30.11.07

O que dizem os rótulos

Viramos a garrafa de vinho “de costas” – e lá está um segundo rótulo. Seu nome técnico é contra-rótulo, que fornece informações adicionais sobre a bebida. A garrafa “de frente” apresenta o nosso conhecido rótulo, o principal meio através do qual o produtor ou engarrafador se comunicam com os consumidores, já que as prateleiras das lojas e dos supermercados não falam.
Os rótulos numa garrafa de vinho formam uma família cuja missão é aliciar e informar o consumidor. Existem desde 1860 com a criação de uma cola forte o bastante para que pudesse se fixar firmemente nas garrafas. Até então, os vinhos eram vendidos sem rótulos. O consumidor transferia, em sua casa, a bebida da garrafa para decantadores, esses sim possuíam rótulos, no formato de etiquetas, muitas vezes de prata, para identificar o vinho.
Essa família é formada, portanto, pelo rótulo, pelo rótulo de gargalo e pelo contra-rótulo. O rótulo de gargalo é utilizado eventualmente: uma etiqueta em volta do gargalo normalmente indicando apenas a safra.
O rótulo, o painel principal, é o elemento a quem é dada a maior atenção. Algumas vinícolas utilizam grafismos, fotos, desenhos de arte. Apresentam a marca, o nome do vinho e da vinícola, e a variedade ou variedades de uvas utilizadas. Eles são colecionados fervorosamente, seja para recordar vinhos queridos ou momentos marcantes nas vidas dos consumidores. Algumas vinícolas deliberadamente encomendam obras de arte e fazem delas os seus rótulos. É o caso, notório, do Château Mouton Rothschild. Alguns fazem das celebridades os seus motivos. O Marilyn Merlot, com a foto da atriz no rótulo, é sucesso de vendas nos Estados Unidos. Nos últimos anos, os rótulos invadiram os zoológicos e é um tal de gato, cachorro, pingüim, rinoceronte, rã, pato, canguru etc. tentando atrair as nossas simpatias. Transformaram-se até numa categoria à parte nos EUA: são os critters wines, de grande sucesso. (E não me esqueci do galinho preto do Chianti Clássico – mas esse existe antes que as criaturinhas virassem moda). Veja alguns rótulos aqui.
Existe, contudo, uma parte legal obrigatória: Aqui, o Inmetro, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, impõe, no rótulo principal, a indicação do volume contido na garrafa, expresso em mililitros quando o conteúdo é menor do que um litro. Por isso, em negrito, temos os conhecidos 750 ml. O dado referente ao teor alcoólico pode estar no rótulo ou no contra-rótulo. Em algum lugar o produtor tem de especificar percentualmente a quantidade de álcool na bebida. A indicação de 13% de álcool quer dizer que naquela garrafa de 750 ml temos 97,5 ml de álcool etílico.
Ficamos sabendo ainda sobre a classe do vinho: se é fino (utiliza apenas uvas de origem européia, a Vitis vinifera), ou de mesa (uvas americanas ou híbridas), se é leve (teor alcoólico abaixo de 8,6%), licoroso (é o vinho fortificado, como o Porto), composto (adição de extratos aromatizantes naturais); espumante (com informação sobre o método: o Champenoise, utilizado em Champagne, ou Charmat). As informações sobre a cor do vinho já são sabidas. Tinto, rosado ou rosé ou clarete e branco.
Ah, temos também a doçura do vinho. Ele pode ser seco (até 5 gramas de açúcar por litro), demi-sec ou meio seco (de 5,1 até 20 gramas) e suave (acima de 20 gramas). Quanto aos espumantes, temos: o extra-brut (até 6 gramas de açúcar residual por litro), o brut (6,1 a 15 gramas), o seco ou sec (15,1 a 20 g), demi-sec ou meio-seco ou ainda meio-doce (de 20,1 a 60 g) e doce (acima de 60 gramas por litro). A designação Nature, segundo li, está para ser autorizada. Refere-se aos espumantes que não utilizam o “Liqueur d’Expedition” ao final do processo e, por isso, a concentração de açúcar residual é apenas de 1 g/litro.
A variedade de uva utilizada pode ser informada no rótulo, desde que o vinho contenha no mínimo 75% dessa uva. Em Bordeaux, na França, não vemos o nome da uva no rótulo porque na garrafa temos mais de uma uva: Cabernet, Merlot, Cabernet Franc etc.
O Contra-Rótulo. Ele também contém informações reguladas por lei. E, nos últimos tempos, os produtores vêm criando inovações nesse “quintal” das garrafas. Aqui, por lei, é obrigatória a presença da razão social, do endereço e do CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) do responsável. O vinho pode ser produzido e engarrafado (o responsável produz e engarrafa o vinho, obviamente) ou padronizado e engarrafado (o responsável compra vinho de terceiros, o padroniza e engarrafa).
A composição também deve ser informada: além da uva, temos os aditivos e o açúcar utilizado para adoçar os vinhos suaves. Os aditivos mais comuns são o INS 220 (o dióxido de enxofre, um conservante e também antioxidante) e o INS 202 (sorbato de potássio, para evitar nova fermentação em vinhos adoçados). O uso e as doses utilizadas são fixados pelo Ministério da Saúde.
O Código de Defesa do Consumidor obriga a que se informe sobre a validade do produto, ao lado da qual se acrescentam as condições de conservação ideais para o vinho que está na garrafa (temperatura etc). Deve-se ainda incluir advertências sobre beber moderadamente e sobre a proibição de venda a menores. Em letras menores temos o número de lote, dado obrigatório: ele permite que o produto seja rastreado no que respeita a processos, matéria-prima e safra. A advertência “Não contém glúten” é obrigatória, mas desnecessária. Não existe essa substância nos vinhos. Glúten é uma proteína só encontrada na semente de muitos cereais, como o trigo.
Temos ainda o dado sobre o responsável técnico pelo produto, embora não seja obrigatório nomear-se o enólogo. O código de barras está lá para facilitar os sistemas de automação comercial, identificando o item no ponto de venda.
Mas são nas informações opcionais que os produtores mais se expandem. Lá estão dados sobre as características do vinho e sugestões quanto às combinações melhores com alimentos, além das temperaturas ideais para servir a bebida. Muitos incluem ainda amplos dados sobre a região de origem, até mesmo mapas. E aqui eles piram na batatinha (em termos de auto-elogio). Falam que o vinho veio de uma região de muito prestígio, que só produzem vinhos de grande qualidade. Suas regiões são sempre um verdadeiro paraíso. E o seu trabalho é simplesmente perfeito.
Os contra-rótulos dos vinhos do Novo Mundo são loquazes, em contraste com aqueles do Velho Mundo. Os contra-rótulos da Borgonha e Bordeaux indicam nada mais do que o nome do produtor e do importador. Mas acho que um pouco mais de informação seria melhor, mesmo com os exageros.
Às vezes, o impulso promocional faz o produtor colocar uma foto de um sommelier ou chef, por exemplo, quando esse endossa o vinho de alguma maneira. Às vezes, chega a dar o seu nome ao vinho. Se existe um vinho com o nome e a foto da Marilyn, por que não? Em alguns contra-rótulos impera o humor ou o politicamente correto, incluindo-se conselhos sobre a quantidade adequada da bebida para gestantes: uma a duas unidades de álcool uma ou duas vezes por semana.
Temos contra-rótulos extremamente informativos. Além do óbvio (safra, appellation, vinícola), além de mapas da região, temos a área do vinhedo, sua geologia, elevação média, número total de videiras, espaço entre elas, videiras por metro quadrado, toneladas de uva por metro quadrado, hectolitros de vinho por hectare de vinhedo, data da safra. E, mais: quanto tempo o vinho ficou em barril e que tipo de barril, se houve ou não fermentação malolática ou se o vinho foi filtrado. Assim são os contra-rótulos da norte-americana Calera, considerada uma das principais produtoras de Pinot Noir do país.
Se a leitora encontrar um rótulo ou contra-rótulo exótico, fora do comum, por favor, fale aqui com a Soninha.
Da Adega.
Curso para Juiz Avaliador de Vinhos. Sim, agora temos um curso internacional de formação para juízes avaliadores de vinhos – inédito até agora no Brasil. O curso resulta de uma parceria da Escola de Gastronomia da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e do Instituto Italiano de Culinária para Estrangeiros (Italian Culinary Institute for Foreigners - ICIF). O programa está sendo apresentado hoje em São Paulo, no restaurante In Cittá Magazzino Gastronômico, pela professora de Gastronomia da UCS, Maria Beatriz Dal Pont, e pelo jornalista e sommelier Roberto Rabachino, presidente da Federazione Italiana de Sommelier. O curso será iniciado em 2008. A Escola de Gastronomia da UCS tem sede em Flores de Cunha, RS. Informe-se
aqui.
Dinastia, o melhor tinto. O Dinastia, da vinícola H. Stagnari, empresa familiar baseada na região de La Caballada, Uruguai, foi eleito o Melhor Vinho Tinto, no concurso Vinalies, realizado no Chile. O vinho já tinha se consagrado Campeão de Vinhos Tintos 2007, na “Competição Internacional de Vinhos de Liubliana” (capital da Eslovênia, na Europa Central). A Stagnari, liderada pelo enólogo Hector Stagnari, faz vinhos desde 1925. O Dinastia utiliza a uva Tannat, variedade mais representativa da vitivinicultura uruguaia. Está chegando ao Brasil pela
Cantu Importadora. Mais informações pelo telefone 0300-210 1010.
Sementes da Discórdia. É um livro sobre os polêmicos transgênicos, logo de grande importância para toda a sociedade, pois soma ameaças à agricultura, meio ambiente, alimentação, saúde e consumo. Numa resenha feita por um dos autores, Gabriel B. Fernandes, observa-se que a questão dos transgênicos vem sendo apresentada pela mídia de modo simplista, na base do contra ou a favor. E, no fim das contas, com o debate despolitizado, a transgenia acaba sinônimo de biotecnologia. No livro, discute-se principalmente “o problema por ora insolúvel da corrente contaminação de sementes e lavouras de agricultores que não querem plantar transgênicos e o que isso representa para a sustentabilidade do desenvolvimento rural...” Transgênicos, Sementes da Discórdia, Editora Senac, de Antonio Márcio Buainain e José Maria Silveira (Unicamp), Gabriel B. Fernandes (As-PTS) e Ricardo Abramovay (FEA/USP). R$ 35,00.
Os vinhos da Perez Cruz. A importadora e exportadora
Wine Company apresentou ontem, 28, os vinhos da chilena Perez Cruz, através de uma degustação comandada pelo enólogo da vinícola, Germán Lyon, no restaurante Terzetto, em Ipanema. A Perez Cruz, fundada em 2002, está localizada na região de Maipo Alto, berço da maioria dos vinhos premium do país. O seu Syrah Limited Edition 2004 foi classificado entre os 100 melhores vinhos de 2006 pela Wine Enthusiast.
Denis Dubourdieu. Ele é um misto de cientista, empresário e produtor de vinhos. Uma das maiores autoridades da França em processos de envelhecimento de vinhos brancos, é professor de Enologia na Universidade de Bordeaux e concentra seus estudos em leveduras, aromas e colóides. Pois não é que deixei de conhecer Dubourdieu em pessoa. Problemas de morar longe e de contar apenas com um jipe decadente.
Pois o francês em participou dia 26, segunda-feira, de um almoço harmonizado com seus famosos vinhos. Além de tudo, um almoço, no Le Pré-Catelan, criado pelo chef Roland Villar. A
Denis Dubourdieu Domains produz vinhos em várias regiões: em Sauternes, Graves e nas Premières Côtes de Bordeaux.

22.11.07

Vinho e engenhocas

Este é o melhor dos tempos para quem gosta de vinhos – aqui e em todo o mundo. Nunca, em toda a história, tivemos tantas e tão variadas ofertas da bebida. E nunca tivemos também tantas engenhocas (ora práticas, ora nem tanto) para lidar com a bebida. São centenas de tipos de abridores, decantadores, invenções mil para facilitar ou atrapalhar a nossa vida. Aproveito para testar você, leitor: por acaso conhece algumas das engenhocas abaixo?
1. Rotor Automático para Vinhos. Girar a taça para liberar os aromas do vinho: essa é a primeira coisa que você faz após ser servido. Pois agora existe esse aparelinho, que em inglês se chama “Automatic Wine Twirler”. Resume-se numa base circular, ligada a uma pequena caixa, onde está um motor elétrico movido a pilhas. Vem nas velocidades “Jovem”, “Meio Maduro” e “Maduro” – que apenas aumentam o número de giros. Se o vinho for muito jovem (um, dois anos), ela vai girar mais vezes. E menos para os vinhos mais maduros. Para cada variedade de uva existe também uma velocidade determinada: para a Cabernet, Pinot, Merlot, Shiraz, Chardonnay, Sauvignon Blanc e Riesling. Os giros são cuidadosos para que não haja respingos no seu vizinho. Pode ser colocada na mesa ou num balcão de restaurantes. E também pode ser utilizada em casa. É muito silenciosa.
2. Jaqueta Dental Sensitiva para Vinhos. O caso é que o vinho não tem sabor de vinho, mas de frutas vermelhas ou pretas, de chocolate, baunilha, pistache, morango, couro, tamarindo, terra, algum mineral, asfalto, limo etc., etc. Então criaram esse sensor, com o formato de uma jaqueta dental, para se ajustado a um de seus caninos. Esse sensor analisa a menor gota de vinho, descobrindo taninos, aldeídos, antocianinas, ésteres etc. etc. E, mais: funciona como um “ponto”. A informação é passada a um aparelho colocado no seu ouvido, misto de receptor e transmissor, que informa a composição do vinho: “um toque de pêra e ameixa harmonizando com uma forte sensação de pimenta do reino e canela e um traço de carvalho”. Você vai desbancar o maior dos degustadores. O problema é o custo: dois mil dólares. Em inglês é chamado de “Tooth-Mounted Flavor Sensor”.
3. Acelerador Temporal. Um aparelho que acelera a idade do vinho. Se o vinho é de 2002, ele amadurecerá 10 anos em um minuto, através de um campo magnético, colocado num cilindro onde você repousa a garrafa. Em vez de comprar um vinho mais maduro, normalmente bem mais caro, compre um novo que terá o mesmo resultado, diz a propaganda do “Temporal Acceleration Device”.
4. Alerta para dores de cabeça. É um detector de aminas (ou aminas biogênicas) tidas como as causas de dores de cabeça provocadas principalmente pela tiramina e histamina nos vinhos tintos. O modelo atual tem o tamanho de uma pasta para documentos. Mas um modelo menor, portátil, está sendo utilizado para uso em restaurantes. Uma gota de seu vinho é escaneada pelo aparelho que indica a presença dessas substâncias. O aparelho foi desenvolvido pela Universidade da Califórnia, em Berkely, a partir de equipamento criado pela NASA para achar vida em Marte. Ainda não tem um nome comercial.
5. Decantador a vácuo V1. É o Metrokane V1: de cristal, faz o que todo o decantador faz: guarda vinhos depois de retirados os sedimentos e os areja, despertando seus aromas, além de dar uma graça extra ao servirmos a bebida. E o mais importante: agora, se sobrar vinho, alguns decantadores podem preservar a bebida. É o caso do Metrokane V1. Tem uma tampa de borracha com uma abertura especial para um bombeador manual retirar o ar do vasilhame – e assim, criando vácuo, impedir que o oxigênio danifique a bebida. Na tampa, temos um registro, onde uma seta indica, quando atinge uma faixa vermelha, a hora de parar de sugar o ar. Custa U$ 80,00. Veja o decantador V1 aqui (e mais um saca-rolhas “Rabbit” e um funil com filtro para recolher sedimentos do vinho).
6. Preservador de Vinhos. É o Wine Steward (“Camareiro do Vinho”). Parece uma garrafa térmica. Você bebe um pouco do vinho e, antes de guardá-lo, abre a tampa do WS, coloca lá a garrafa, fecha a tampa, aperta um botão e o equipamento carrega gás argônio que, mais pesado que o ar, retira todo o oxigênio do vinho. Pronto, agora você pode rearolhar a garrafa que a bebida estará preservada por duas semanas, pelo menos. Mas o Wine Steward faz mais. Se o vinho esquentou além do devido, repita a operação. O equipamento pode resfriar a bebida em minutos. Veja só o filmete. Custa 200 dólares.
7. Adega Angelshare. É, até agora, a que mais perfeitamente regula a temperatura e a umidade dos vinhos. Mantém a temperatura da bebida sempre dentro do ajuste desejado (12º, 14º ou 16º). A mesma coisa acontece com a umidade: por mais que se altere externamente, a adega manterá sempre os seus 65%. É silenciosa, sem vibrações, pois não emprega compressores. E nem utiliza gases como fréon, nocivos ao ambiente. Oferece também proteção para raios ultravioleta. Existe nas versões para uma garrafa ou para meia dúzia. Veja uma demonstração aqui, com o modelo para seis garrafas. O modelo para uma só pode ser visto nessas fotos.
8. Robô Sommelier. Desenvolvido pela japonesa NEC, esse pequeno robô (61 cm de altura) pode diferenciar um vinho bom do ordinário, recomendar um prato para acompanhar e até dizer a marca da bebida. É um boneco eletromecânico, com olhos, cabeça e lábios que acendem com o robô “fala”. Mas a degustação do vinho é feita na extremidade do braço esquerdo do boneco, onde existe um espectrômetro infravermelho. Quando objetos são colocados diante do sensor, o robô dispara um feixe de luz infravermelha. A luz refletida é, então, analisada em tempo real, determinando-se a composição química do objeto. Quando identifica um vinho, o robô fala, numa voz de criança, o nome da marca e acrescenta comentários sobre o gosto, se é um Chardonnay amanteigado ou um Shiraz encorpado – e que tipos de alimentos acompanham bem o vinho estudado. A máquina pode ser programada para reconhecer as várias espécies de vinhos. Porém, dos milhares de vinhos existentes, o boneco só consegue ser programado para identificar umas duas dúzias. Além disso, ele se atrapalha ao analisar garrafas já abertas, quando vinho começa a respirar e, assim, a se transformar quimicamente. Um fotógrafo colocou a sua mão no sensor e o sommelier do futuro o identificou com bacon. Tomara que gastem um bom tempo melhorando esse boneco.
9. Termômetro Digital. É o Taylor Wine Thermometer, feito, claro, pela Taylor Precision Products, especializada há 150 anos. Esse termômetro oferece um visor digital. Abaixo dele, temos uma tampa de borracha seguida por um longo sensor. Basta substituir a rolha da garrafa pelo termômetro, que deixará o vinho tampado. Coloque a garrafa na geladeira (ou no balde com gelo) e, de vez em quando dar uma olhada para checar a temperatura. A luva protetora da peça traz impressa uma lista com as temperaturas de serviço adequadas para cada tipo de vinho. Veja aqui.
10. Camisetas. Pois tem uma companhia (também americana) especializada em camisetas com dizeres especiais sobre vinhos. Coisas do tipo: “Best drunk young” (“Melhor beber jovem”), “Ahhh, the terroir” (“Ahh, o terroir”), “I love a good corkscrew” (“Adoro um saca-rolhas”), “Think big, Think Cabernet” (“Pense grande, pense Cabernet”). E vai por aí, com muito segundo sentido, em inglês. De uma olhada aqui.
Engenhocas e artigos como esses não param de ser criados. E os entusiastas não param de procurá-las e comprá-las. Talvez seja por isso que muita gente ainda veja a bebida com medo e suspeita. Ache que é bebida de esnobes. Vinho devia ser vendido como cerveja, nos mercados, sem jargões complicados e um instrumental complicado, como o acima citado.
Por falar nisso, as três primeiras engenhocas são criações do humorista Lore Sjöberg, que escreve de vez em quando na revista Wired. Eu só coloquei mais algumas pimentas. Sjöberg buscou justamente ridicularizar essa face esnobe, elitista de uma bebida que deveria ser tratada com mais simplicidade, aliviando a cautela com que a maioria dos consumidores vêm o mundo dos vinhos, achando que somos todas um bando de esnobes.
Os demais equipamentos ou artigos existem de fato. O de número 4, “Alerta para dores de cabeça” está em testes. Falta apenas criar um modelo portátil para entrar em uso comercial. O robô japonês (número 8) também existe: só estão vendo se ele não confunde mais alhos com bugalhos, como fez com a mão do fotógrafo.
Se a amiga quiser mais sugestões de engenhocas para esse Natal é só usar o nosso e-mail.
Da Adega.
Taça para degustação às cegas
. Atenção que já chegaram ao Brasil as taças alemães Schott Zwiesel especiais para degustação às cegas. São negras (para que ninguém saiba o vinho que está provando), de cristal de titânio (mais resistentes). Devem ser bem mais em conta que as caríssimas Riedel. Podem ser encontradas na Humaitá Louças. Peça pela taça Sensus. Veja o endereço no site da
Humaitá ou fale com a Joana Carvalho.
Amante Malbec Rosé. É o novo lançamento da Casa Valduga – um vinho numa garrafa que lembra perfume, que lembra romance, que lembra momentos de vida feliz. A varietal, a Malbec, foi produzida em vinhas brasileiras da
Valduga.

15.11.07

Música em sua taça

Que estilo de música você escuta enquanto degusta o seu vinho? Beethoven ou Chitãozinho e Xororó, Tom Jobim ou Elymar Santos? Cuidado, pois acaba de ser criada mais uma teoria nesse mundico dos vinhos já tão lotado de teorias.
Na verdade, eu deveria hoje fazer referência, mais uma vez, à chegada do Beaujolais Nouveau em todas as lojas do mundo. Dizem que estão lançando uma versão rosé. Pra quê, se o Nouveau já funciona de fato como um rosado?
Mas optei por falar dessa história sobre música e vinhos, que, juram: é verdade verdadeira.
Um conhecido enólogo e consultor de vinhos da Califórnia, Clark Smith, dono da Vinovation, garante que a música que você está ouvindo influencia o gosto do vinho que você está, ao mesmo tempo, degustando. Não, não se trata de atuar sobre os seus humores, o ambiente que o cerca ou sobre as pessoas em volta de você.
Smith garante que diferentes tipos de música vão fazer o vinho ser mais ou menos saboroso. Uma simples canção que pode elevar o seu Pinot Noir a um grau de suprema excelência. Ou deixar o seu Cabernet Sauvignon num estado execrável.
Smith é preparadíssimo: já passou pelo M.I.T., é enólogo graduado pela famosa Universidade da Califórnia, em Davis, já foi produtor da Vinícola R.H. Phillips (250 mil caixas por ano). Em 92, patenteou um sistema de redução e ajuste de álcool via a tão falada osmose reversa (osmose: um liquido, no caso, o vinho passa através de uma membrana, saindo de uma solução mais concentrada para outra menos concentrada). Ele está no meio da grande controvérsia que cerca vinhos com muito álcool. Entregam para ele um vinho com 12% de álcool e ele devolve a bebida com 15, 16% ou mais, como é a grande moda atual entre produtores interessados em agradar críticos como Robert Parker. Mas pode acontecer o contrário: de um vinho com 17% e ele o reduz para 12%. O freguês escolhe. Ele sabe o que faz. E acredita firmemente que o produto final sairá equilibrado, harmônico etc.
Acredita também, honestamente, que a música pode mudar o sabor dos vinhos. Ele realizou testes, onde um Cabernet de Bordeaux parece ficar melhor ao som da Metallica, famoso grupo norte americano de heavy metal.
Garante que uma determinada polca (tocada por uma banda local) transforma um ordinário Zinfandel branco em algo bem melhor do que a maioria dos seus tintos, mais caros. Na verdade, diz que polca só combina com Zinfandel branco. E com mais nada.
Revela que os vinhos tintos, na média, melhoram substancialmente com músicas que ofereçam uma “emoção negativa”. Não gostam de música alegre. Os Pinot Noir não gostam de música sensual. Os Cabernets gostam de músicas “zangadas”, como as da Metallica. Daí a dificuldade de encontramos uma música que seja boa ao mesmo tempo para a Pinot e para a Cabernet.
Apesar de ser um tecnólogo inveterado, Smith afirma que os vinhos possuem sua própria melodia. É um místico que ainda acredita na antiga idéia grega de separar os pensamentos e atividades entre as lógicas (que seriam originárias de Apolo, segundo ele) e as intuitivas (nascidas de Dionísio). Francamente, não entendi as analogias com os deuses gregos. Até hoje, não conheci um só deles cujo perfil apontasse para um ser lógico, coerente, racional. A lógica, o bom senso, o caminhar conforme as regras eram tarefas mais afinadas com os mortais, na maioria das vezes. Também não atino que pudessem ser apresentados como intuitivos: eles eram mais para espertos, estabanados, de caráter suspeitíssimo, mas ao mesmo tempo ingênuos.
O enólogo não sabe ainda explicar a razão pela qual o binômio vinho-música interfere em partes de nosso cérebro. Não consegue ainda explicar como, fisiologicamente, a Cabernet torna-se significativamente melhor com os The Doors (uma banda de rock americana que existiu entre 60 e 70, onde pontificava o lendário Jim Morrison), ou com a abertura da Carmina Burana, do que com Mozart ou os Beach Boys.
Já que “a música é o vinho que enche a taça do silêncio”, segundo o guitarrista e compositor Robert Fripp, não é de estranhar que tenhamos agora essa moda de música. O que não é uma exclusividade do Clark Smith.
O produtor Jean-Marie Zerr, da Alsácia, jura que a complexidade aromática de suas uvas, em particular as Gewürztraminer, melhorou substancialmente a partir do momento em que começaram a ouvir Brahms, Schubert, Mozart, Vivaldi, entre outros.
Zerr usa música clássica e um conjunto de sons estranhos, que só as uvas conseguem entender, mas que “não adequados aos ouvidos humanos”. Seus vizinhos já estão achando que ele é um caso perdido.
De qualquer modo, a hipótese da música de Bach ou de Tchaikovsky influenciar toda uma vinha está sendo pesquisada seriamente pela Universidade de Florença, Itália, a partir das experiências de um outro vinicultor, o toscano Giancarlo Cignozzi, que produz o famoso Brunello di Montalcino.
Um especialista italiano em neurobiologia vegetal, professor Stefano Mancuso, já começou a reproduzir em laboratório o que realizam esses vinicultores melomaníacos. E ele garante: “Os efeitos da música ou das freqüências sonoras sobre o crescimento das plantas são notáveis”.
Não sei, não. Uma amiga querendo livrar-se de um namorado, mas temendo ser indelicada, gravou o Soneto da Fidelidade, dito pelo próprio autor, o mestre Vinicius de Moraes. Fez um CD inteiro com o soneto – aquele que termina assim: “Eu possa me dizer do amor (que tive)/Que não seja imortal, posto que é chama/Mas que seja infinito enquanto dure.”
O rapaz foi a casa dela, jantou, conversou sobre o tempo, o trabalho, pediu cerveja e mais cerveja e depois um cafezinho. E o CD não parava de tocar, era também infinito. O namorado se fez de surdo ou era bronco mesmo. Sequer emitiu um comentário sobre o fundo musical neuroticamente repetitivo. Não adiantou nada. Foi embora com beijinhos e tudo. Ela optou por mandar uma carta encerrando o namoro. Estão casados desde então.
Desconfio que se colocar qualquer clássico para acalmar os meus cachorros e evitar que chacinem minhas galinhas, o esporte preferido deles, não vai adiantar nada. O mais seguro seria colocar um som eletrônico, tipo bate-estaca, bem alto para espantar as penosas para bem longe de feras residentes.
Também não sei o que faço com os vinhos que consumo habitualmente. Como resolver, por exemplo, a questão do premiado Rio Sol? É um dos vinhos servidos ao Papa Bento XVI quando visitou o país e feito numa vinícola à beira do rio São Francisco, Pernambuco. Devo degustar esse vinho, um Cabernet-Shiraz, ao som de um baião, de um coco, de um afoxé, frevo, jongo, maracatu, ou quem sabe de um xaxado, um batucajé? Um perigo arriscar.
Enfim, amigas, cada enólogo com a sua mania. A leitora tem alguma particular preferência musical quando degusta um vinho? Ou o som que prefere é o do papo entre amigos ao redor da mesa? Conte para nós aqui.
Da Adega.
Sabores do Sul da França
. Não vamos esquecer que o festival Sabores do Sul da França termina dia 17, depois de amanhã. Ele acontece em 45 restaurantes do Rio, Niterói, Búzios e Petrópolis, onde harmonizarão vinhos do Languedoc-Roussillon com a gastronomia de cada casa. Só tem feras da cozinha francesa no festival: Troisgros, Roland Villard, Olivier Cozan, e muitos cobras nacionais. Saiba mais com a Juliana (juliana.castanheira@approach.com.br).
Etchart Cosecha Tardia no Brasil. A Pernod Ricard está lançando no mercado o Etchart Cosecha Tardia (“Colheita Tardia”, um vinho doce natural), da
Bodegas Etchart, fundada em 1890, uma das mais antigas da Argentina. O vinho já chega premiado (o único colheita tardia medalha de ouro na feira Vinhos & Bodegas de Buenos Aires. Utiliza as uvas Torrontés, de origem espanhola, parenta da Moscato, é a variedade de uva branca mais utilizada naquele país. Uma preciosidade.
O Etchart Cosecha Tardia vem com um amarelo ouro brilhante, um buquê de flores e frutas intenso e complexo, além de notas de rosas, jasmim, pêssego e frutas cítricas. Você não pode perder. Mais informações no site da
Pernod Ricard ou através do SAC: 0800 014 20 11.

8.11.07

Os vinhos e o seu nasal

É muito comum encontrarmos nas críticas de vinho uma observação sobre a partir de quando um vinho estará “pronto” para ser bebido. Mas e se víssemos essa questão do nosso ponto de vista: até quando estaremos no domínio pleno de nosso potencial olfativo – para provar não só os vinhos, mas as comidas e tudo o que nos der prazer?
Nas resenhas das revistas, os críticos fazem uma estimativa complexa e ousada, para a qual precisa realmente ter muito treino, conhecimento e um senhor nariz, um sentido de olfato privilegiado. Normalmente, são avaliações conservadoras. Quando recomendam que um determinado vinho da safra de 2000 deve ser bebido depois de 2010, esperam que em 2011 a bebida tenha atingido aquele ponto em que as imperfeições de sua juventude tenham sido aplacadas e a bebida conquistado todas as suas melhores qualidades.
E o que acontece com os sentidos de olfato e paladar na medida em que envelhecemos? Já fui curadora de alguns leilões de vinhos de gente que tinha guardado o seu rico acervo para bebê-lo e não esperar vendê-lo por mais dinheiro. Mas aí a idade chegou e esse povo não conseguia mais distinguir sardinha de bacalhau. Aí, resolviam desfazer-se de sua adega. Muitas vezes, os donos dessas garrafas morriam antes de poderem provar do seu precioso acervo.
A verdade é que só pensamos no nosso sentido olfativo quando cheiramos alguma coisa particularmente agradável ou desagradável. Nossa habilidade em detectar e reconhecer odores ajuda até mesmo a amoldar o nosso mundo mental.
Odores podem nos trazer de volta memórias de lugares e de pessoas, freqüentemente envolvidas com os estados emocionais que associamos com elas. Quando Proust faz o seu personagem provar uma madeleine, ele é transportado para outro tempo e outro lugar. E assim, a partir dos odores desse bolinho, ele construiu uma das maiores obras da literatura universal, Em busca do tempo perdido.
É bem provável que o sentido do olfato tenha sido até mais importante para os nossos ancestrais. Talvez já não seja assim tão vital para nós como ainda é para os animais, que usam seus narizes para caçar (ou para não serem caçados). De qualquer modo, nossa habilidade em distinguir cheiros como os de comida estragada, de vazamentos de gás e de cigarros pode representar até mesmo uma questão de vida ou de morte.
Notamos mais os sentidos de olfato e paladar quando comemos. Os sistemas olfativo e de paladar operam alinhados de modo a nos proporcionar os sabores das comidas e bebidas. Se perdermos o sentido do olfato, logo veremos que também ficamos privadas do nosso paladar, mesmo que nossas papilas gustativas estejam respondendo normalmente. Juntos, olfato e paladar podem fazer do comer e beber um prazer estético.
O olfato é, de longe, nosso mais poderoso dos sentidos. Pode discriminar entre dezenas de milhares de diferentes aromas. É capaz de determinar alguns dos componentes de um vinho em níveis iguais a uma única parte por trilhão. Um exemplo disso é o célebre componente TCA (2,4,6 Trichloroanisole), o responsável principal pela “doença da rolha”, sobre a qual vivo falando aqui. Algumas pessoas podem detectar o TCA na razão de uma parte por trilhão – que é igual a um simples segundo em 32 anos! Contudo, comparadas com o meu Labrador, o Ignácio, nossas qualidades olfativas tornam-se realmente patéticas. O Ignácio sabe que estou chegando em casa há uns três quilômetros de distância. Podem acreditar.
Hoje, sabemos mais sobre esse importante sentido, através de muitas pesquisas científicas medindo as muitas e diferentes capacidades olfativas das pessoas, abrindo as portas para novas descobertas. Sabemos mais agora as razões pelas quais as pessoas perdem o seu sentido de olfato e porque isso pode ser a pista para desordens neurológicas.
A causa mais comum da perda permanente deste sentido parece ser uma braba infecção respiratória, causada por vírus, danificando uma camada da célula nervosa na cavidade nasal (o neuroepitelium). Isso é raro em pessoas com menos de 45 anos. Mas na medida em que envelhecem, os homens (mais que as mulheres) apresentam grandes perdas.
Na falta de uma pesquisa brasileira, tenho em mãos uma norte-americana que estima que menos de 2% dos americanos com menos de 65 anos têm alguma perda olfativa significativa. Mas cerca de metade da população do país entre 65 anos e 80 apresentam problemas. Acima de 80 anos, ¾ da população experimenta perdas. Isso explica porque muitos idosos reclamam da falta de tempero de sua comida, que aquela marca de vinho que gostava tanto já não mais a mesma. Explica porque muitos velhos morrem envenenados por gás em razão de algum vazamento acidental.
As pesquisas sugerem que a perda do olfato, na maioria das vezes, reflete danos cumulativos na membrana olfativa: são vírus, bactérias, toxinas danificando as células nervosas ao longo de nossas vidas. Até que chega um dia e acontece um mais um resfriado, o bastante para produzir uma perda, às vezes permanente, do sentido olfativo. Mas existem outras causas, relativas à idade: o endurecimento do osso etmóide, que forma parte das paredes e do septo nasal, através do qual passam os nervos olfativos.
A segunda causa mais comum de disfunção do olfato são traumas cranianos. De 7 a 15% de pacientes com esse tipo de lesão podem sofrer de perda parcial ou total do olfato. A terceira causa comum são as doenças como as envolvendo pólipos nas mucosas ou desordens como a rinite alérgica. Às vezes, tudo se resolve com terapias que envolvem até cirurgias. Contudo, inflamações crônicas das regiões nasais podem resultar em perda permanente do nosso sentido olfativo.
Essas desordens podem ser derivadas de outras fontes: radioterapia para câncer, cirrose do fígado, deficiência de tiamina, problemas endocrinológicos (diabetes etc.), epilepsia, doenças nos rins e hemodiálise. A decadência desse sentido pode ainda alertar para desordens neurológicas ou psiquiátricas, como a esquizofrenia, as doenças de Parkinson e de Alzheimer e depressão.
Em suma, a leitora fique atenta: a partir dos 60 nosso sentido olfativo começa a decair, segundo as pesquisas. Entre 65 e 80 anos, metade da população norte-americana apresenta problemas significativos. Depois dos 80, 60% dessa faixa terá problemas mais sérios. As pesquisas só não falam do nariz do Pinóquio.
Tudo muito natural: na medida em que envelhecemos, vamos perdendo nossas potencialidades. No caso do olfato, vale notar, os homens perdem primeiro do que nós. Sabemos que eles também perdem mais em outras áreas, não é mesmo?
Portanto, leitora, a qualquer sinal de perda de olfato fale com o seu médico imediatamente. E não faça adegas muito grandes: aproveite todo o seu vinho.
Da Adega
II Encontro do Forum de Eno-Gastronomia. Começa amanhã, dia 9, o II Encontro, com degustações, workshops, exposições, almoços e jantares temáticos, show room de vinhos nacionais e importados, queijos e outros produtos alimentícios. O evento vai até o dia 11 e será realizado no Porto Bay Hotel Rio Internacional, em Copacabana, Rio (Av. Atlântica, 1500). Haverá debates com Stephanie Creyssels, do Vignerons de La Mediterranée, o maior produtor do Languedoc, França. E também sobre os vinhos orgânicos de Juan Luis Carrau, além de uma conversa sobre Robert Parker, o imperador do vinho. Tudo comandado por Mike Taylor. Não perca. Saiba mais
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5.11.07

Bobificações

O mais famoso crítico de vinhos do mundo, Robert Parker, anda nervoso ultimamente. Ele chamou de “medroso nazista do vinho” o diretor cinematográfico Jonathan Nossiter (do documentário Mondovino) e agora autor. Em 2004, Parker e o enólogo e consultor Michel Rolland foram criticados naquela fita. Para Nossiter, Parker tem muita influência e gosta de vinhos tintos de baixa acidez, muita cor, muito carvalho, muito álcool, “bombas de fruta”, que sacrificariam a estrutura dos grandes vinhos tradicionais. Ele também acha que Rolland é um burocrata do vinho, forçando todas as vinícolas onde é consultor a se enquadrar no molde de Parker.
Não sei se Parker sabe que ao chamar alguém de nazista, ele enquadrou-se na Lei de Godwin, criada em 1990 por Mike Godwin (advogado e autor americano). Ela diz: quando uma discussão esquenta, é quase certo que te xinguem de nazista ou equivalente. Seria um recurso diante da falta de argumentos.
Para piorar as coisas, Nossiter acaba de publicar um livro, “Le Gout et le Pouvoir” (“O Gosto e o Poder”), onde, parece, não apenas continua a censurar Parker e outros críticos, Roland e outros enólogos, revistas (como a Wine Spectator) e também restaurantes que exageram nos preços da bebida. Cita até uma casa onde uma garrafa de 6 Euros (15 reais) é vendida por 13 Euros (33 reais) – a taça.
Nossiter, segundo Parker, tem apenas “metade do cérebro de um macaco”. Segundo o que li das notas sobre o lançamento do livro, escrito em francês e realizado numa livraria de Bordeaux, Nossiter o classifica como “um antiguia de vinhos” e que, como no seu filme de 2004, marreta a crítica dominante e os preços extorsivos. O americano, que mora no Rio, comenta que Parker comete uma traição ao provar 300 vinhos de enfiada e depois publicar notas aritméticas. “Se houver 40 pessoas numa degustação, teremos 40 diferentes experiências”, diz. “Esse livro é um antiguia: não pretende impor gostos, mas defender o paladar dos indivíduos dos críticos badalados”, explicou o autor.
Tudo isso acontece na esteira do lançamento da biografia (não autorizada) do poderoso Parker, assinada por Hanna Agostini, que durante anos representou o crítico Bordeaux. Ela coordenava degustações e traduzia o trabalho do americano para o francês. Foi demitida pela suspeita de usar o nome do chefe para faturar em projetos de consultoria. Robert Parker: Anatomie d'un Mythe sugere, por exemplo, que o crítico tivesse aceitado ser padrinho da filha de um produtor de Bordeaux, que assim passou a ganhar favores (ou notas altas). É duro ser uma celebridade.
O livro de Nossiter, pelo que li, é mais um alerta contra a padronização dos vinhos. Produtores, particularmente os das grandes corporações, são levados a fazer um vinho do jeito que Parker gosta, caso queiram boas notas das revistas, que vão se traduzir em grandes vendas e lucros maiores. Se o Michel Rolland é visto como a pessoa capaz de fazer esse tipo de vinho, teremos mais e mais vinícolas correndo atrás dele para repetirem o estilo. Ficamos imprensadas entre “Parkerizações” e “Bobificações”.