27.2.10

Um teste, para começar

Agora que o ano começou, que tal testar seus conhecimentos sobre os vinhos, um quiz como se diz?
1. Que tipo de maceração é utilizado na região de Beaujolais, França? a) Plutônica; b) Carbônica; c) Teutônica; d) Mnemônica?
2. Onde fica a região vinícola da Mosela? a) França; b) Áustria; c) Alemanha; d) Espanha; e) Petrópolis.
3. Qual a mais importante uva tinta do Loire? a) Pinot Noir; b) Cabernet Franc; c) Cabernet Sauvignon; d) Gamay.
4. A uva Mencia faz vinhos de que cor? a) tintos; b) rosés; c) brancos; d) cinza (um rosé pálido).
5. O produtor Lisini opera em que país? a) França; b) Espanha; c) Itália; d) Alemanha; d) Argentina.
6. Qual o país de origem dos produtores Jacques e François Lurton? a) França; b) Argentina; c) Estados Unidos; d) Austrália.
7. Qual é a temperatura de serviço recomendada para um Champagne: a) Entre zero e 5º C; b) entre 5 e 10º C; d) entre 10 e 15º C.
8. Qual o nome da região francesa onde o famoso Muscat Beaumes de Venise é feito? a) Vale do Ródano; b) Borgonha; c) Loire; d) Cognac.
9. O que é a Touriga Francesca? a) Um produtor da Argentina; b) Uma variedade de uva utilizada no vinho do Porto; c) Um vinho fortificado francês; d) Um método de vinificação comum na região do Veneto, Itália.
10. Que região vinícola francesa também é conhecida por Midi? a) Languedoc-Roussillon; b) Bordeaux; c) Borgonha; c) Beaujolais.
Respostas:

1. A técnica da maceração carbônica é largamente empregada na região de Beaujolais, França. A maceração carbônica envolve o amolecimento de uma substância sólida por um líquido, no caso, das uvas em seus próprios sucos, fazendo com que fermentem sob uma “capa” natural de dióxido de carbono. O resultado é um vinho de muita cor e frescor, com sabor de frutas, mas com poucos taninos.
2. O Mosela é o principal tributário do lado esquerdo do rio Reno, na Alemanha (a partir de Klobenz. Ele nasce na Alsácia, França, em direção a Luxemburgo e a Alemanha, onde forma o belíssimo Vale do Mosela, famoso também pelo seu excelente vinho. Daqui saem os preciosos Rieslings, Elblings, Müller-Thurgau, Kerners e Auxerrois.
3. Cabernet Franc é a principal uva tinta do Loire. É encontrada em regiões mais frias, como a do Anjou-Saumur, cujo clima serve para acentuar sua qualidade aromática. Mas, atenção: a região também produz vinhos ótimos como os de Bonnezeaux, com a Chenin Blanc e o famoso Rosé d’Anjou.
4. A uva Mencia é utilizada pela região vinícola de Bierzo (ou El Bierzo), na Espanha, para fazer um ótimo vinho tinto. É uma região antiqüíssima, no canto noroeste de Castilla y León, perto da fronteira com a Galícia. Graças a investimentos e a inovações, El Bierzo é hoje uma das estrelas na constelação vinícola espanhola, ao lado de Rueda, Penedés, Toro e Jumilla.
5. Lisini é um dos principais produtores do famoso Brunello de Montalcino, na Itália. A propriedade está nas mãos da família Clementi-Lisini desde a Renascença. Fica ao sul de Montalcino, perto da vila de Sant’Angelo. O seu enólogo é Franc Bernabei, um guru que conseguiu colocar a propriedade em pé de igualdade aos melhores produtores do Brunello: um vinho rico, encorpado, textura soberba, maravilhosamente harmonioso.
6. Jacques e François Lurton são franceses, mas têm propriedades na Argentina, onde começaram a produzir em 1992, na região de Mendoza, aos pés dos Andes, bem acima do nível do mar. Hoje, os Lurton fazem vinhos em todo o mundo. Na Argentina, trabalham muito bem com a Chardonnay, mas sua marca mais famosa é a Santa Celina, feita com a Pinot Gris.
7. Um espumante, em particular um Champagne, deve ser servido entre 5 o 10º C. Lembre-se que muito gelado, o vinho terá seu sabor mascarado. Quanto mais fino for o vinho menos ele precisa ser refrigerado. Água e pedras de gelo num balde gelam mais eficiente e rapidamente do que apenas gelo.
8. Muscat Beaumes de Venise é um vinho doce feito no Vale do Ródano, França. Beaumes de Venise é uma vila no Vaucluse, perto de Vacqueyras e Gigondas. Foi elevada a AOC em 2005, pela qualidade de seus tintos. Contudo, é uma região mais conhecido pelo seus Muscats doces e fortificados, que têm sua própria AOC, justamente a Muscat de Beaumes de Venise, um vinho doce natural que chegou a ser mais popular que os Sauternes e os doces alemães entre 1970 e 1980. Tem um mínimo de 15% de álcool, baixa acidez e é intensamente doce. O que surpreende é a sua surpreendente delicadeza, com uma fragrância floral. É feito exclusivamente da cepa Muscat Blanc à Petits Grains. Deve ser bebido o mais jovem possível, ligeiramente gelado, seja como aperitivo ou acompanhando uma sobremesa. Faz ótimo par com sorvetes.
9. A Touriga Francesa é uma das 40 cepas permitidas na produção de vinhos do Porto. Possui uma casca muito fina e seus vinhos são menos densos em cor e em taninos do que a sua colega, a Touriga Nacional. Contribui, porém, com fruto, aromas e maciez. Outras estrelas importantes na constelação do vinho do Porto são a Touriga Nacional (grande extrato, muitos taninos, corpo e estrutura no blend), a Tinta Roriz (nome português para a espanhola Tempranillo, contribuindo com muito açúcar e baixa acidez), Tinta Barroca (delicadeza, fines se, frutos aveludados: entra com elegância e frutos maduros na mistura final) e Tinto Cão (vinhos finos, complexos: é a menos importante dessa série, pois sua produção foi grandemente reduzida).
10. Languedoc-Roussillon, também chamada de Midi, é uma das 26 regiões da França, vastíssima, localizada no sul do país, ao longo do Mediterrâneo. É um oceano de vinhos, produzindo entre 35 e 40% das uvas e perto de 300 milhões de caixas de vinho anualmente.
Agora, coloquei o Mosela em Petrópolis (na segunda questão), só para puxar a brasa para um querido bairro de Petrópolis, que lembra a presença dos imigrantes alemães na Serra. Mas vinho nessa minha Mosela só no mercado.

Da Adega
Vinho no Iphone
. Pois a Expand agora também é pioneira no mundo digital e lança o primeiro aplicativo de vinhos para Iphone no Brasil. O programa é homologado pela Apple e pode ser baixado gratuitamente no site da Apple Store, via iTunes. Entre várias funções, o aplicativo dá dicas de harmonização, traz fichas técnicas dos vinhos, informa sobre eventos, lista os rótulos do catálogo e dá os endereços das 40 lojas
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18.2.10

Veisalgia, essa danada

Para não falar dela mais uma vez e ficar monótona, que tal comentar sobre a veisalgia? Um nome rebuscado que esconde um fenômeno clínico infelizmente onipresente em toda a nossa sociedade e de gravíssimas conseqüências sociais e sanitárias.
É um vocábulo cuja autoria não está muito clara. Temos a conhecida algia, dor em grego, daí a nevralgia. O veis vem do norueguês kveis, que significa algo mais ou menos como “desconforto após a devassidão”. Seus sintomas são dor de cabeça, náusea, urina e sede excessivas e mais a fadiga. Tudo isso em doses monumentais. Se você está nesse estado, abusou e não parou mais nesse carnaval, certamente encontra-se em casa (será mesmo?) não suportando sequer olhar-se no espelho.
E a cura para esse estado calamitoso? “Pobre daqueles que se levantam cedo para correr atrás das bebidas, que ficam acordados até tarde da noite inflamados pelo vinho”. O profeta Isaias (5:11) já sabia o que os excessos podem provocar. Deveria saber também que pouca coisa, ou coisa alguma, poderia ser feita.
Sabe-se que a ressaca tem várias causas. A desidratação do corpo é uma das principais. O álcool é diurético, nos faz urinar e suar, perder muita água, enfim. O café, aquele sempre recomendado “café forte” só vai complicar ainda mais as coisas, pois ele também é um diurético. A dor de cabeça é um dos sintomas da desidratação e pode ser melhorada com comprimidos para dor e água, muita água.
Algumas bebidas são piores do que outras. Em ordem decrescente de estrago, temos as bebidas escuras: conhaque, vinho tinto, rum, uísque. Em seguida, as bebidas brancas: vinho branco, gim e vodca – essas as melhores.
Embora no final tudo se resuma à quantidade de álcool, misturar nem sempre é bom. Há um velho e consistente ditado: “Cerveja antes do destilado, nunca pior. Destilado antes da cerveja, nunca tema”. A cerveja, ou qualquer outra bebida carbonatada, é absorvida muito mais rapidamente pelo corpo. Bebendo-a antes de outras bebidas alcoólicas resultará que estas sejam absorvidas mais rapidamente também.
Evite tomar um trago de qualquer bebida para ajudar na cura. Ou seja, usar o álcool como remédio. Em vez disso, prefira vitamina C, que vai aumentar a eliminação do álcool pelo corpo. O álcool causa desidratação, como vimos, por isso devemos beber muita água, como também sucos de frutas e suco de tomate.
Em boa parte das vezes, só pensamos em beber. E comer? Nunca é bom beber de estômago vazio. A comida ajuda a absorver parte do álcool e ainda a digeri-lo de modo mais rápido.
Não tente o café, pois é diurético, como dissemos. Além disso, ele não vai levá-lo à sobriedade. No máximo, você será um bêbado bem acordado.
Na verdade, os cientistas ainda não conseguiram uma cura para a ressaca. O responsável não é necessariamente o álcool (etanol) do vinho, da cerveja e de outras bebidas. Os cientistas, inclusive, dizem que muitas vezes os sintomas são mais severos quando o etanol é eliminado do nosso sistema.
Ele é eliminado pelo fígado. Ou seja: o fígado o converte num ácido tóxico, o acitaldeído, que em seguida é transformado num acetato, daí vira ácido acético para finalmente acabar como dióxido de carbono e água. 90% do álcool convertem-se assim, pelo fígado. 5% são eliminados diretamente através dos pulmões (daí o uso do bafômetro). Outros 5% são eliminados diretamente pela urina.
Os sintomas característicos da terrível veisalgia começam normalmente algumas horas após a última ingestão de álcool. E o ponto máximo acontece quando a concentração do álcool no sangue marca zero. 75% daqueles que beberam a ponto de intoxicar-se vão pegar uma senhora ressaca.
O álcool vai irritar as paredes do estômago e aumentar a produção de ácido clorídrico. Alguns nervos do estômago vão passar essa informação aos centros de vômito da medula – que, por sua vez, envia estímulos ao estômago de modo a que expulse o que o está incomodando. Lá vem a náusea.
A dor de cabeça seria um efeito do álcool ao dilatar os vasos, aumentando a pressão na cavidade cerebral. O álcool também faz aumentar os níveis de histamina e serotonina, sempre relacionados às dores de cabeça em algumas pessoas.
A fadiga é devido à hipoglicemia: o álcool reduz os níveis de açúcar em muitas pessoas. Perdemos energia, sentimo-nos mais cansadas.
Além da fadiga, o álcool brocha, sem dúvidas. O desejo sexual pode até aumentar com o consumo de álcool. Mas o desempenho, querida, fica para outra ocasião. O álcool promove efeitos sedativos no cérebro, resultando em má coordenação motora, pouca ou nenhuma secreção de hormônios sexuais e desidratação, como vimos. Ou seja: teremos uma senhora redução nas secreções. Os homens conhecem muito bem essa história. Mas nunca aprendem e vivem repetindo que “isso nunca aconteceu comigo”.
Os pesquisadores culpam também uns tais de congêneres. O metanol, álcool da madeira, é um congênere (que pertencente ao mesmo gênero) normalmente encontrado nos vinhos (e nas bebidas escuras, como o conhaque, o uísque e o rum) e quase sempre o culpado pelos desastrosos sintomas. Embora responda em grande parte pelos sabores da bebida, ele contém impurezas que, no final das contas, vão martelar nossas cabeças. O etanol, álcool de grãos, bloqueia o funcionamento do metanol: assim, de fato é o álcool do vinho que está ajudando a afastar a ressaca. Isso até que ele seja eliminado do sistema. Quando isso acontece, o metanol se apresenta e é um desastre.
Os produtores de saquê sabem disso. Eles moem o arroz até que ele se livre de suas camadas mais externas, onde se encontram suas impurezas. É por isso que, falam eles, é muito pouco provável que tenhamos ressaca com saquê. Pelas mesmas razões falam que vinho de boa qualidade não vai provocar ressaca, pois são muito bem filtrados e contêm menos impurezas.
A verdade é que os cientistas ainda não entenderam direito o mecanismo da ressaca. Sabem que se relaciona com os feitos tóxicos do álcool e com a desidratação, mas desconhecem como a coisa toda se opera.
As pesquisas nessa área demoram, talvez em função de problemas éticos. O sucesso na cura da ressaca pode induzir a bebedeiras cada vez piores, embora saibamos que a ameaça da ressaca até hoje não impediu ninguém de beber. E de beber até cair.
Assim, amiga, fique no básico: muito sono, muito descanso, bastante água, um banho quente, um energético, um suco. Sei que todo mundo tem uma receita contra a ressaca escondida na manga. Mas melhor delas é evitar a embriaguez.
Da Adega
Vinhos no Verão
. Maurício Leme, sommelier da World Wine, uma das três maiores importadoras de vinhos premium do país, dá algumas dicas sobre como tratar e consumir vinhos nesse verão de lascar:
a) Os rosés, brancos e espumantes são mais indicados, por serem servidos mais gelados e por terem no frescor e na sua acidez suas principais características;
b) Os tintos podem ser tomados, mas cuidando para que sua temperatura fique entre 16 e 18ºC. Caso não tenha uma adega climatizada, coloque a garrafa num balde com gelo durante uns 10 minutos. Experimente tintos leves, como o Bardolino, o Chianti e os Beaujolais. Ou vinhos com uvas como a Pinot Noir, a Gamay e a Dolcetto.
c) O vinho pode ser resfriado na geladeira, mas não deve ser mantido nela por muito tempo, pois pode ressecar a rolha, o ar entrar ou o líquido vazar. O melhor é mesmo é o balde com gelo: vai resfriar mais rapidamente.
d) Na praia, leve seus vinhos (de preferência os espumantes e os brancos) em isopor com gelo e um pouco de água;
e) Os rosés devem ser servidos entre 11 e 14º C; os brancos entre 10 e 13º C e os espumantes entre 6 e 10º C.
Veja a seleção de vinhos recomendada pelo sommelier no site da
World Wine.

11.2.10

Folias

O álcool. Se não fosse o álcool, a raça humana teria levado mais tempo a praticar a agricultura. Para Patrick McGovern, um respeitado arqueólogo americano, foram os prazeres das bebidas fermentadas que incentivaram o homem do Neolítico a começar a cultivar o solo. Ele acha que não foi a maçã que deixou tudo a perder. Mais provável ter sido um punhado de figos: os frutos caíram ao chão e fermentaram. Alguém os pegou e provou: assim que o álcool entrou na corrente sangüínea e chegou ao cérebro, a mensagem recebida foi: quero mais disso!
Não há muitas dúvidas de que o primeiro encontro da humanidade com o álcool aconteceu acidentalmente na forma de uma fruta fermentada. Mas não divido com o arqueólogo americano que a partir daí o homem não parou mais em sua busca por algo que o intoxicasse.
No Neolítico, a raça humana deixou de ser nômade, fixou-se em áreas propícias para o cultivo e a criação: precisava alimentar-se através de plantas, vegetais, frutos, grãos e, ainda, conseguir proteínas com carne de boi, ovelha, porco etc. O arqueólogo revela que já há 9 mil anos, muito antes da invenção da roda, os habitantes da vila de Jiahu, na China, estavam fermentando um mel com conteúdo alcoólico de 10%.
Muito bem: mas eles precisavam comer também. Precisavam dos legumes e da carne, necessitavam do couro para seus agasalhos, para suas cabanas e barcos.
Daqui a pouco, vamos ter arqueólogo demonstrando ter sido o repolho o que nos levou à agricultura. O álcool é importante, concordo, mas não mais do que a batata ou o milho no avanço para a agricultura. É folia demais para o meu gosto.
Maconha e vinho. Os californianos decidirão, por voto, em novembro próximo se legalizam ou não o consumo de maconha e como taxarão esse consumo. O grupo favorável à legalização está utilizando o sucesso da indústria vinícola no estado como argumento: ele cria empregos (em torno de 310 mil, até agora), renda (mais de 10 bilhões de dólares em salários), mais de três bilhões de dólares em impostos para o estado – e isso com o segundo menor imposto no país sobre o galão de vinho (3,7 litros): 20 centavos de dólar. Parece bom, não é? Dá para imaginar quanto o governo irá faturar com a maconha.
A comparação é perigosa. Segundo um blogueiro de vinho, Tom Wark, “a única razão aceitável para fumar maconha é “ficar na boa”. O vinho nos deixa na boa também, mas apresenta outras razões aceitáveis para bebê-lo. É gostoso, torna a comida mais apetitosa, é uma tradição na celebração de uma ocasião importante (não se imagina o vovô, acendendo um cigarro de maconha para celebrar o nascimento da neta: “minha neta vale um tapinha”, coisas assim).
Mas a verdade, reflete o blogueiro, é que gostamos do vinho por que o álcool contido nele não faz sentir bem (ou pelo menos diferente). “E esse é o fato pouco divulgado por trás do sucesso dos vinhos. E nesse aspecto, o vinho e a maconha não são muito diferentes”.
E você, amiga: acha essa comparação justa? O vinho é essa folia toda?
Será o Benedito? Os monges beneditinos da Abadia de Buckfast, na Escócia, criaram um “vinho tônico” que está dando o que falar. Ele pode ser comprado pelo nome de Buckfast Tonic Wine, mistura vinho (com 15% de álcool) e cafeína (o equivalente a oito latinhas de Coca-Cola) numa garrafa de 750 ml. Essa mistura está fazendo um grande sucesso no país. E também provocando acaloradíssimos debates, pois lá as autoridades não sabem mais como resolver o problema do alcoolismo.
A polícia local diz que Buckfast foi mencionado em 5.538 relatórios sobre crimes praticados entre 2006 e 2009 (a garrafa foi usada como arma em 114 desses atos). Já um porta-voz da empresa que distribui a bebida informa que ela não chega a 1% de todo o mercado escocês de bebidas.
Você não vai encontrar a bebida em nenhuma lista de vinhos. Buckfast está sendo criticado até pelo Bispo Episcopal da Escócia, reverendo Bob Gilles. Ele condena os beneditinos de Buckfast de estarem se afastando dos ensinamentos de seu padroeiro, São Benedito, santo muito cultuado no Brasil. O bispo reclama da duplicidade moral dos beneditinos, “associado a um produto sabidamente responsável por danos sociais e médicos. São Benedito teria ficado muito infeliz com o que seus monges estão fazendo atualmente”.
Vamos lembrar, porém, que os licores Bénedictine e Chartreuse são mais alcoólicos do que o Buckfast. O bispo episcopal deve achá-los também produtos do diabo – e isso para não falar do mais famoso monge beneditino, Dom Perignon, que deu uma formidável contribuição à criação do champanhe.
O Buckfast fatura 50 mil libras por dia, em vendas. Os monges beneditinos não estão lá para vigiar o que cada um faz com seu vinho – e com sua cerveja, seu uísque etc. Essa é uma folia para arrumar um bode expiatório para o porre ancestral dos escoceses.
A folia dos rosé. O sucesso desses vinhos é tanto (seu mercado cresceu 47% em todo o mundo, segundo relatório da Vinexpo) que criaram até um vinho do Porto Rosé. É o Croft Pink. Se não fosse pelo nome “Porto” no rótulo ele passaria por mais um vinho rosado. Veja aqui.
Beba segundo a estação do ano: brancos na primavera-verão, tintos no outono-inverno. Já o rosés, tal como os espumantes, são vinhos para todas as estações.
O grande folião. É o vinho: ele prova que algo pode ser gostoso sem gordura de qualquer tipo, acréscimo de açúcar, sódio, colesterol. Lembre-se, para cada taça de vinho, um copo de água. E em cada taça, apenas um terço da bebida. Não encha até a borda. Entenda o crítico de vinho como uma espécie de GPS, nem sempre atualizado: pode ou não pode levar você para onde pretende ir.
Numa pesquisa online, a revista Decanter pergunta se a Pinot Noir é maior variedade de uva. O usuário do site pode votar nas seguintes possibilidades:
1) Certamente: nada pode igualar à sua
qualidade;
2) É a melhor quando no seu auge, mas há um
bocado de impurezas;
3) Não, a Cabernet Sauvignon é a rainha. Onde
estaríamos sem ela;
4) É impossível escolher apenas uma
variedade.
Até esse momento, 4ª. feira, a resposta vencedora, de goleada, era a quarta, com 48% da votação. Vinho é isso mesmo: não vamos ficar com a doença do Miles (no filme Sideways), que não aceita outra uva, para ele só servia a Pinot Noir. Vinho é a possibilidade de variarmos, de estarmos sempre experimentando.
Bom carnaval, amiga. Se for comprar vinho num posto de gasolina, não beba no carro.

7.2.10

Um monte de mistérios

O dentista saiu de manhã cedinho, a esposa ainda dormia: pegou o seu carro e foi para o consultório. E não voltou mais. Só que seu carro foi encontrado de volta na garagem. O homem se evaporou e o delegado Espinoza é chamado para resolver mais esse caso.
Numa outra história, um matador de aluguel encomenda vinhos alemães pela Internet: seleciona brancos com a uva Riesling e tintos com a Spätburgunder (nome da Pinot Noir na Alemanha), tudo para acompanhar um Eisbein, joelho de porco, feito pela namorada, alemã como o Eisbein.
Já um detetive americano lamenta o “assassinato” de um bom champagne, ao qual é misturado açúcar, Angostura, casca de limão e água mineral gasosa (“o que é acrescentar horror ao homicídio”).
Sou influenciada por tudo que leio. Vivo lendo e aprendendo. Leio novelas, contos, ensaios, embalagens de cereais, jornais, revistas e até, acreditem, discursos de políticos. Não tenho dúvidas de quem escreve é influenciado pelo que lê. No nível consciente, podemos ficar entediadas com facilidade, mas subconscientemente somos como uma esponja gigantesca, perpetuamente descobrindo e armazenando fatos que, eventualmente, serão utilizados. Foi o que aconteceu recentemente ao ler dois novos livros novos e relido um terceiro e a minha esponja subconsciente não deixou escapar menções às bebidas, aos vinhos em particular.
Origamis. O caso do dentista está no mais recente livro de Luiz Alfredo Garcia-Rosa, O Céu de Origamis, 2009, Companhia das Letras. Garcia-Rosa me encanta desde a sua primeira novela policial, “Silêncio da Chuva”, onde nos apresenta o seu mais notável personagem, o Inspetor Espinosa, então lotado na delegacia da Praça Mauá, no centro do Rio. Mas, em oito romances, tornou-se o mais respeitado policial de Copacabana, onde se passa a trama dos origamis. Espinosa é um grande leitor: as paredes de seu apartamento no Bairro Peixoto, estão atulhadas de livros, ler é seu grande passatempo. Espinosa é um tanto melancólico, rígido na rotina de vida que leva. Só nos fins de semana é que admite uma namorada de anos em seu apartamento. E as bebidas? Pois elas aparecem ao sabor daquela rotina, sem maiores complicações. Espinoza gosta de beber seu vinho: quando os tem em casa, ficam na geladeira mesmo. Os compra para o dia-a-dia. Não tem pretensões: bebe vinho (assim como cerveja) de acordo com a ocasião e gosto. E é essa vidinha simples, rotineira, interrompida apenas pelos casos que é levado a elucidar, que nos encanta. Saímos do livro de Garcia-Rosa com saudades das caminhadas de Espinosa por Copacabana, das suas viagens de metrô, dos botecos que freqüenta, do árabe da Galeria Menescal, das trattorias de Copacabana, da sua cadeira preferida no apartamento, dos congelados que consome. Enfim, uma vida como a de qualquer mortal. E os vinhos são incorporados à narração com essa simplicidade: casualmente, sem deslumbramentos, ao sabor de nossos gostos, apenas para acompanhar uma conversa ou uma refeição. E não porque vão nos diferenciar dos demais seres humanos, nos colocar numa escala superior da evolução. Ou porque fazem bem à saúde.
Um especialista. No segundo livro, O Seminarista, de Rubem Fonseca, 2009, Agir, o protagonista é um matador de aluguel, conhecido como o Especialista. Tal como Espinosa, gosta dos livros, principalmente poesia, e também dos filmes e das mulheres. Zé, o nosso matador, abusa de citações, a maioria em latim, que toma o cuidado de traduzi-las. Cita Horácio, Cícero, Plínio, o Velho, Sêneca, Camões, Salomão, Propércio, São João Crisóstomo, Petrarca, Lima Barreto, Virgílio, Bruce Chatwin, Keats, Terêncio, São Jerônimo, Salustio, Petrônio. A lista é grande. O ex-seminarista, parece, é um expert em vinhos. Ao visitar uma socialite, que lhe oferece vinho (“Tenho vinho tinto, vinho branco, rosé –“), comenta que o rosé “já teve seu tempo de glória, mas agora...”
Estranho: sim, os rosés tiveram seus tempos de glória, mas voltaram há uns dois anos com muita força, estão vivendo uma verdadeira renascença, em todo o mundo. Um estudo recente da Nielsen, publicado pelo Conselho do Vinho da Provence, mostra que, mesmo debaixo de grande recessão, a importação dos rosados para os EUA cresceu 28% ano passado. Essa categoria é liderada pela França, especificamente, a Provence. As exportações de champagne rosé cresceram 32% no ano passado nos EUA. O rosé deixou de ser o primo pobre dos vinhos. Voltou à moda, aos bons tempos do Mateus Rosé. Talvez porque combine com tudo, de frutos do mar, a carnes, de pratos picantes a saladas e inclusive churrascos (principalmente, os secos). Isso sem contar com sua delicada cor, seus aromas e sabores. E, sobretudo, com seu poder de refrescar,
Num outro trecho, a namorada alemã do Especialista, comenta que os alemães, agora, “como todo mundo, tomavam mais vinho tinto do que branco...” Motivo: as teorias segundo as quais os vinhos tintos possuem potente ação antioxidante. “E ainda o resveratrol, responsável por efeitos anticancerígenos...”
Ora, quando morei na Alemanha, os brancos representavam 70% do consumo de vinhos. Hoje, segundo estatística do Instituto Alemão de Vinhos, os brancos somam 61,2% do mercado e os tintos 38,8%. Veja o quadro completo aqui.
Talvez a namorada tenha se confundido com o fenômeno conhecido como “Paradoxo Francês”, quando nos anos 90 dois cientistas descobriram a razão pela qual os franceses tinham muito menos problemas cardíacos do que os americanos e japoneses, mesmo com uma dieta riquíssima em gordura. O vinho tinto seria o responsável. A partir de então, as vendas dos tintos dispararam e eles passaram a ser os mais consumidos.
Enfim, o que vale é que Rubem Fonseca continua como um dos mestres da narrativa. A trama é imperdível e nos segura até o final. Mas se eu fosse a editora, tomaria alguns cuidados. Afinal, o protagonista é especialista mesmo em matar.
Champagne. O terceiro livro, Champagne for one, é mais uma novela de Rex Stout, o criador de Nero Wolf e Archie Goodwin, detetives particulares. O primeiro é um gênio, que não sai de sua casa em Manhattan, cercado de milhares de orquídeas, além de uma cozinha que o melhor dos restaurantes de Nova York teria condições de igualar. A casa é habitada pelo jardineiro, Theodore Horstmann, a babá das orquídeas; por um chef, Fritz Brenner; e pelo secretário de Wolf, Archie Goodwin. Já que Wolf prefere ficar em casa, com suas orquídeas, seus livros, seus pratos elaborados e matutando sobre os problemas criminais que lhe trazem, Archie representa as suas pernas. É o que sai atrás de pistas e suspeitos.
Nessa novela, Archie Goodwin tenta provar que o suicídio aparente de uma socialite foi na verdade um assassinato. Quando isso aconteceu, Archie estava numa elegante festa, na mansão de uma milionária. Cínico e respondão, ele começa por criticar o coquetel de champagne, como vimos acima. O champagne é nada mais nada menos do que o Cordon Rouge, um dos mais famosos e veneráveis espumantes do mundo.
Wolf praticamente só bebe cerveja e Archie leite. Apesar disso, sabem das coisas. Num almoço oferecido ao cliente (Wolf cobra caro e não aceita qualquer caso) que o contrata para resolver a morte na festa, o detetive revela logo o prato principal: fricassé de mexilhões, salsa, cebolinha, champignons, tudo feito no vinho xerez. E Wolf oferece vinho branco, o que é aceito. Dificilmente, a escolha do vinho seria diferente.
Vivo relendo os mistérios de Nero Wolf: ele representa uma espécie de alívio para esse mundo corrido que levamos. Não é tanto o elemento criminal que me encanta, mas em particular o estilo de vida levado pelo genial detetive. De certa maneira, é o mesmo elemento que me encanta no Espinosa. A casa, seus hábitos, sua rotina. Essas coisas que só damos valor quando estamos longe de nossa cozinha, quarto, da cadeira preferida etc.
Da Adega
Confraria exclusiva. Pois a Confraria Carioca é agora a representante exclusiva da importadora KMM, a maior importadora de vinhos australianos no Brasil, oferecendo rótulos de todas as regiões daquele país, o que compreende vinícolas premiadas internacionalmente, como a Yalumba, Giaconda, Sandalford, Jim Barry, Petaluma, St Hallett, Tatachilla, Brokenwood, Stonier, Westend e Hope Estate. Dê uma conferida na loja da Confraria em Botafogo e não deixe de refrescar-se no seu wine bar.