Leo d’Honor Garrafeira Grande Escolha 2001 (Lusitana) – houve, portanto, um empate.
  • Tintos de Portugal, Espanha e Itália: Quinta do Crasto Vinha da Ponte 2003 (Qualimpor).

O objetivo do júri era selecionar os “Dez Mais”. Só que houve empate no grupo de vinhos ao estilo de Bordeaux. E então acabamos com 11 belos vinhos.

O júri. Só degustadores experimentados e de nível internacional. Nos dois primeiros dias, seus integrantes percorreram individualmente os estandes da feira e cada um listou os melhores tintos, brancos, espumantes e rosados que degustaram. As listas foram compiladas e anotados os nomes dos vinhos com mais indicações, havendo algumas eliminações. Foram selecionados, como vimos, 54 vinhos. No terceiro dia, os vinhos foram reunidos e degustados rigorosamente às cegas, por todos os jurados, sob o comando de Jorge Lucki. E o resultado é o que temos acima.

O júri foi integrado por: Stephen Brook, editor da revista Decanter; John Hancock, enólogo neozelandês; José Maria Santana, jornalista colaborador da revista Gula; Marcelo Copello, editor da revista Adega e colaborador da Gazeta Mercantil; Manoel Beato, sommelier-chefe do grupo Fasano; Ricardo Farias, presidente da Associação Brasileira de Sommeliers, Rio de Janeiro (ABS-RJ); Daniel Pinto, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Amigois do Vinho, São Paulo (SBAV-SP); Márcio de Oliveira, diretor de degustações da SBAV-MG; José Luiz Pagliari, professor de Enologia no Senac–SP e Sérgio Inglez de Souza, especialista em vinhos brasileiros. A presidência do júri foi do especialista Jorge Lucki, colaborador do jornal Valor Econômico, e a coordenação esteve a cargo de José Ivan Santos, consultor do evento.

Nas Águas de Maigret

A amiga Roberta Campos Babo andou escrevendo em sua coluna “O que há para ler” na Tribuna da Imprensa sobre a coleção de novelas do célebre inspetor Jules Maigret, criação do belga Simenon, agora editada pela Nova Fronteira – o que me a esse assunto: os hábitos do célebre inspetor com relação às bebidas. No livro mencionado pela Roberta, UM ENGANO DE MAIGRET (o 19º da coleção), revela-se que quando o Maigret inicia uma investigação com Calvados (destilado feito de maçã), por exemplo, era com Calvados que continuava (pg. 166). Assim temos investigações-cerveja, investigações-vinho e até mesmo investigações-uísque (para desespero do inspetor, que aparece em 102 livros de Simenon, o primeiro em 1930 e o último em 1972). Poucos autores escreveram histórias policiais tão bem como o belga. E tão bem sobre as bebidas.

As que aparecem nessas novelas não têm função física, como nas novelas de Dashiel Hammet (com excessos de gim e rye) ou do atualíssimo e ótimo Lawrence Block, cujo herói, o ex-tira Mattew Scudder, só bebe bourbon (para esquecer) e café (talvez para lembrar). Scudder faz o tipo “durão”.

As bebidas em Simenon fazem parte da cultura do francês, do cenário onde se incluem dos bistrôs, os cafés e os restaurantes. Não se bebe para ficar tonto ou esquecer ou por vício. As bebidas parecem indicar um sistema social, apontam para grupos, classes, sexos, regras de hospitalidade e de comportamento. Diferente de qualquer outro detetive, Maigret tenta estudar os homens, entender o meio social. Ele pondera sobre suas impressões, não é analítico, mas imaginativo: busca desencavar um sistema de regras. As pistas que levanta raramente estão ligadas ao crime e ao criminoso. Mas se consegue captar a atmosfera, acaba quase sempre diante do culpado.

E nesse processo de observação, quase que antropológico, os hábitos com as bebidas resultam sempre em boas pistas: é o comportamento que mais claramente indica a estrutura social das personagens. O mundo está dividido entre trabalhadores, a pequena burguesia, a alta burguesia e a aristocracia - divisões mais econômicas do que ideológicas.

O que ele bebeu ao longo dessas 70 novelas?

Por ordem de quantidade: cerveja, conhaque (Armagnac, Calvados, Marc, Conhaques de ameixa e de framboesa), café, vinho (na maioria dos casos, vinhos brancos), licores (Chartreuse, Curaçao), Pastis, Martini, Rum, grogue (um destilado com água quente), e uísque. Só bebeu chá quando doente. Madame Maigret, contudo, só bebia chá de ervas. Era um modelo do figurino feminino.

E o que as demais personagens bebiam?

As mulheres praticamente só bebiam chás e água (de Vichy) e Champagne (apenas as ricas), que o inspetor jamais bebeu, assim como gim (só via um raro Martini) e rum (apenas quando misturado no grogue). Seus vinhos de preferência eram o Beaujolais, o Chavignol, o Pouilly-Fuissé, o Pouilly-Fumé, o Saint-Emilion, o Sancerre e o Vouvray. Interessante é que dessa lista apenas o Beaujolais e o Saint-Emilion são tintos.

Nas aventuras de Maigret, anormalidades seriam não beber (álcool) e não fumar. O natural seria fumar (cigarros ou cachimbo, como ele), beber e comer fartamente. Maigret, portanto, suspeitaria de quem faz greve de fome, só bebe água e não fuma. Inclusive, água para ele nunca foi sinônimo de pureza ou de “limpeza” – que só poderiam acontecer debaixo de lei e ordem, comendo e bebendo à farta, dentro do figurino da época.

Spas perto e longe

Spas de vinho. Quem pensa que Spas de vinho só na Europa, em particular o badalado Caudalie, em Bordeaux, pode tratar de economizar uns trocados e partir para a Argentina. Vá para Mendoza, a capital do vinho do país, e de lá parta para Cayate, a principal região produtora de Salta, umas três horas de van para o sul de Mendoza. Então, no coração do vale Calchaquíes, você encontra fácil o Pátios, um hotel-fazenda de apenas 30 quartos. Ele oferece um spa de vinho como nenhum outro. Você submerge em cascas e talos de uvas (ora tintas, ora brancas) e rejuvenesce se rosto e corpo – não apenas com uvas, mas também com cereais usados pela ancestral cultura dos índios Calchaqui.

O Patios é administrado pelo grupo Starwood, um dos maiores do mundo em hotelaria, com 733 hotéis espalhados pelo globo. Tem cerca de 120 mil funcionários e responde pelo Sheraton, Four Points, St. Regis, Le Meridien, W Hotels, entre outros. Já viu que sabem das coisas e o spa argentino é de primeiríssima ordem.

Não deixe de visitar: Patios de Cafayate Hotel & Spa. Ruta Nacional 40 y Ruta Nacional 68, Cafayate, Salta 4427, Argentina. Telefone: (54) (3868) 421 747. Fax: (54) (3868) 422 753.

Spas de cerveja. Claro que o sucesso dos spas de vinho (tanto que da Europa já chegaram à América do Sul) despertou a atenção da turma da cerveja - principalmente agora que os turistas e torcedores vão chegar, por conta da Copa do Mundo. E agora temos ofertas de banhos de cerveja e outras espumantes terapias vindas da Áustria, Alemanha e República Checa. Acabam de inaugurar os spas com terapias cervejeiras da Chodovar, cervejaria em Chodova Plana, na República Checa. Usam lá a sua famosa e escura “lager”. Banhos de cerveja em ofurôs são a grande oferta da Kummeroer Hof, em Neuzelle, Alemanha.

Mas é na Áustria que esses tratamentos chegam fazem, digamos, a espuma necessária. Uma cervejaria, a Starkenbert (www.bierschwimmbad.com) chega a encher uma piscina com barris e mais barris de cerveja de sua ótima Pilsner. E, bem perto de Salzburg, o Landhotel Moorhof (www.moorhof.com) é o que oferece o mais completo tratamento de cerveja, do spa à mesa de jantar. Quem conhece o assunto diz que cerveja é ótima para a pele em razão de suas vitaminas e fermento. Um banho numa dessas piscinas ou ofurôs custa na casa dos 44 euros (uns 116 reais). E você tem direito a canecos de chope – só para não perder o costume. O problema é não acabar dormindo durante os banhos (ou tratamento, como quiser).

E eu que achava que meu tratamento no Bar Luiz, há 114 anos oferecendo um senhor chope, era o que me bastava.





Vinhos e Vegetarianos

Será que um vegetariano teria problemas em consumir vinhos? Vegetariano seria o adepto de uma alimentação exclusivamente à base de vegetais, claro. Numa versão mais radical, ele não consome produtos de origem animal, nem os que tenham sido testados em animais. São os chamados vegans ou veganos: não consomem carne, peixe, mariscos, laticínios, mel, ovos. E fazem disso uma filosofia de vida: não usam peles, couro, lã, seda, cera de abelha, própolis, medicamentos ou cosméticos testados em animais etc. Algumas fontes ensinam que vegetarianos e vegans (ou veganos) seriam hoje a mesma coisa. Outras estabelecem diferenças. Veja os sites que consultei: aqui e aqui.

Voltando à questão: qual seria o problema de consumir vinhos para vegetarianos ou para os vegans?

É cada vez mais raro no mundo dos vinhos, mas você ainda encontra em vinícolas do Velho Mundo, por exemplo, muitos produtores quebrando grandes quantidades de ovos, separando a clara da gema. O trabalho é lento e cuidadoso, mas eles o consideram essencial.

O objetivo é evitar que essas partículas turvem o vinho.Querem o vinho claro, brilhante, bonito de ver.

Claras de ovo têm sido utilizadas há centenas de anos nas regiões da Borgonha e de Bordeaux, na França, em também em Portugal, por exemplo. Conta-se que na terrinha os monges utilizavam as claras para “afinar” seus vinhos e passavam as gemas para as freiras. Daí o festival de doces com ovos, uma das deliciosas marcas da cozinha portuguesa.

Mas outros elementos têm sido utilizados. E a maioria deles, para infelicidade dos vegetarianos, de origem animal. Gelatinas feitas de tecidos, cartilagens de animais (de vacas e porcos, em particular); aglomerados derivados de crustáceos (da quitina, mais especificamente, a substância que os reveste); gelatinas feitas de vísceras de peixes. Utiliza-se também a caseína, uma proteína existente no leite e até sangue coagulado, de origem animal.

O vinho normalmente contem apenas uvas, fermento e uma pequena porção de sulfitos (sais do ácido sulfuroso, acrescentados ou criados durante a fermentação), que servem para a conservação da bebida.

As claras de ovo e as demais substâncias de origem animal servem de “agentes clarificadores”, que vão clarear o vinho removendo sólidos insolúveis. São células mortas, fragmentos das cascas das uvas, dos talos, sementes, polpas e também colóides, substâncias microscópicas, a maior parte formada de moléculas orgânicas que sobraram do processo de fermentação. Elas respondem, por exemplo, por qualidades como a viscosidade do vinho, o seu “corpo”; como estão em excesso, o produtor quer eliminá-las.

Esses produtores poderiam não utilizar nada e esperar que todos esses elementos se assentassem no fundo dos barris ou dos tanques de armazenamento da bebida, quando então começariam a retirar apenas a parte superior da bebida, devidamente “clarificada”.

Mas isso levaria um tempo enorme, o que resultaria em gastos maiores, pois quanto mais tempo a bebida leva para ser comercializada, mais cara ela fica para o produtor (e, logo, para nós consumidoras).

Então, nossos produtores há centenas de anos começaram a usar claras de ovos e outros elementos para “afinar” seus vinhos mais rapidamente. Eles têm uma polaridade oposta à dos vinhos. Assim, atraem aquelas partículas que turvam a bebida e as levam para o fundo do barril. Fica mais rápido e fácil de retirá-las, em seguida. Além disso, são baratíssimos.

Nem todos os produtores, contudo, utilizam elementos de origem animal. Empregam a bentonita, uma sílica (silicato de alumínio hidratado) natural, que absorve soluções aquosas – ou seja, têm o mesmo efeito das gelatinas. Só que sua origem é a terra. Vinhos clarificados com bentonita são perfeitamente aceitos por vegetarianos. Mas como eles poderão saber? Essa informação não consta dos rótulos.

A verdade é que nenhum desses produtos vai aparecer ou alterar o vinho quando finalmente ele for colocado nas garrafas. Ninguém será capaz de percebê-los. Mas aqui o que conta é o princípio, a filosofia que orienta os vegetarianos.

Contudo, existem vinhos que podem servir a essa filosofia. São aqueles que têm nos rótulos dizeres como “não afinado e não filtrado” (“unfined and unfiltered”), particularmente originários dos Estados Unidos, onde essas palavras servem até para demonstrar uma vantagem mercadológica.

Um vinho marcado como “unfined” não teria passado por um agente clarificador. O vinho às vezes foi filtrado (passou por um filtro microscópico para remover as impurezas), sem que tenha sido “afinado” (não se submeteu aos agentes clarificadores).

Mas isso é o que dizem esses rótulos. Como ter certeza? Um pouco mais seguros são os vinhos “kosher” feitos segundo as estritas leis do judaísmo. A União das Congregações dos Judeus Ortodoxos dos Estados Unidos garantem que os vinhos por ela cerficados não usam qualquer tipo de agente clarificador de origem animal. Mas ressalvam que não podem assegurar as condições de produção dos vinhos kosher de outros países.

Nos supermercados ou lojas especializadas fica praticamente impossível para o vegetariano escolher o vinho mais apropriado: os rótulos não esclarecem nada sobre o processo de filtragem ou “clarificação”. Talvez a solução esteja em consultar importadores ou lojas de sua confiança.

Mesmo alguns refrigerantes e sucos podem conter corantes de origem animal. É uma situação difícil. Na Inglaterra é publicado um guia que orienta os vegetarianos sobre que produtos comprar, inclusive bebidas, sem que se tema por contatos com produtos de origem animais na sua fabricação. Veja aqui.

Talvez os vegetarianos que eventualmente me lêem não tenham ficado muito felizes. Os vinhos deveriam ter mais informações em seus rótulos, só que atualmente apenas um país se preocupa que essa questão, os Estados Unidos, onde os rótulos seguramente vão transformar-se em bulas em pouco mais tempo. É só esperar.