8.3.11

Folias

Aquele susto quando cheguei em casa nesse domingo de carnaval. A caseira me entregou uma embalagem com vinhos que nunca ouvira falar: Ménage à Trois. Um tinto, um rosé e dois brancos: teria vinho novo para brincar o meu carnaval. E quem os mandou estava querendo assunto. No horizonte, a possibilidade de passar o carnaval acompanhada. E o meu mestre-sala estava a fim de sacanagem. Prometedor, não? Para quem chega cansada de viagem e sem tempo para se organizar (ou seria desorganizar?) para o carnaval, abriam-se as perspectivas de folia.

Mas quem foi o autor dessa proeza? Na aflição de abrir o volume (eram quatro formas de isopor, no formato de garrafas de vinho, protegidas por uma caixa de papelão). Você pode até encontrá-las em alguns aeroportos lá fora. Tava lá: "SFO", sigla do aeroporto de San Francisco, a linda cidade dos hippies, dos poetas beat e de gente mutcho doida, uma espécie de Ipanema dos tempos da Gal na Califórnia. Veio pela DHL. O cargueiro deve ter ido para Sampa. De lá pro Rio e chegou aqui como? A caseira não soube dizer. “O moço pediu só que eu assinasse um papel e pronto, sumiu”. E não tinha um cartão, lembra? Não, ela não lembrava. Quem teria me mandado vinhos da Califórnia, logo do maior produtor de vinhos do continente?

Meu palpite, na verdade o único: um amigo meu aqui da Serra que está há um par de anos América. Fazendo o quê eu não lembro (não posso me queixar da caseira).

Trocamos e-mails de vez em quando, tudo na base do como vão as coisas, como está o tempo por aí etc. Mas fiquei com a pulga atrás da orelha (e ainda estou). O problema é que esse meu amigo, o mais provável suspeito, é batista e tratava o consumo de álcool com um pé na frente e outro atrás. Sim, concordava que na Bíblia, os dois testamentos, não proibia o consumo de álcool (ou de vinho, a bebida bíblica). Porém, temia que as bebidas, vinho ou não, pode levar a excessos – isso sim condenado pelas escrituras.

Ora, que diabos (sem ironias), ele vez por outra comprava algum vinho na minha antiga loja e, ocasionalmente, aceitava experimentar uma taça. Talvez para se mostrar agradável, talvez de olho numa paquera (sim, batistas também azaram, por que não?). Parecia gostar realmente de vinho e tinha ótimo nariz. Poderia ser um ótimo sommelier se quisesse.

Mantive uma simpática distância, pois, como ensina o Chico Buarque, “não põe corda no meu bloco, nem vem com teu carro-chefe”. Temia que se mais próximo, o batista amigo ia começar a rezar no meu ouvido sobre o meu caso com os vinhos.

Agora, escolher o Ménage à Trois, faça-me o favor! Será que foi ele mesmo?

Na dúvida, dedico esse post ao meu amigo batista, talvez ele se lembre do meu blog aqui. Vou comentar sobre um dos vinhos que experimentei, mas com um olho na Bíblia, em homenagem a esse suposto paquerador.

“E o vinho que alegra o coração do homem” (Salmo 104:15)

Ménage à Trois tinto, 2008. Em primeiro lugar, esse vinho é feito pela vinícola Folie à Deux. Olha só o nome: “Loucura a Dois”. Será que o meu amigo batista queria, mesmo à distância, pular do primeiro capítulo para o epílogo, o Ménage à Trois, descartando os entretantos?

Ménage à Trois queria, na origem, dizer apenas um domicílio habitado por três pessoas. Depois é que absorveu esse caráter surubento. Já “Folie à Deux” não tem o sentido que pensamos, de uma balada a dois. Nada disso.

Acontece que a vinícola foi fundada, em 1981, por dois psiquiatras que nomearam seus vinhos a partir de uma expressão psiquiátrica que define uma ideia fixa, uma fantasia, transmitida de uma pessoa para outra. O termo técnico, em francês, é “Folie à Deux”. Se for entre três pessoas é Folie à Trois. E vai por aí. Entenda-se ai que, nesse caso, é a fantasia que se transmite dos Cabernet, Zinfandel, Merlot e o branco Chardonnay aos seus consumidores. São sucessos de venda na Califórnia.

Mais tarde, os dois psiquiatras, talvez de sacos cheios de tanta “folie”, venderam a vinícola para a Família Trinchero, dona de best sellers, como o Sutter Home, que cheguei a vender na minha loja.

A partir do Folie à Deux lançaram o “Ménage à Trois”, nome derivado dos blends que fazem com seus vinhos. O tinto 2008 reunia na garrafa as uvas Zinfandel, Cabernet Sauvignon e Merlot. O destaque era para a Zinfandel, com aromas de geleia de ameixa, um tantinho de Merlot, com frutinhas vermelhas. O Cabernet entrava para dar estrutura, mas alguns taninos. Um vinho deliciosamente fácil de beber. Muito refrescante. É um dos tintos que mais vendem na Califórnia. E lá não custa mais de 10 dólares a garrafa. Que batista unha de fome, pensei. Acontece que o custo-benefício do vinho é patente. Uma senhora compra. E por esse preço, um vinho suculento, provocativo, que pode ser degustado sem comida. Mas idealmente em alguma companhia. Ah, danado de batista!

Que teus seios sejam qual cachos de videira

e como de maçã, o olor de teu nariz,

teu paladar, como um vinho de qualidade,

indo direto para meu querido,

colando nos lábios dos que vão dormir.

Cântico dos Cânticos, 7:9-10

Espero resolver essa charada até o final dessa semana. Quem me enviou esse presentão de Carnaval? Até lá minha folia continuará sendo solitária ou a dois mesmo, eu e meus vinhos. E pensamentos como esses (seios como cachos de videira etc. e tal). Não foi sempre assim?

Da Adega

Da África do Sul. Sim, do primeiro país do Novo Mundo a elaborar vinhos, em 1660, a importadora KMM Vinhos está lançando aqui rótulos das vinícolas Namaqua (Olifants River) e Mont du Toit (Wellington).

Entre os vinhos da Mont du Toit, está o BlouVlei (“poça d’água azul”), feito pelos funcionários da vinícola. O proprietário deu a eles essa marca e eles dividem os lucros.

Já os vinhos da Namaqua, cooperativa da Namaqua, uma região de grandes contrastes climáticos, temos oito vinhos, numa linha que vai do premium Spencer Bay, 100% Cabernet, aos Bag in Box, em embalagens de 3 litros: brancos com a Chenin Blanc e a Colombard e tintos com a Shiraz, Merlot e Pinotage (a uva da terra).

Vale conferir: consulte o site da KMM ou ligue: 11-3819-4020.

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