30.1.07

Esse vinho contem peixe

Volto aos rótulos de vinho, um potencial bafafá para 2007. É dos Estados Unidos que vem a onda. Lá, desde os anos 80, os rótulos são obrigados a alertar sobre a presença de sulfitos, sobre os riscos de beber durante a gravidez e de beber e dirigir. Mas, como já dissemos, há disposição em também impor menções aos alérgenos (ou alergênios, agentes capazes de produzir alergia). Saia curta para o produtor norte-americano, que está proibido de colocar uma menção sequer sobre os benefícios do vinho para a saúde. Assim, é fácil prever que os rótulos terão grande destaque esse ano.
Sulfitos (um derivado do dióxido de enxofre, que existe livre na natureza) o nosso próprio corpo produz uma grama por dia, em média. Utilizado desde os tempos dos gregos, são vitais na conservação dos vinhos. Todos os vinhos contêm sulfitos, produzidos naturalmente durante a fermentação. O produtor acrescenta mais, ao final, de modo a garantir que a bebida chegue a salvo às prateleiras. Nos EUA e aqui, o limite máximo é de 350 mg por litro. Na Europa, desde 2005, é obrigatória a menção. Na Austrália e Nova Zelândia também. De fato, eles podem ser um mal para os asmáticos. Mas peixes, camarões, também recebem esse tratamento (o industrializado). Frutas também, em particular as secas. Só não vi os alertas.
Praticamente, quase todos os produtores de vinho em todo o mundo acrescentam sulfitos. E os alertas no rótulo já existem. Acontece que, segundo pesquisas, a média de sulfitos dos vinhos em todo o mundo é de 80 mg/litro, bem abaixo do requerido pelas várias leis dos países citados.
Porém, o pessoal da saúde dos EUA quer mais: menções claras sobre outros alérgenos contidos nos vinhos. Assim, a cola de trigo (usada às vezes para selar os barris de vinho), as claras de ovos, a gelatina de peixe, a caseína (proteínas do leite) empregadas na clarificação do vinho deverão aparecer nos rótulos. As claras dos ovos, por exemplo, atraem e fixam impurezas e as carregam para o fundo do barril, com perda mínima de cor ou sabor para o vinho. Essa é a ação desses alérgenos: aglutinar partículas resultantes de todo o processo e ir para o fundo do barril. São em seguidas filtradas e temos o vinho claro, límpido, livre dessas partículas. E livre também desses alérgenos. O que eventualmente poderia chegar à nossa mesa é desprezível, no entender dos produtores.
O pessoal da saúde de lá não concorda. E, assim, o produtor fica temendo que, fora a grande despesa que terão em mensurar a eventual quantidade de alérgenos em cada garrafa, os consumidores desistam de um vinho com um aviso de que ele contém cola de peixe, por exemplo. Não é pra menos.
É muita aflição regulatória, gente. Até agora não vi nenhuma ação ou um alerta contra a China, o maior poluidor do mundo com os dióxidos sulfúricos (parente do nosso sulfito): suas emissões em 2005 foram estimadas em 25.49 milhões de toneladas, que chegam à sua casa e pulmões sem avisos.
Almadén Tannat Merlot 2005.
Agradeço ao pessoal da Pernod Ricard pelo suculento presente, que comemora os 30 anos da Almadén no Brasil, vinícola pioneira (a primeira a chegar à Campanha Gaúcha) e líder em vendas em sua categoria. Sucesso, Almadén.

Um ABC do Vinho

Querida leitora: você se sente deslocada por não saber nada de mecânica de automóveis? Ou de futebol, ou de poesia concreta? Acho que não, nenhuma de nós vai se sentir desconfortável por não saber nadica de nada de qualquer desses assuntos e de muitos outros.
Então, porque muita gente se sente obrigada ou se sente inadequada, um zero à esquerda, se não sabe muito a respeito dessa bebida?
O colunista Eric Azimov, do New York Times, se fez essa pergunta em seu blog, um dia desses. É uma questão crucial, principalmente para quem escreve sobre vinhos. Segundo o crítico americano, “a julgar pelas perguntas que me fazem regularmente, muitas pessoas parecem sentir que sua ignorância sobre o vinho é um defeito de personalidade”.
Mas, leitora, não deixe que essa idéia passe por sua cabeça. Você não precisa saber muito de vinho. Por que deveria? Você não precisa saber nada de mecânica para dirigir seu automóvel e ter prazer com ele. Você não precisa saber nada de poesia para ter prazer ao ler: De manhã escureço/De dia tardo/De tarde anoiteço/De noite ardo.
Desfrute o seu automóvel e deixe os problemas de mecânica na oficina. Que os críticos literários destrinchem o Vinícius de Moraes.
A ótima crítica de vinhos Jennifer Rosen, em seu livro The Cork Jester’s Guide to Wine confessa: “Vou ser honesta com você. Não posso simplificar vinho. Francamente, vinho é complicado e fica mais complicado a cada dia. Está difícil para mim manter-me atualizada sobre as novas vinícolas e regiões”.
E assim começamos a nossa série de matérias sobre o conhecimento de vinhos. E, como a amiga já percebeu, vamos deixar a coisa o mais simples possível. O nosso objetivo continua o de sempre: descomplicar essa matéria e fazer dela um gostoso passeio.
Como é feito o vinho? Essa bebida resulta de um processo simples, que parece uma mágica:
Fermento + Uvas = Vinho + um gás (dióxido de carbono).
O fermento (ou levedo) é um microorganismo unicelular com a capacidade de se auto-reproduzir, ou de se reproduzir assexuadamente, e de provocar trocas químicas. Quando uma célula dessas se reproduz ela gera uma segunda célula, um perfeito clone da primeira. Estamos falando do mesmo fermento que mamãe usa para fazer crescer o bolo ou o pão. Existe à vontade na natureza. Quando abrimos a boca e inspiramos, engolimos um punhado dessas células. Sem problemas, não vão fazer mal algum.
Os fermentos existem abundantemente na natureza. E, no caso, nas uvas ou ao redor delas. Como qualquer ser vivo, precisam se alimentar. E elas sabem que vão encontrar comida à vontade quando as uvas são esmagadas: todo aquele açúcar que aquelas frutas contêm.
Na medida em que consomem o açúcar, vão excretando um tipo de álcool (que é o nosso vinho) e, quando soluçam, soltam gás, o dióxido de carbono (que é o mesmo gás que você encontra na garrafa dos espumantes).
Esse processo é conhecido como fermentação alcoólica, utilizado na produção de vinhos e de cervejas.
O vinho é apenas isso? O vinho, posto de modo muito simplificado, é o resultado natural da fermentação do suco de uva. Mas ele oferece mais umas coisinhas. Por exemplo: nele encontramos mais e melhores sabores e aromas do que num suco de frutas. Existem partes nas cascas das uvas, nas sementes e talos que contribuem para essas qualidades adicionais. Partes, inclusive, que se desenvolvem com o tempo.
Por fim, a maneira como é feito tem um importante papel na melhoria daqueles sabores e aromas. Se um vinho amadurecer em barris de carvalho o resultado é um. E outro, se descansar num tanque de aço inoxidável.
O que existe num vinho? Falam que o vinho é o segundo fluído mais complexo que existe. O primeiro deve ser o sangue humano.
O vinho é uma mistura de ácidos, açúcares, alcoóis, polifenóis e muitos mais.
Ele é composto por: água (85%), álcool (12%) e por apenas 3% dos ácidos, açúcares etc. que citamos acima.
Os principais componentes são:
Acetaldeído, numa concentração típica de 70 mg/litro;
Glicerol (ou glicerina): 7.000 mg/litro;
Alcoóis (incluindo o etanol, bebível, e pequenas quantidades de outros tipos, com mais de dois carbonos, oleosos): 500 mg/l;
Sorbitol e Manitol: 300 mg/l;
Sulfitos: 80 mg/l;
Ácidos (fixos): 6.000 mg/l.
Ésteres: 60 mg/l;
Minerais: 1.200 mg/l;
Fenóis: 1.800 mg/l;
Ácidos voláteis: 400 mg/l
Sim, é meio complicado. O acetaldeído, por exemplo, é um líquido incolor, acre, produto primário do etanol. E um dos agentes responsáveis pela ressaca. Em algum momento vamos falar mais do acetaldeído. Mas isso só vai importar mesmo se você quiser saber as razões de sua ressaca depois de tomar umas taças a mais.
Do ponto de vista da química, o vinho é uma solução hidroalcoólica contendo de 20 a 30 gramas de substâncias em solução, que constituem o seu extrato e resultam no sabor da bebida. E várias centenas de miligramas de substâncias voláteis que resultam nos seus aromas.
Porém, não precisamos saber de química, amiga. Alguns críticos até são químicos. Outros têm um nariz com grande sensibilidade e precisam apenas provar o vinho (e contar pra gente o que acharam). Quem precisa mesmo saber de química, pelo menos um pouco mais, são os enólogos, os que lidam com o vinho e a sua fabricação. Só citei esses componentes para você sentir mais de perto o que a americana Jennifer Rosen quer dizer com “... vinho é complicado”.
Todo o vinho é uma mistura de componentes naturais e criados pelo homem. O sabor final é determinado por elementos como: o número de horas de sol que as uvas pegaram, quanto de chuva o vinhedo pegou, se houve geadas. Ou se o vinicultor resolveu deixar o suco das uvas macerando por 10 dias ou três semanas. Tudo isso vai alterar o resultado final do que vem dentro da garrafa.
Mas você também não precisa saber de toda essa operação. Para o consumidor basta provar os vinhos e anotando suas diferenças. Melhor aprender assim.
Nas próximas colunas, vamos continuar com esse ABC.

ABC do Vinho I

Querida leitora: você se sente deslocada por não saber nada de mecânica de automóveis? Ou de futebol, ou de poesia concreta? Acho que não, nenhuma de nós vai se sentir desconfortável por não saber nadica de nada de qualquer desses assuntos e de muitos outros.
Então, porque muita gente se sente obrigada ou se sente inadequada, um zero à esquerda, se não sabe muito a respeito dessa bebida?
O colunista Eric Azimov, do New York Times, se fez essa pergunta em seu blog, um dia desses. É uma questão crucial, principalmente para quem escreve sobre vinhos. Segundo o crítico americano, “a julgar pelas perguntas que me fazem regularmente, muitas pessoas parecem sentir que sua ignorância sobre o vinho é um defeito de personalidade”.
Mas, leitora, não deixe que essa idéia passe por sua cabeça. Você não precisa saber muito de vinho. Por que deveria? Você não precisa saber nada de mecânica para dirigir seu automóvel e ter prazer com ele. Você não precisa saber nada de poesia para ter prazer ao ler: De manhã escureço/De dia tardo/De tarde anoiteço/De noite ardo.
Desfrute o seu automóvel e deixe os problemas de mecânica na oficina. Que os críticos literários destrinchem o Vinícius de Moraes.
A ótima crítica de vinhos Jennifer Rosen, em seu livro The Cork Jester’s Guide to Wine confessa: “Vou ser honesta com você. Não posso simplificar vinho. Francamente, vinho é complicado e fica mais complicado a cada dia. Está difícil para mim manter-me atualizada sobre as novas vinícolas e regiões”.
E assim começamos a nossa série de matérias sobre o conhecimento de vinhos. E, como a amiga já percebeu, vamos deixar a coisa o mais simples possível. O nosso objetivo continua o de sempre: descomplicar essa matéria e fazer dela um gostoso passeio.
Como é feito o vinho? Essa bebida resulta de um processo simples, que parece uma mágica:
Fermento + Uvas = Vinho + um gás (dióxido de carbono).
O fermento (ou levedo) é um microorganismo unicelular com a capacidade de se auto-reproduzir, ou de se reproduzir assexuadamente, e de provocar trocas químicas. Quando uma célula dessas se reproduz ela gera uma segunda célula, um perfeito clone da primeira. Estamos falando do mesmo fermento que mamãe usa para fazer crescer o bolo ou o pão. Existe à vontade na natureza. Quando abrimos a boca e inspiramos, engolimos um punhado dessas células. Sem problemas, não vão fazer mal algum.
Os fermentos existem abundantemente na natureza. E, no caso, nas uvas ou ao redor delas. Como qualquer ser vivo, precisam se alimentar. E elas sabem que vão encontrar comida à vontade quando as uvas são esmagadas: todo aquele açúcar que aquelas frutas contêm.
Na medida em que consomem o açúcar, vão excretando um tipo de álcool (que é o nosso vinho) e, quando soluçam, soltam gás, o dióxido de carbono (que é o mesmo gás que você encontra na garrafa dos espumantes).
Esse processo é conhecido como fermentação alcoólica, utilizado na produção de vinhos e de cervejas.
O fermento (ou levedo) é um microorganismo unicelular com a capacidade de se auto-reproduzir, ou de se reproduzir assexuadamente, e de provocar trocas químicas. Quando uma célula dessas se reproduz ela gera uma segunda célula, um perfeito clone da primeira. Estamos falando do mesmo fermento que mamãe usa para fazer crescer o bolo ou o pão. Existe à vontade na natureza. Quando abrimos a boca e inspiramos, engolimos um punhado dessas células. Sem problemas, não vão fazer mal algum.
Os fermentos existem abundantemente na natureza. E, no caso, nas uvas ou ao redor delas. Como qualquer ser vivo, precisam se alimentar. E elas sabem que vão encontrar comida à vontade quando as uvas são esmagadas: todo aquele açúcar que aquelas frutas contêm.
Na medida em que consomem o açúcar, vão excretando um tipo de álcool (que é o nosso vinho) e, quando soluçam, soltam gás, o dióxido de carbono (que é o mesmo gás que você encontra na garrafa dos espumantes).
Esse processo é conhecido como fermentação alcoólica, utilizado na produção de vinhos e de cervejas.
O que existe num vinho? Falam que o vinho é o segundo fluído mais complexo que existe. O primeiro deve ser o sangue humano.
O vinho é uma mistura de ácidos, açúcares, alcoóis, polifenóis e muitos mais.
Ele é composto por: água (85%), álcool (12%) e por apenas 3% dos ácidos, açúcares etc. que citamos acima.
Os principais componentes são:
Acetaldeído, numa concentração típica de 70 mg/litro;
Glicerol (ou glicerina): 7.000 mg/litro;
Alcoóis (incluindo o etanol, bebível, e pequenas quantidades de outros tipos, com mais de dois carbonos, oleosos): 500 mg/l;
Sorbitol e Manitol: 300 mg/l;
Sulfitos: 80 mg/l;
Ácidos (fixos): 6.000 mg/l.
Ésteres: 60 mg/l;
Minerais: 1.200 mg/l;
Fenóis: 1.800 mg/l;
Ácidos voláteis: 400 mg/l
Sim, é meio complicado. O acetaldeído, por exemplo, é um líquido incolor, acre, produto primário do etanol. E um dos agentes responsáveis pela ressaca. Em algum momento vamos falar mais do acetaldeído. Mas isso só vai importar mesmo se você quiser saber as razões de sua ressaca depois de tomar umas taças a mais.
Do ponto de vista da química, o vinho é uma solução hidroalcoólica contendo de 20 a 30 gramas de substâncias em solução, que constituem o seu extrato e resultam no sabor da bebida. E várias centenas de miligramas de substâncias voláteis que resultam nos seus aromas.
Porém, não precisamos saber de química, amiga. Alguns críticos até são químicos. Outros têm um nariz com grande sensibilidade e precisam apenas provar o vinho (e contar pra gente o que acharam). Quem precisa mesmo saber de química, pelo menos um pouco mais, são os enólogos, os que lidam com o vinho e a sua fabricação. Só citei esses componentes para você sentir mais de perto o que a americana Jennifer Rosen quer dizer com “... vinho é complicado”.
Todo o vinho é uma mistura de componentes naturais e criados pelo homem. O sabor final é determinado por elementos como: o número de horas de sol que as uvas pegaram, quanto de chuva o vinhedo pegou, se houve geadas. Ou se o vinicultor resolveu deixar o suco das uvas macerando por 10 dias ou três semanas. Tudo isso vai alterar o resultado final do que vem dentro da garrafa.
Mas você também não precisa saber de toda essa operação. Para o consumidor basta provar os vinhos e anotando suas diferenças. Melhor aprender assim.

22.1.07

Tampar com o quê?

Claro que em 2007 continuarão chovendo notícias sobre qual a melhor tampa para vinhos: a de cortiça, a sintética ou a rosca de metal, entre outras? As torcidas, nesse campo, se dividem basicamente entre as tampas de cortiça (a turma mais tradicional, do Velho Mundo) e as de roscas de metal (o grupo do Novo Mundo, em particular, da Nova Zelândia, Austrália e Estados Unidos). Como diz a renomada Jancis Robinson: estão fazendo uma guerra santa em torno do assunto.
Ao retirar a rolha, sentimos um cheiro forte de mofo, de “papelão molhado”, de “cachorro molhado”. É a “doença da rolha”, que o francês chama de “bouchonné” (“odor de rolha”). A rolha é um produto orgânico, originária de um tipo de carvalho, o Quercus Suber. Na maioria dos casos, o problema se origina de um elemento químico, o TCA (2,4,6-trichloroanisole), identificado em 1982 na Suíça e que pode ter originem na própria árvore, nos barris, onde quer que haja madeira e produtos à base de cloro, utilizados em limpeza, inclusive das rolhas. A turma pró-cortiça estima que entre 1 e 2% das rolhas ficam contaminadas, em todo o mundo. Já para o pessoal pró-roscas o número é, claro, maior: até 15%. Mesmo que fiquemos no meio, 7%, o prejuízo é enorme, em termos da imagem dos vinhos e das garrafas perdidas. Daí a procura por outro tipo de tampa.
Na Nova Zelândia, 70% dos seus vinhos já são selados com as roscas metálicas. Os principais argumentos são que elas eliminam tanto o risco de TCA quanto o da oxidação, impedem a alteração no sabor; são próprias para o envelhecimento tanto dos vinhos brancos como dos tintos e podem ser armazenadas na vertical. Só que até agora ninguém sabe, com certeza, como ficará o sabor de um Château Margaux depois de 50 anos com uma tampa de rosca metálica. Com a cortiça já se sabe: continuará maravilhoso (se não acontecer o TCA).
Para esquentar o debate, descobriu-se agora que os vinhos com tampas de rosca também podem se transformar em “bombas de mau cheiro”. Análises feitas pela londrina International Wine Challenge (que testa cerca de 9 mil vinhos por ano) verificaram que 2,2% de garrafas com as roscas metálicas foram afetadas por sulfitização – uma reação química causada pelo uso em excesso de sulfitos (usados para conservar o vinho, prevenir a sua acidificação e enaltecer a sua cor) e a falta de oxigênio. Nota o IWC que 4,4% das garrafas com cortiça, neste teste, também tinham problemas com os sulfitos, minorados porque as rolhas permitem a entrada do oxigênio na garrafa, reduzindo o mau cheiro (de ovo podre, borracha ou fósforo queimados).
Assim, nesse momento o jogo está empatado. Vamos esperar e, como recomenda Jancis Robinson, jogar um balde de água fria sobre o assunto.
Ah, e não deixe de visitar a Fenavinho, em Bento Gonçalves, RS, a maior e melhor feira de vinhos da América Latina. Começa dia 26 de janeiro.

Plutonizada?

“Plutonizado” foi eleita a palavra do ano (de 2006) pela American Dialect Society. Ela deriva de plutoed, um neologismo. Veja o verbete na coluna do Sérgio Rodrigues.
A ADS é uma sociedade que existe há 117 anos e faz um belo trabalho em torno dos usos, novidades, modismos e novos empregos da língua inglesa. Novidades essas que são quase que imediatamente adaptadas e usadas em todos os outros idiomas, como a amiga sabe.
E os vinhos com isso? Explico com exemplos:
Você gosta de vinhos e resolveu visitar a novidade do Tastes of the Valley - Sideways Wine Bar – um bar de vinhos inspirado no filme Sideways, que ganhou um Oscar de melhor roteiro adaptado em 2004 e é, com Mondovino, o filme sobre vinho mais badalado até agora. O wine bar fica em Solvang, Santa Bárbara, Califórnia, uma das locações do filme. Se você for, você é sem dúvidas uma turista plutonizada.
Ou pode querer, entre tornados e outras ventanias, visitar o Festival do Vinho da cidade de Nápoles (essa, na Flórida). E, se não morrer de tédio, seguir depois para conhecer o recém-inaugurado e exótico wine bar que funciona numa antiga sinagoga de Brooklyn, Nova York (era a velha Talmud Torah Beth Jacob Joseph, na Atlantic Avenue, no bairro de Boerum Hill). Se fizer isso, continua sendo uma turista plutonizada.
Continuando nessa linha um tanto profana, você pode até querer visitar um vinhedo plantado sobre um cemitério. Sim, agora existe. O lugar é bem próprio: Hayward, uma cidadezinha num braço da famosa Falha de San Andreas (uma falha geológica, um deslizamento lateral que se prolonga por mais de mil quilômetros através da Califórnia), perto de São Francisco, EUA. Logo, se não ocorrer nenhum terremoto, você conhece videiras de Zinfandel e Syrah que os padres católicos plantaram numa pequena área do cemitério do Santo Sepulcro, pertencente à Diocese de Oakland. Os padres argumentam que vão poupar dinheiro do vinho da missa e lembram também que vinho é o sangue de Cristo. Muito justo. Mas talvez você acabe sabendo mais de terror do que de terroir (perdão pelo trocadilho). Em qualquer caso, você além de sobressaltada vai permanecer plutonizada.
Vale quase tudo quando fazemos turismo, só não vale é ficar rebaixada, diminuída, transformada numa “turista-anã”, que é o significado da palavra campeã de 2006. Plutão era planeta desde 1930. Mas a partir de 2006 foi reclassificado como Planeta-anão.
Porém, sei que a amiga quer é se agigantar, pois gosta mesmo de vinho e quer fazer turismo a sério. Nesse caso, o negócio é fazer as malas já e partir para Fenavinho, em Bento Gonçalves.
A Fenavinho. Em termos de multiplicidade de ofertas, qualidade, variedade e propriedade de eventos (tem para adultos, crianças, profissionais e amadores do vinho etc.), alcance e duração – por tudo isso, para mim é a maior e mais importante feira de vinhos do continente. Imperdível.
É muito mais do que wine bars exóticos ou vinhedos “diferentes”. Degustações de vinho (a maioria, grátis) e vinhedos magníficos (sobre solo consagrado apenas pela natureza) você tem há muito tempo no sul do país.
Oficialmente a feira começa agora, dia 26 de janeiro, e vai até 20 de fevereiro. Se você for no período de Carnaval pode até participar da colheita da uva.
Mas se chegasse hoje lá conheceria o Caminhão do Vinho, que vem percorrendo os bairros de Bento Gonçalves desde o dia 20, distribuindo vinho e suco de uva gratuitamente.
A feira acontece numa dos maiores áreas de eventos da América Latina: o Parque da Fenavinho, em Bento Gonçalves (há uns meros 120 km de Porto Alegre), com 322.567 m² de área total e 50.000 m² de área construída.
No Parque, teremos uma exposição das 80 vinícolas de várias regiões produtoras do país, apresentando seus vinhos, que poderão ser degustados e até comprados por precinhos pra lá de camaradas.
Ao lado do pavilhão será apresentado um inusitado espetáculo cênico, ao ar livre: a História Cultural do Vinho, com mais de 500 figurantes, esculturas gigantescas em movimentos, alegorias, palcos fixos, cenários de fundo, cenografias, vídeos, efeitos, dramatizações. Será realizado todos os sábados, a partir das 9 da noite, numa arena com arquibancadas para até cinco mil pessoas. A turma da Fenavinho conta com o competente e criativo pessoal que faz o Festival Folclórico de Parintins, Amazonas, para a produção do show (logo, capaz de colocar o Carnaval carioca pra trás, em termos de qualidade de alegorias, cenários, esculturas etc.).
Entenda: essa feira está completando 40 anos. Ao longo desse tempo ela só fez melhorar e ampliar. O pessoal sabe muito bem como tudo deve ser feito.
Num dos pavilhões do Parque, teremos 150 produtores rurais da Serra Gaúcha e do estado expondo suas melhores uvas. Haverá premiação para os cachos mais bonitos. É a sua oportunidade, amiga, de conhecer as inúmeras variedades de uvas cultivadas no Brasil, quais suas características e que vinhos delas resultam. Vale por um curso de vinhos.
Você também poderá amassar a uva com os pés e voltar dias mais tarde para degustar o vinho doce, resultado da primeira fermentação. Num outro espaço, encontrará produtos feitos através da agricultura familiar, além de ofícios como a tecelagem, o artesanato em madeira e em vime, confecção de violinos, caldo de cana, erva-mate, moinho – e vai por aí. Já se sente desplutonizada?
Tem mais: conhecerá grandes fornos a lenha e ver de pertíssimo a fabricação de pães caseiros (e saboreá-los e levá-los para casa). Além disso, temos o Filó Gastronômico, um espaço com um restaurante de gastronomia italiana regional e um palco para apresentações de grupos de música, canto e dança. Você aqui se integra de vez com os hábitos e costumes dos imigrantes italianos. Além do Filó, teremos ilhas de gastronomia, com sopas, massas, comidas típicas italianas e a gastronomia campeira (a natural dos gaúchos).
Onde deixar os baixinhos. Para as crianças, a Fenavinho oferece a Piccola Cittá, um espaço de recreação com suporte de educadores, onde os pais poderão deixar seus filhos e visitar a feira sem medo de tomar uns goles extras. São 800 m², com apresentações de teatro, canto, oficinas do pão, corridas de pernas de pau, distribuição de lanches típicos, pintura, desenho e escrita. Cada criança será presenteada com o livro “Um mundo de lembranças. Um sonho de criança”, resultado da pesquisa que originou todo o projeto.
Enfim, o evento oferece também oportunidades inéditas para os profissionais do vinho, como os Projetos Comprador e Imagem: identificam potenciais compradores de vinho (para rede de lojas, supermercados, hotéis e restaurantes) e importadores e distribuidores para exportação de vinhos brasileiros. Devemos chegar a 378 milhões de litros em 2009, segundo previsão da APEX, agência de promoção de exportação e investimento no setor. Consumimos agora 1,8 litros por ano (por pessoa). Os franceses consomem 15 litros. Assim, segundo essa agência, já estamos em 15º lugar. Nada mal. Estima-se que 100 vinícolas brasileiras farão perto de 600 reuniões de negócios durante a feira.
Ah, tem também o Vinho Encanado, já uma tradição da terra: uma imensa pipa junto à Casa Del Vino, na Via do mesmo nome. É só pegar a sua caneca e ir pra lá fartar-se. Visite ainda as vilas típicas, como suas festas tradicionais, como a Três Sete, Bisca, Mora, Quatrilho. Participe de um torneio de bocha. Confira o Salão de Arte do Vinho e os desenhos de humor sobre o vinho.
Só não deixe de ir. Vi no site da Fenavinho que a CVC já tem roteiros aéreos e rodoviários prontinhos para a feira.
Pois é prestigiando mais o que é nosso, dando valor quando esse valor efetivamente existe é que você se agiganta e se desplutoniza de vez.

19.1.07

Música em sua taça

Que estilo de música você escuta enquanto degusta o seu vinho? Beethoven ou Chitãozinho e Xororó, Tom Jobim ou Elymar Santos? Cuidado, pois acaba de ser criada mais uma teoria nesse mundico dos vinhos já tão lotado de teorias.
Na verdade, eu deveria hoje fazer referência, mais uma vez, à chegada do Beaujolais Nouveau em todas as lojas do mundo. Dizem que estão lançando uma versão rosé. Pra quê, se o Nouveau já funciona de fato como um rosado?
Mas optei por falar dessa história sobre música e vinhos, que, juram: é verdade verdadeira.
Um conhecido enólogo e consultor de vinhos da Califórnia, Clark Smith, dono da Vinovation, garante que a música que você está ouvindo influencia o gosto do vinho que você está, ao mesmo tempo, degustando. Não, não se trata de atuar sobre os seus humores, o ambiente que o cerca ou sobre as pessoas em volta de você.
Smith garante que diferentes tipos de música vão fazer o vinho ser mais ou menos saboroso. Uma simples canção que pode elevar o seu Pinot Noir a um grau de suprema excelência. Ou deixar o seu Cabernet Sauvignon num estado execrável.
Smith é preparadíssimo: já passou pelo M.I.T., é enólogo graduado pela famosa Universidade da Califórnia, em Davis, já foi produtor da Vinícola R.H. Phillips (250 mil caixas por ano). Em 92, patenteou um sistema de redução e ajuste de álcool via a tão falada osmose reversa (osmose: um liquido, no caso, o vinho passa através de uma membrana, saindo de uma solução mais concentrada para outra menos concentrada). Ele está no meio da grande controvérsia que cerca vinhos com muito álcool. Entregam para ele um vinho com 12% de álcool e ele devolve a bebida com 15, 16% ou mais, como é a grande moda atual entre produtores interessados em agradar críticos como Robert Parker. Mas pode acontecer o contrário: de um vinho com 17% e ele o reduz para 12%. O freguês escolhe. Ele sabe o que faz. E acredita firmemente que o produto final sairá equilibrado, harmônico etc.
Acredita também, honestamente, que a música pode mudar o sabor dos vinhos. Ele realizou testes, onde um Cabernet de Bordeaux parece ficar melhor ao som da Metallica, famoso grupo norte americano de heavy metal.
Garante que uma determinada polca (tocada por uma banda local) transforma um ordinário Zinfandel branco em algo bem melhor do que a maioria dos seus tintos, mais caros. Na verdade, diz que polca só combina com Zinfandel branco. E com mais nada.
Revela que os vinhos tintos, na média, melhoram substancialmente com músicas que ofereçam uma “emoção negativa”. Não gostam de música alegre. Os Pinot Noir não gostam de música sensual. Os Cabernets gostam de músicas “zangadas”, como as da Metallica. Daí a dificuldade de encontramos uma música que seja boa ao mesmo tempo para a Pinot e para a Cabernet.
Apesar de ser um tecnólogo inveterado, Smith afirma que os vinhos possuem sua própria melodia. É um místico que ainda acredita na antiga idéia grega de separar os pensamentos e atividades entre as lógicas (que seriam originárias de Apolo, segundo ele) e as intuitivas (nascidas de Dionísio). Francamente, não entendi as analogias com os deuses gregos. Até hoje, não conheci um só deles cujo perfil apontasse para um ser lógico, coerente, racional. A lógica, o bom senso, o caminhar conforme as regras eram tarefas mais afinadas com os mortais, na maioria das vezes. Também não atino que pudessem ser apresentados como intuitivos: eles eram mais para espertos, estabanados, de caráter suspeitíssimo, mas ao mesmo tempo ingênuos.
O enólogo não sabe ainda explicar a razão pela qual o binômio vinho-música interfere em partes de nosso cérebro. Não consegue ainda explicar como, fisiologicamente, a Cabernet torna-se significativamente melhor com os The Doors (uma banda de rock americana que existiu entre 60 e 70, onde pontificava o lendário Jim Morrison), ou com a abertura da Carmina Burana, do que com Mozart ou os Beach Boys.
Já que “a música é o vinho que enche a taça do silêncio”, segundo o guitarrista e compositor Robert Fripp, não é de estranhar que tenhamos agora essa moda de música. O que não é uma exclusividade do Clark Smith.
O produtor Jean-Marie Zerr, da Alsácia, jura que a complexidade aromática de suas uvas, em particular as Gewürztraminer, melhorou substancialmente a partir do momento em que começaram a ouvir Brahms, Schubert, Mozart, Vivaldi, entre outros.
Zerr usa música clássica e um conjunto de sons estranhos, que só as uvas conseguem entender, mas que “não adequados aos ouvidos humanos”. Seus vizinhos já estão achando que ele é um caso perdido.
De qualquer modo, a hipótese da música de Bach ou de Tchaikovsky influenciar toda uma vinha está sendo pesquisada seriamente pela Universidade de Florença, Itália, a partir das experiências de um outro vinicultor, o toscano Giancarlo Cignozzi, que produz o famoso Brunello di Montalcino.
Um especialista italiano em neurobiologia vegetal, professor Stefano Mancuso, já começou a reproduzir em laboratório o que realizam esses vinicultores melomaníacos. E ele garante: “Os efeitos da música ou das freqüências sonoras sobre o crescimento das plantas são notáveis”.
Não sei, não. Uma amiga querendo livrar-se de um namorado, mas temendo ser indelicada, gravou o Soneto da Fidelidade, dito pelo próprio autor, o mestre Vinicius de Moraes. Fez um CD inteiro com o soneto – aquele que termina assim: “Eu possa me dizer do amor (que tive)/Que não seja imortal, posto que é chama/Mas que seja infinito enquanto dure.”
O rapaz foi a casa dela, jantou, conversou sobre o tempo, o trabalho, pediu cerveja e mais cerveja e depois um cafezinho. E o CD não parava de tocar, era também infinito. O namorado se fez de surdo ou era bronco mesmo. Sequer emitiu um comentário sobre o fundo musical neuroticamente repetitivo. Não adiantou nada. Foi embora com beijinhos e tudo. Ela optou por mandar uma carta encerrando o namoro. Estão casados desde então.
Desconfio que se colocar qualquer clássico para acalmar os meus cachorros e evitar que chacinem minhas galinhas, o esporte preferido deles, não vai adiantar nada. O mais seguro seria colocar um som eletrônico, tipo bate-estaca, bem alto para espantar as penosas para bem longe de feras residentes.
Também não sei o que faço com os vinhos que consumo habitualmente. Como resolver, por exemplo, a questão do premiado Rio Sol? É um dos vinhos servidos ao Papa Bento XVI quando visitou o país e feito numa vinícola à beira do rio São Francisco, Pernambuco. Devo degustar esse vinho, um Cabernet-Shiraz, ao som de um baião, de um coco, de um afoxé, frevo, jongo, maracatu, ou quem sabe de um xaxado, um batucajé? Um perigo arriscar.
Enfim, amigas, cada enólogo com a sua mania. A leitora tem alguma particular preferência musical quando degusta um vinho? Ou o som que prefere é o do papo entre amigos ao redor da mesa? Conte para nós aqui.

no Bolsa ou para a Soninha, no soniamelier@terra.com.br
Da Adega.
Sabores do Sul da França. Não vamos esquecer que o festival Sabores do Sul da França termina dia 17, depois de amanhã. Ele acontece em 45 restaurantes do Rio, Niterói, Búzios e Petrópolis, onde harmonizarão vinhos do Languedoc-Roussillon com a gastronomia de cada casa. Só tem feras da cozinha francesa no festival: Troisgros, Roland Villard, Olivier Cozan, e muitos cobras nacionais. Saiba mais com a Juliana (juliana.castanheira@approach.com.br).
Etchart Cosecha Tardia no Brasil. A Pernod Ricard está lançando no mercado o Etchart Cosecha Tardia (“Colheita Tardia”, um vinho doce natural), da Bodegas Etchart, fundada em 1890, uma das mais antigas da Argentina. O vinho já chega premiado (o único colheita tardia medalha de ouro na feira Vinhos & Bodegas de Buenos Aires. Utiliza as uvas Torrontés, de origem espanhola, parenta da Moscato, é a variedade de uva branca mais utilizada naquele país. Uma preciosidade.
O Etchart Cosecha Tardia vem com um amarelo ouro brilhante, um buquê de flores e frutas intenso e complexo, além de notas de rosas, jasmim, pêssego e frutas cítricas. Você não pode perder. Mais informações no site da Pernod Ricard ou através do SAC: 0800 014 20 11.
http://www.bolsademulher.com/estilo/materia/musica_em_sua_taca/12164/1

Uma pergunta de peso

Pergunta: Sônia, um dos presentes que ganhei no Natal foi um maravilhoso jogo de taças de vinho, todas em cristal. Ouvi dizer que louças de cristal contêm chumbo, um veneno. Devo ou não usar essas taças?
Resposta: O mais seguro seria usar essas taças apenas no período de uma refeição. O cristal vai desprender mínimas partículas de chumbo com praticamente nenhum risco para a nossa saúde. Isso foi demonstrado por uma pesquisa realizada em 1991 pela Universidade de Colúmbia, Estados Unidos. O governo canadense também fez o mesmo teste e verificou que no espaço de tempo de uma refeição a quantidade de chumbo liberada por uma taça de cristal no vinho está bem abaixo da concentração de chumbo numa bebida permitida pelas leis do Canadá: 200 partes por bilhão.
A legislação brasileira a respeito, através de uma Portaria de março de 1996, da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (veja aqui) determina que vasilhames contendo metais pesados como o chumbo podem chegar até uma concentração de 4,0 mg/kg. Mas observa que “o cristal fica permitido para fabricação de artigos de uso doméstico, somente destinados a contatos breves e repetidos com alimentos”. As refeições estão entre esses “contatos breves”.
Isso porque não devemos colocar nessas taças (ou em qualquer vasilhame de cristal, com um decantador) bebidas ácidas (vinhos brancos, suco de laranja – ou de qualquer fruto cítrico) que tenha ficado nelas por mais de duas horas.
O cristal é um vidro que pode conter até 35% de óxido de chumbo, o que torna o vidro denso, menos quebradiço, translúcido e bem mais atraente, pelo seu intenso brilho. Se friccionarmos o corpo de uma taça de cristal com o dedo, ele vai ressoar como se fosse um sino. A taça de vidro comum não gosta muito de música.
Na União Européia, louças contendo menos de 4% de chumbo são definidas como vidro. A partir de 10% passam à categoria de cristais. Peças com mais 30% de chumbo são as de cristal de alta qualidade – categoria em que provavelmente estão as taças da leitora. Nos Estados Unidos, o rigor é maior: o vidro é considerado “cristal” com apenas 1% de chumbo.
No Brasil, apenas os vidros borossilicatos e sódio-cálcicos são permitidos para fabricação de embalagens e equipamentos para qualquer contato com os alimentos. Os de cristal, só por “breves momentos”.
Aqui, até o uso de chumbo em materiais de pesca (em anzóis e chumbadas) está proibido (serão substituídos por materiais como argila, areia e pó de pedra). Tintas à base de chumbo também estão sob controle.
Riscos. Exposição a níveis altos de chumbo podem causar vômitos, diarréia, convulsões, coma. E até a morte. Anemia é um problema comum, perda de apetite, dores abdominais, constipação, fadiga, insônia, irritabilidade, dores de cabeça, problemas nos rins, até danos ao sistema nervoso central.
As crianças são mais suscetíveis à contaminação, pois seus corpos absorvem o chumbo mais facilmente e seus sistemas nervosos, ainda em desenvolvimento, são rápida e permanentemente prejudicados pelos efeitos do metal. A Saúde Pública dos EUA estima que entre 5 e 10% das crianças americanas carregue uma quantidade nociva de chumbo em seu sangue.
Em concentrações maiores, o envenenamento pelo chumbo leva a ataques apoplécticos, coma e morte. Em níveis de baixos a moderados pode causar desvios de atenção, perda de audição, insônia, crescimento retardado, dificuldades de aprendizado, dores de cabeça e de estômago.
O vinho e o chumbo. Era prática comum na Europa “batizar” os vinhos com aditivos de chumbo, de modo a preservá-los e a adoçá-los – isso desde os tempos dos antigos romanos. Eles adoravam temperos doces. O mais popular deles era o defrutum, um xarope feito de suco de uvas: cozinhava-se o mosto em panelas de chumbo. Submetido a mais radical redução, esse xarope era chamado de sapa, que tinha sabor e aromas agradáveis. Pois a sapa era empregada regularmente como aditivo do vinho e também no preparo de vários pratos da cozinha romana.
O chumbo pode causar, entre vários problemas, infertilidade e a uma alta taxa de mortalidade infantil. Daí que muitos autores concluem que a digestão do defrutum e o fato de comer-se e beber-se em utensílios de bronze contendo chumbo foi um fator a contribuir para o declínio do império romano.
O hábito de batizar o vinho com essa mistura rica em chumbo foi, sem dúvidas, responsável por um grande número de epidemias e mortes. Mas apenas no século 17 é que essa prática foi reconhecida como originária dos vinhos. Na época, esse mal era conhecido, entre outros nomes, como a “Cólica de Poitou”.
Quem descobriu a origem da doença foi Eberhard Gockel, médico da cidade de Ulm, Alemanha, na época o principal centro de comércio de vinho do país. Uma infestação de cólica na cidade, em 1690, resultou em sérias perdas econômicas para a cidade. E, em razão das descobertas de Gockel, o Duque Eberhard publicou uma lei rigorosamente proibindo a adulteração do vinho com óxido de chumbo. As punições incluíam até a morte.
O nome “Cólica de Poitou” tem origem na região em volta da cidade de Poitou (habitada no tempo dos romanos pela tribo dos Pictones), uma antiga província da França, cuja capital era Poitiers (é atualmente a região de Poitou-Charentes). Poitou tinha triste fama tanto pelos seus vinhos rançosos como pela longa endemia de cólica convulsiva e dolorosa sofrida há tempos pelos seus habitantes. A doença causava danos no sistema nervoso central, levando à paralisia, cegueira e, com freqüência, à morte.
O médico Gockel era, sobretudo, muito astuto. Ele cuidava dos monges de dois mosteiros em Ulm, cujos monges bebiam do mesmo vinho, na mesma quantidade, todos os dias. E caíram doentes ao mesmo tempo, com os sintomas da famosa cólica. Os monges que não bebiam desse vinho não foram afetados. Não foi difícil para o médico descobrir a origem do mal.
O Duque de Ulm merece também nossos aplausos: ele talvez tenha publicado a primeira lei da história em defesa dos consumidores.
Assim, leitora, use muito pouco os seus cristais. Apenas por “breves momentos”, durante as refeições. E evite guardar vinhos ou qualquer outra bebida em decantadores de cristal. Mas não jogue fora as suas taças. Elas podem virar lixo e o o seu chumbo contaminar o solo, as plantas e os animais. E, no fim, numa simplória alface, estar de volta à nossa mesa
Da Adega
Liquidação na Expand. A sua hora de ter um importado de qualidade por preços camaradas chegou. Todas as 35 lojas da importadora, entre 10 e 31 de janeiro, vão colocar mais de 70 rótulos com descontos que chegam aos 50%. Não duvide, veja só alguns exemplos:
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16.1.07

Situação dos vinhos e destilados

Como estarão o consumo e a produção de vinhos e destilados por volta de 2010?
A maior feira de vinhos do mundo, realizada a cada dois anos em Bordeaux (a próxima acontecerá entre 17 e 21 de junho), acaba de apresentar a sua costumeira projeção para o mercado, realizada pela IWSR (International Wine and Spirit Record), especializada em bebidas. O levantamento foi feito em 28 países produtores de vinho e em 114 mercados consumidores de vinhos e destilados.
Um dos principais destaques é o Reino Unido: nos próximos três anos o mercado crescerá tanto que os consumidores de vinho do país gastarão mais em vinhos (tranqüilos e espumantes) do que qualquer outro vizinho europeu. Lá por 2010, as vendas de vinho no varejo serão chegarão a 11 bilhões de dólares, ponto em que os ingleses estarão gastando mais do que os franceses, alemães e italianos, fazendo do Reino Unido o maior mercado de vendas de vinho da Europa. Entre 2001 e 2005, as vendas de vinho no país cresceram 25%, alcançando mais de seis bilhões de dólares.
Contudo, até 2010 os consumidores ingleses continuarão ainda bebendo menos vinhos dos os quatro primeiro colocados: França, Itália, Estados Unidos e Alemanha. O Reino Unido será o quinto país dessa lista.
Em 2005, os consumidores ingleses beberam perto de 1,7 bilhões de garrafas de vinho, ou perto de 27 litros por ano, por pessoa em idade legal de beber, aproximadamente o mesmo que os australianos (28,3 litros) ou holandeses (28,6 l), mas longe ainda dos dinamarqueses (38,3 l) ou alemães (38,6 l).
Em 2010, os ingleses beberão cerca de 28,5 litros por pessoa, equivalentes a 38 garrafas por ano ou 3,2 garrafas por mês: menos de cinco taças por semana.
Embora o uísque escocês ainda seja o destilado mais vendido no Reino Unido, suas vendas vêm caindo. A vodca deverá assumir a liderança em vendas de destilados em 2010, chegando à casa de 8,4 milhões de caixas.
E o resto do mundo? Eis aqui algumas das principais projeções da Winexpo para 2010.
  • O consumo mundial de vinho em 2005 totalizou 30,4 bilhões de garrafas e chegará aos 31,8 bilhões em 2010.
    A venda mundial de vinhos chegou aos US$ 107 bilhões em 2005. Para 2010 a estimativa é de alcançar US$ 117 bilhões.
    Os Estados Unidos serão os maiores consumidores de vinho do mundo em 2010, passando a Itália e a França. Eles já são o maior mercado de vinhos do mundo, com vendas de US$ 19,7 bilhões em 2005. Para 2010, as vendas deverão alcançar US$ 22,75 bilhões.
    A China chegou em 2005 já como o décimo maior consumidor de vinhos do mundo. Projeta-se que em 2010 assumirá o nono lugar.
    À sua frente, em oitavo lugar, ficará a Rússia.
    O vinho tinto seco responde por mais da metade do consumo de vinhos no mundo e chegará a mais de 15 bilhões de garrafas em 2010.
    Os vinhos rosados continuarão a crescer, mas a venda de brancos permanecerá estática.
    O consumo de vinhos aumentará na maioria dos mercados. Mas, em 2010, declinará nos atuais países líderes: França, Suíça, Portugal, Argentina e Espanha.
    O consumo mundial de destilados cresce a uma taxa de 1,4% ao ano.
    A Ásia responde por cerca de 47% de todos os destilados consumidos no mundo.
    A venda total de destilados em todo mundo deve chegar aos US$ 180 bilhões em 2010.
    As vendas de gim estão caindo, enquanto aumentam as de rum, uísque e tequila.
    A China será o segundo maior mercado para conhaque em todo o mundo, em 2010, com o Reino Unido na terceira posição. Os Estados Unidos são o maior mercado para conhaque.
    A pesquisa é intitulada “Décimo estudo global das tendências atuais no mercado internacional de vinhos e destilados e panorama para 2010”.
    Por ela, sabemos que a produção mundial de vinho chegou a 278.300 milhões de hectolitros em 2005, com uma projeção para 287.000 milhões de hectolitros em 2010.
    O consumo em 2005 foi de 227.881 milhões de hectolitros. Prevê-se quem suba para 238.825 milhões em 2010.
    Mas a Europa continuará como a maior consumidora de vinhos do planeta: com 163.553 milhões de hectolitros. Em segundo lugar teremos as Américas (Norte, Centro e Sul), com 51,100 milhões. Em seguida, a Ásia, com 14,651 milhões. E, por último, o que o estudo chama de “Resto do Mundo”: 10,609 milhões.
    No total, essas quatro regiões consumirão 239,914 milhões de hectolitros de vinho.
Veja mais aqui.
Vamos ver se, com esses números, seu Plínio (aquele da vendinha aqui do lado) se anima de vez em botar mais vinhos nas prateleiras.

História de uma dívida

Ao comentarmos sobre um vinho deveríamos sempre lembrar do seu aspecto cultural. Já até comentamos isso por aqui. Além dos seus aspectos sensoriais, organolépticos, enológicos, das suas importantes características regionais, devemos procurar registrar o que aquele vinho, aquela uva (ou uvas) ou aquele método de produção emprestaram para a história da humanidade. Afinal, a identidade dos vinhos permeia a história de vilas, cidades, países, continentes.
Prefiro falar sobre vinhos considerando também esse lado. Aliás, procuro fazer assim com qualquer assunto. Na maioria das vezes (e justificadamente), saímos atrás de apagar o incêndio. Mas é importante também sabermos onde e porque o fogo começou.
Olhe só o exemplo do Milk Thistle – que é um remédio citado com freqüência pela supercrítica inglesa Jancis Robinson. Ela, antes de qualquer degustação, toma um comprimido desse remédio, tido como milagroso para proteger o fígado. Para ela, o Milk Thistle é o “amigo dos bebedores, uma erva milagrosa”.
Pois esse Milk Thistle nada mais é do que o cardo mariano (silybum marianum), uma planta, também chamada de silimarina, considerada a talvez melhor das ervas para o tratamento do fígado, utilizada há mais de 2000 anos. O extrato das sementes dessa erva atua como um potente protetor do fígado, promovendo o nascimento de novas células hepáticas. Ajuda a proteger e eventualmente curar o órgão de danos causados pelo álcool, drogas, produtos químicos ou medicamentosos, venenos e até em hepatites. E ainda reduz a gordura depositada no fígado (a esteatose).
O Milk Thistle já pode ser encontrado em nossas farmácias por nomes como: Silimalon, Legalon, Milk Thistle mesmo ou Leberschutz, como é conhecido na Alemanha.
Será que é mera coincidência que a figura do cardo (thistle) é também o emblema heráldico nacional da Escócia – maior produtora mundial de uísque? A história oficial sobre o seu uso como símbolo nacional fala em batalhas, atos de heroísmo que datam de quase mil anos. Sei lá.
O exemplo da Croácia. Outro caso, esse comprovado historicamente, se localiza na Croácia, que fazia vinhos muito antes de cair sob o jugo romano, na antiguidade.
Outro dia, li uma resenha do blogueiro americano Alder Yarrow sobre um vinho branco da Dalmácia, uma província da Croácia. Alder é um crítico sério, muito bem informado: seu blog acaba de ser eleito o melhor dos Estados Unidos, em 2006, na categoria comida e bebida. Veja o Vinography aqui.
A Croácia já foi província romana, esteve sob o mando do Império Bizantino, dos Francos e dos Otomanos - quando suas tradições vinícolas conseguiram sobreviver às políticas antialcoólicas dos novos senhores. Em seguida, quando os otomanos saíram, ficou sob a jurisdição de Veneza e depois dos Habsburgos.
Até que, em fins do século 18, chegou um baixinho danado, Napoleão, que voltou a tornar um pouco mais difícil a vida dos croatas. O imperador francês foi logo impondo o pagamento de taxas, como é de praxe.
Mas como pagá-las, tão pobres que eram os croatas? Tinham peixe (a Dalmácia, uma província ao norte, é banhada pelo Adriático), que os franceses tinham e muito. Optaram por pagar com uma certa uva branca. Os franceses tinham muita uva, mas seus soldados estavam espalhados por toda a Europa, precisavam dos vinhos mais próximos de suas tropas (fora melhorar os ânimos, serviam como substitutos mais saudáveis da água).
E é sobre um vinho croata com essa uva de que fala o blogueiro Alder. A família do vinicultor, Alan Bibich, faz vinhos a cinco gerações. Esse vinho vem dos vinhedos da família em Skradin, no norte da Dalmácia. Além dele, Bibich experimenta vinhos tintos com variedades locais: Babich, Plavina e Lasin, além de híbridas da Syrah e da Grenache.
Não conheço o vinho. Mas o blogueiro diz que ele tem uma bela cor dourada, aromas de torrada, de pinheiros. Acidez viva, sabores minerais e de frutos verdes, com toques de baunilha (o vinho ficou em barril por 18 meses). Alder acha que ele tem semelhanças com um Sauvignon Blanc, Chenin Blanc, Riesling e Gruner Veltliner, cujas características são lembradas nessa bebida de várias maneiras.
Mas esse vinho possui uma carga histórica exclusiva: seu nome conta um episódio da história do país.
Os vinhos são nomeados normalmente ou pela variedade da uva (ou uvas) ou pela região onde as uvas são plantadas e o vinho produzido. De um modo geral, os vinhos do Velho mundo têm seus nomes a partir do local de produção, as uvas utilizadas ou não aparecem ou não tem destaque nos rótulos. Veja os exemplos de Champagne, Bordeaux, Rioja, Chianti etc.
Já nos vinhos do Novo Mundo (todos os lugares menos a Europa), o destaque fica para a varietal utilizada. Nota-se, nessa parte do mundo, que cada vez mais é dada importância às regiões de produção nos rótulos, ao lado do nome da uva utilizada. A grande exceção nesse continente é a Alemanha, onde não é raro encontramos o nome das varietais nos rótulos. Até na França, uma boa quantidade de produtores já começa a acrescentar o nome das uvas na identificação comercial dos vinhos.
No caso do nosso vinho croata, seu nome é Debit, uma uva branca, cujo nome remete não a uma região, mas aos tempos do domínio napoleônico, à solução para um problema nacional. Com essa uva que o povo da Dalmácia pagou seu tributo a Napoleão. Ninguém sabe exatamente que nome tinha antes do imposto. Mas ficou na história como Debit, dívida. Se quiser importar, seu nome todo é: Bibich Debit Skradin 2003.
E os croatas continuam pagando essa dívida. Não mais a imperadores, mas aos consumidores de seu vinho – e, ao que parece, com muita qualidade. Essa é uma história onde todos acabam felizes.

Soluções e problemas

De volta aos fatos do mundo das bebidas mais importantes de 2006 e que certamente continuarão em cartaz. Começamos pelo aquecimento global. Para contrabalançar, tivemos muita matéria sobre vinho e saúde.
Em 2006 o premiado professor Roger Corder revelou mais uma de suas descobertas com os vinhos: os benefícios de um tipo de polifenol, as procianidinas (que existem nos vinhos tintos), que talvez sejam até mais importantes do que o conhecido resveratrol. Corder é professor de Terapêutica Experimental no Instituto de Pesquisa William Harvey, em Londres, e recentemente lançou o livro The Wine Diet, onde apresenta a procianidina como chave para a solução ou melhoria de doenças cardiovasculares. Como em diferentes estudos, esse livro também destaca a importância da chamada dieta do Mediterrâneo, composta de nove elementos: vegetais, legumes, frutas, cereais, peixe, quase nada de laticínios e carne, muita gordura não saturada (azeite), pouco consumo de gorduras saturadas e um moderado consumo de álcool, prioritariamente vinho. Vários estudos comprovam que quando essa dieta é combinada com zero de cigarros, atividade física regular e moderado uso de álcool, teremos um risco bem reduzido de mortalidade originária de doenças cardíacas e de câncer.
Os italianos fizeram uma pesquisa de alcance mundial, envolvendo um milhão de pessoas. Ficamos sabendo que os moderados têm 18% de chances a mais de não morrer (de qualquer causa) do que os bebedores leves e até dos abstêmios. Mais recentemente, pesquisadores da Escola Médica de Harvard e do Instituto Nacional de Geriatria, EUA, descobriram que altas doses de resveratrol podem minimizar os efeitos negativos das dietas muito calóricas. A pesquisa foi feita em ratos. Os que viviam mais eram os que comiam de tudo, uns glutões, obesos. Só que esses ratinhos recebiam diariamente um concentrado de resveratrol equivalente a 1.500 e 3.000 garrafas de vinhos. Aconselho não repetir em casa a experiência.
Assim, em 2006 vimos que o vinho reduz o risco de ataques cardíacos e da aterosclerose, ajuda no combate ao Alzheimer, faz bem para os ouvidos (retardando a surdez) e visão (diminuindo a incidência de cataratas), ajuda no sono, é precioso no combate à diabetes tipo 2 e a vários tipos de câncer (nas mamas, garganta, pulmão e no colo, parte do intestino grosso, na próstata, na pele etc). Isso fora reduzir o colesterol, a incidência de gripes, tornar nossas artérias menos rígidas etc.
Em 2007, certamente teremos um problemão na área dos rótulos: em alguns países, autoridades ligadas à saúde querem que se mencionem os elementos utilizados para clarificar os vinhos (eliminar partículas). Clara de ovo, caseína (uma proteína do leite), cola de peixe (de uma substância retirada das tripas do peixe)? Todos podem causar alergias. Nos EUA, por exemplo, os rótulos já são obrigados a informar sobre a adição ou não de sulfitos, um conservante natural. Voltaremos ao assunto

10.1.07

Uma pergunta de peso

Pergunta: Sônia, um dos presentes que ganhei no Natal foi um maravilhoso jogo de taças de vinho, todas em cristal. Ouvi dizer que louças de cristal contêm chumbo, um veneno. Devo ou não usar essas taças?
Resposta: O mais seguro seria usar essas taças apenas no período de uma refeição. O cristal vai desprender mínimas partículas de chumbo com praticamente nenhum risco para a nossa saúde. Isso foi demonstrado por uma pesquisa realizada em 1991 pela Universidade de Colúmbia, Estados Unidos. O governo canadense também fez o mesmo teste e verificou que no espaço de tempo de uma refeição a quantidade de chumbo liberada por uma taça de cristal no vinho está bem abaixo da concentração de chumbo numa bebida permitida pelas leis do Canadá: 200 partes por bilhão.
A legislação brasileira a respeito, através de uma Portaria de março de 1996, da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (veja aqui) determina que vasilhames contendo metais pesados como o chumbo podem chegar até uma concentração de 4,0 mg/kg. Mas observa que “o cristal fica permitido para fabricação de artigos de uso doméstico, somente destinados a contatos breves e repetidos com alimentos”. As refeições estão entre esses “contatos breves”.
Isso porque não devemos colocar nessas taças (ou em qualquer vasilhame de cristal, com um decantador) bebidas ácidas (vinhos brancos, suco de laranja – ou de qualquer fruto cítrico) que tenha ficado nelas por mais de duas horas.
O cristal é um vidro que pode conter até 35% de óxido de chumbo, o que torna o vidro denso, menos quebradiço, translúcido e bem mais atraente, pelo seu intenso brilho. Se friccionarmos o corpo de uma taça de cristal com o dedo, ele vai ressoar como se fosse um sino. A taça de vidro comum não gosta muito de música.
Na União Européia, louças contendo menos de 4% de chumbo são definidas como vidro. A partir de 10% passam à categoria de cristais. Peças com mais 30% de chumbo são as de cristal de alta qualidade – categoria em que provavelmente estão as taças da leitora. Nos Estados Unidos, o rigor é maior: o vidro é considerado “cristal” com apenas 1% de chumbo.
No Brasil, apenas os vidros borossilicatos e sódio-cálcicos são permitidos para fabricação de embalagens e equipamentos para qualquer contato com os alimentos. Os de cristal, só por “breves momentos”.
Aqui, até o uso de chumbo em materiais de pesca (em anzóis e chumbadas) está proibido (serão substituídos por materiais como argila, areia e pó de pedra). Tintas à base de chumbo também estão sob controle.
Riscos. Exposição a níveis altos de chumbo podem causar vômitos, diarréia, convulsões, coma. E até a morte. Anemia é um problema comum, perda de apetite, dores abdominais, constipação, fadiga, insônia, irritabilidade, dores de cabeça, problemas nos rins, até danos ao sistema nervoso central.
As crianças são mais suscetíveis à contaminação, pois seus corpos absorvem o chumbo mais facilmente e seus sistemas nervosos, ainda em desenvolvimento, são rápida e permanentemente prejudicados pelos efeitos do metal. A Saúde Pública dos EUA estima que entre 5 e 10% das crianças americanas carregue uma quantidade nociva de chumbo em seu sangue.
Em concentrações maiores, o envenenamento pelo chumbo leva a ataques apoplécticos, coma e morte. Em níveis de baixos a moderados pode causar desvios de atenção, perda de audição, insônia, crescimento retardado, dificuldades de aprendizado, dores de cabeça e de estômago.
O vinho e o chumbo. Era prática comum na Europa “batizar” os vinhos com aditivos de chumbo, de modo a preservá-los e a adoçá-los – isso desde os tempos dos antigos romanos. Eles adoravam temperos doces. O mais popular deles era o defrutum, um xarope feito de suco de uvas: cozinhava-se o mosto em panelas de chumbo. Submetido a mais radical redução, esse xarope era chamado de sapa, que tinha sabor e aromas agradáveis. Pois a sapa era empregada regularmente como aditivo do vinho e também no preparo de vários pratos da cozinha romana.
O chumbo pode causar, entre vários problemas, infertilidade e a uma alta taxa de mortalidade infantil. Daí que muitos autores concluem que a digestão do defrutum e o fato de comer-se e beber-se em utensílios de bronze contendo chumbo foi um fator a contribuir para o declínio do império romano.
O hábito de batizar o vinho com essa mistura rica em chumbo foi, sem dúvidas, responsável por um grande número de epidemias e mortes. Mas apenas no século 17 é que essa prática foi reconhecida como originária dos vinhos. Na época, esse mal era conhecido, entre outros nomes, como a “Cólica de Poitou”.
Quem descobriu a origem da doença foi Eberhard Gockel, médico da cidade de Ulm, Alemanha, na época o principal centro de comércio de vinho do país. Uma infestação de cólica na cidade, em 1690, resultou em sérias perdas econômicas para a cidade. E, em razão das descobertas de Gockel, o Duque Eberhard publicou uma lei rigorosamente proibindo a adulteração do vinho com óxido de chumbo. As punições incluíam até a morte.
O nome “Cólica de Poitou” tem origem na região em volta da cidade de Poitou (habitada no tempo dos romanos pela tribo dos Pictones), uma antiga província da França, cuja capital era Poitiers (é atualmente a região de Poitou-Charentes). Poitou tinha triste fama tanto pelos seus vinhos rançosos como pela longa endemia de cólica convulsiva e dolorosa sofrida há tempos pelos seus habitantes. A doença causava danos no sistema nervoso central, levando à paralisia, cegueira e, com freqüência, à morte.
O médico Gockel era, sobretudo, muito astuto. Ele cuidava dos monges de dois mosteiros em Ulm, cujos monges bebiam do mesmo vinho, na mesma quantidade, todos os dias. E caíram doentes ao mesmo tempo, com os sintomas da famosa cólica. Os monges que não bebiam desse vinho não foram afetados. Não foi difícil para o médico descobrir a origem do mal.
O Duque de Ulm merece também nossos aplausos: ele talvez tenha publicado a primeira lei da história em defesa dos consumidores.
Assim, leitora, use muito pouco os seus cristais. Apenas por “breves momentos”, durante as refeições. E evite guardar vinhos ou qualquer outra bebida em decantadores de cristal. Mas não jogue fora as suas taças. Elas podem virar lixo e o o seu chumbo contaminar o solo, as plantas e os animais. E, no fim, numa simplória alface, estar de volta à nossa mesa
Da Adega
Liquidação na Expand. A sua hora de ter um importado de qualidade por preços camaradas chegou. Todas as 35 lojas da importadora, entre 10 e 31 de janeiro, vão colocar mais de 70 rótulos com descontos que chegam aos 50%. Não duvide, veja só alguns exemplos:
Terralis Bi-varietal – Trivento Bodegas (Argentina) - De R$ 13,90 Por R$ 9,90
Viña Enterizo Crianza – Bodegas Coviñas (Espanha) – De R$ 38,00 Por R$ 26,60
Montefino Reserva – Monte da Penha (Portugal) - De R$ 89,00 Por R$ 60,50
Fortant de France Syrah – Robert Skalli (França) - De R$ 35,00 por R$ 24,50
Prosecco VSAQ La Pieve – Wisco (Itália) - De 45,00 por R$ 31,50
O nome do evento é Expand Sale. Você pode parcelar os pagamentos em duas vezes para compras acima de R$ 200,00. De R$ 300,00 para cima, divide em 3 vezes. Valem cartões (VISA, Mastercard, Dinners e American Express).
Mais informações pelo telefone (11) 3847-4747. Saiba onde estão as lojas Expand
aqui.
Curso Intensivo de Vinhos. Não perca o Curso Intensivo do Grupo de Estudos e Degustação de Vinhos. Vai de 14 a 18 de janeiro, no Hotel Porto Bay Rio Internacional (Av. Atlântica, 1.500, Copacabana). Serão degustados 40 vinhos, ministradas 30 horas de aulas – que cobrirão, com degustações e almoços harmonizados, os vinhos do Novo e Velho mundo e os vários estilos de vinho.
Mais informações com pelo telefone (21) 8606-1506 ou com o Mike, via
riomikewines@yahoo.com.

9.1.07

Outras combinações

A coluna sobre vinhos e comidas, publicada recentemente, foi a vice-campeã de e-mails de 2006, perdendo apenas para Os Esnobes do Vinho. Contudo, a combinação que mais chamou à atenção foi aquela sobre vinhos e insetos, que retirei de uma matéria de 2004 da Wine Spectator. O colunista falava de combinar vinho com escorpião, com tarântula etc.
Mas existem outras combinações, amiga. E bem criativas. Vejamos:
Vinho e Música. Qual o melhor vinho para ouvir um Eric Clapton? Tem gente que aposta num Chardonnay fermentado em barril. Nessa linha, o colunista David Swingler, do site Wine. investiga várias possibilidades. Swingler, cientista e músico formado, fez uma experiência sobre como a música pode afetar nossa experiência com um vinho. Um vinho ouvindo Jimi Hendrix teria que nota? E o mesmo vinho ouvindo Mozart? E por aí vai a experiência, que embora não tenha nada de científica, sabemos que uma briga entre namorados com o fundo sonoro de um funk neurótico dá em baixaria.
Mas combinação de vinho e música, no duro, que fez foi o premiadíssimo músico australiano Tony King. Seu novo álbum, Wine Music, foi criado inteiramente a partir de sons feitos pelo vinho e seus acessórios. Passou dois anos tirando rolhas e gravando os seus “plops”, assoprando bocais de garrafas, batendo em barris de carvalho, nas laterais de taças de vinho (daquelas finíssimas, as Riedel) e gravando o fervilhar das uvas fermentando.
“As flutes de Champagne soam como violinos e órgãos... os barris pareciam tambores africanos”, disse King, que então escreveu as músicas que descreve como algo que gostaria de ouvir num jantar à luz de velas. Nesse seu último CD, cada instrumento tem relação com vinho. Com as taças, pôde fazer reproduzir diferentes notas, pois encheu quarenta delas, de diferentes formatos e tamanhos, com ajuda até de um conta-gotas de modo a que oferecessem o som certo. “Uma gota a mais ou menos pode fazer uma nota mais ou menos aguda”, explica. O músico, inclusive, criou sons novos esfregando seus dedos em taças de vinhos ou batendo numa taça de champagne com o saca-rolha.
São 11 músicas no CD, com títulos como “Journey to the Barrel” (“Viagem ao Barril”), “Sunrise on the Vine” (“Amanhecer na Vinha”), “Perfect Blend” (“A mistura perfeita”) etc.
Nesses dois anos, King utilizou apenas os vinhos que gosta de beber. “Esse era o prêmio, após cada sessão de gravação”, diz o australiano. É o caso de se ouvir e de também lembrar que, em alguns casos, é inevitável, justo e até ótimo beber no trabalho.
Vinho e Charutos. Arre! Agora temos também essa novidade. Um produtor de vinhos sul-africano criou o primeiro charuto específico para complementar os sabores de vinhos tintos finos.
O nome do moço é Mike Ratcliffe. Seu negócio é vinho e não charutos. Mas ele se frustrava pelas paupérrimas (eu diria impossíveis) combinações que os charutos fazem com os vinhos tintos. “A maioria deles é feita para ser fumada com um copo de conhaque – e mataria qualquer vinho que bebêssemos”. (Às vezes mata o conhaque e certamente o fumante).
Então, Ratcliffe, que é um figurão do vinho na África do Sul, criou uma parceria, a Vilafonté, que junta especialistas norte-americanos e sul-africanos, parar criar a primeira vinícola do país cuja proposta é produzir vinhos exclusivamente para o mercado dos Estados Unidos.
A vinícola produz apenas dois vinhos: a Série C, com a clássica combinação de Bordeaux: Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e Malbec. E a Série M, blend de Merlot, Malbec e mais um tanto da Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc.
E agora, a grande novidade: um charuto, o Vilafonté Série X para ser consumido ao lado de vinhos do mesmo rótulo. É um Corona longo, de estilo leve, utilizando fumo cubano (o miolo) e capa da Sumatra. O charuto é montado e amadurecido na fábrica de Tamboril.
O dono da Wine Spectator, Marvin Shanken, também fuma charutos: é raro uma foto sua aparecer sem a presença do edipiano símbolo. Pudera, ele também edita a revista Cigar Aficionado, onde, fora os charutos, só aparecem destilados. Nada de vinhos.
Enfim, taí, amiga: em vez de você se esconder na garagem, com os tradicionais e fortes charutos, agora talvez possa ficar aguardando na varanda (se o ventilador estiver funcionando), enquanto o queridinho faz puff, puff na sala.
Em seguida, temos uma das combinações mais apreciadas pela Soninha.
Vinho e Poesia. Pois existem críticas de vinhos como as que gostaríamos de fazer: através de poesias. Diacho, porque não pensei nisso antes?
Estou falando do nova-iorquino Lane Steinberg, cujo blog Red Wine Haiku consegue refrescar uma antiga tradição poética e dar uma cambalhota na maneira conservadora de comentar sobre vinhos. Ele usa apenas e exclusivamente formato dos haiku (ou haikai, ou hai-kai) japoneses. E só comenta o estilo de vinhos que mais aprecia: os tintos.
Haiku é uma forma poética originária do Japão, surgida lá pelo século XVI. É a arte de dizer o máximo com o mínimo. Saiba mais aqui.
Veja o que ele diz sobre o vinho francês Antoine Rodet Gevrey-Chambertin 1998:
Nariz como um cachoro
Sorando umidade como chuva forte
Mas bebe-se como um sonho
Vinho e TV. Pois o seríssimo crítico inglês Jamie Goode propõe uma combinação de vinhos com programas de TV. Jamie Goode tem PhD em biologia, foi editor, e escreve uma dos mais importantes sites sobre vinho, o wineanorak.com Tem também um blog imperdível.
Ele fala que a tradição é consumirmos vinhos à mesa, com a comida. Logo, não tem crítico, revista ou jornal que deixe de falar do que estamos falando (colateralmente): combinações. Mas o inglês se permite a uma digressão.
Acha que nos dias de hoje a maioria dos vinhos não é consumida à mesa, mas em frente à telinha. Então, ele sugere vinhos para acompanhar alguns dos programas da TV inglesa. Para ele, isso seria mais relevante para a maioria dos seus leitores. Vivo tomando espumante com pipoca diante da TV. Só consigo parar lá pelas 11 da noite. Cadê forças e vontade para jantar?
O guia que Goode sugere vale, claro, para a TV inglesa. Vou tentar adaptá-lo, quando for o caso.
Jornal da Noite. É o Newsnight da BBC2, que tem um pouco mais conteúdo político e social do que o Jornal da Globo, comandado pelo ótimo William Waack. As notícias do dia repassadas com mais comentários, mais interpretações.
Devemos beber, então, algum vinho sério, mas que não chame muita atenção. Um Riesling do Mosel Saar Ruwer, por exemplo.
Hustle. Ah, essa série ainda passa aqui. Acho que se chama Hustle: o Golpe. Nela, um grupo de espertalhões bem educados e vivíssimos aplica golpes, mas quase que exclusivamente em cima de outros trambiqueiros. Tipo Robin Hood, ladrão que rouba ladrão. Inspirada nos originais Ocean’s Eleven, o Golpe (The Sting), esse grupo de ingleses compõe tramas sofisticados, bem escritos e desempenhados, onde você rara, raramente ouve um tiro ou vê um dedinho machucado. Passa na People & Arts, acho eu, bem de madrugada. É sofisticada, merece um champagne, ou um dos ótimos espumantes do Vale dos Vinhedos, RS. Tem que ter pipocas sobrando.
Law & Order. Série de sucesso aqui, com bastante sangue rolando, mas bem narrada e, até certo ponto, didática (a estou substituindo por Midsomer Murders, a citada por Goode). É do tipo: crime cometido e nossos detetives e promotores farão justiça. O mal impera na primeira parte, para perder (na maioria das vezes) na segunda.
Para combinar, um inofensivo e barato Chardonnay nacional.
Inspector Morse. Essa série já passou por aqui e não sei porque não a repetem. O personagem principal, Inspetor Endeavou Morse, interpretada magnificamente por John Thaw, resolve problemas muito intrincados na lendária Oxford.
O inspetor Morse gosta de óperas, anda num antigo e valioso Jaguar, ainda por cima é solteiro, tem um ou outro caso. E gosta de beber bem.
Para vê-lo em ação basta conseguir algo sofisticado, intelectual e, sobretudo bem tradicional, como um Leoville Barton 1982, de St. Julien. Custa 150 dólares a garrafa. É só para ver de vez em quando, se não estouramos o orçamento.
Ground Force. É um reality show sobre jardinagem, um dos esportes favoritos dos ingleses. Uma equipe aparece de repente em sua casa e renova o seu jardim. Assim, de repente. Ninguém em Copacabana iria se incomodar. Aqui, um equivalente próximo seria Minha Casa, Sua Casa, também da People & Arts. Não gostaria de ver o meu quarto pastel ganhar um roxo cardinalício. Nem ninguém enxotando minhas galinhas para reformar o meu jardim. Ficaria chocada. Mas...
Para combinar: um vinho alemão barato, como o Blue Nun, ou um chá verde.
Como contribuição, já que na Inglaterra de Goode não existem as novelas como as daqui, acrescento:
Páginas da Vida. Um vinho de garrafão. Por exemplo, o 7 Irmãos Tinto Bordô Seco(exatamente assim como está escrito, caro revisor), com quase cinco litros, dá para você acompanhar tudo aquilo por uma semana. Em mais um mês, você compra outro garrafão e assiste mais uma semana. Nem o vinho ou a novela estariam mudados. Custa só 24 reais. Na véspera do Ano Bom, o seu Plínio aqui da vendinha baixou para R$ 21,00 e vendeu tudo.
Com relação à TV, se a combinação não está a esperada, desligamos o aparelho ou paramos com o vinho. A mesma coisa com as comidas e vinhos.
Se o vinho lhe parece muito agressivo, coloque um pouco de limão, vinagre ou sal à comida. Se um prato muito ácido retira do seu vinho as frutas que você espera dele, junte açúcar à comida. Até mesmo, neste caso, o ketchup, com seu açúcar e acidez, podem ser bons aliados.

8.1.07

Enquanto Nero canta

Quanto aos vinhos, quais seriam as notícias mais importantes de 2006, aquelas que talvez tenhamos de volta em 2007?
Para mim, a mais importante continua sendo o que lemos sobre o aquecimento global, definitivamente afetando vinhedos em ambos os hemisférios. Se o vinho revigora e refresca, nós, humanos, conseguimos alterar a composição da atmosfera, aumentando os níveis de gases como o dióxido de carbono, o metano, o óxido de azoto e os clorofluorcarbonos (usados em aerossóis e geladeiras). Eles danificam a camada protetora de ozônio e agem também como gases do efeito estufa, absorvendo a luz do sol levando ao aquecimento do planeta. Prevê-se um aumento de 2 a 6º C para os próximos 100 anos, maior do que qualquer aumento de temperatura registrado desde o aparecimento da civilização na Terra. Caso essa emissão de gases não seja controlada, iremos provavelmente assistir às maiores catástrofes naturais já registradas no planeta. E somos nós os responsáveis por esse desastre, segundo o Painel Intergovernamental sobre a Mudança de Clima (IPCC). Veja aqui.
Vai haver mudança de toda a ordem. O desaparecimento das neves das montanhas diminuirá a quantidade de água disponível para uso doméstico e para irrigação. Isso já acontece nos Andes e começa a afetar Mendoza, Montreal e a Califórnia e os vinhos dessas regiões.
Os canadenses se preocupam com o seu Icewine, o “vinho de gelo”, cujas uvas devem ser colhidas sob a neve, congeladas a abaixo de menos 8º C. Está difícil colhê-las esse ano. No Alasca e no Pólo Norte, geleiras e calotas estão derretendo.
As produções agrícolas em áreas frias podem até aumentar, enquanto as de áreas quentes ou secas podem diminuir. Teremos problemas de alimentação – num momento em que a população mundial está aumentando, o que causará impacto ambiental ainda maior (com mais recursos consumidos e mais rejeitos descartados per capita). O aumento do nível dos mares como resultado do derretimento de neve e gelo trará perigos de inundação e erosão de planícies costeiras. Não só o aumento das águas, mas o seu aquecimento, com as conseqüentes tempestades, furacões.
O aquecimento global não é assunto passageiro, veio para ficar. Há de se tomar atitudes firmes para resolvê-lo ou pelo menos atenuá-lo. Ele apresenta riscos reais para a todo o planeta, não apenas para o mundico dos vinhos.
Ah, diria o otimista: isso vai ser bom, pois poderemos ter vinhos na Suécia, tintos na Inglaterra, na Alemanha. Ah, os novos Cabernets, Merlots, Chardonnays etc. Soa a Nero cantando diante de Roma incendiada. Voltaremos com outros fatos de 2006 que ainda não se resolveram.