23.12.11

Ainda dá tempo


Meio fora de hora, encerro os trabalhos de Natal, tentando driblar o maior de meus resfriados do ano (tenho sempre uns dois, um deles de interromper o trânsito). É sobre as dificuldades de presentearmos com vinhos e seus acessórios.
Só temos até amanhã, sábado, para fazermos nossas escolhas. E se nosso alvo seja não apenas um amante da bebida, mas um daqueles obcecados assinante da Wine Spectator, da Jancis Robinson, sabe do último traque de Robert Parker, têm uma vistosa coleção de vinhos. Toda a vez que você menciona um rótulo ele responde que já conhece (e que não tolerou). Ou, com ar desdenhoso, nos sapeca um “nunca ouvi falar”, sintoma certo de nossa imensa ignorância na matéria. É isso, no final, esse tipo de gente se exercita a partir do acham que conhecem e da estúpida certeza de que sabem tudo sobre a matéria. Para essa figura, não adianta pensarmos em vinhos.
Fazer o quê, leitora? Apelamos para os acessórios. Mas essas pessoas vivem catando modelos e mais modelos de abridores, tampas, decantadores entre dezenas e dezenas de ofertas criativas, sim, embora basicamente inúteis (e caríssimas, invariavelmente).
Veja nesse exemplo, onde temos acessórios e (como dizer?) geringonças, dispositivos tentando facilitar a vida de quem quer apenas tomar uma taça de vinho. São bandejas especiais para taças, que parecem palhetas de pintor, as taças ficam dependuradas. E mais aeradores (ou preservadores) espécie de decantadores que misturam o ar o vinho através de uma torre de acrílico, sem que uma gora seja desperdiçada; um abridor elétrico para rolhas, acompanhado de um termômetro infravermelho e tela digital para leitura; pulseiras de plástico para taças (você fica sabendo quem está bebendo o quê), suportes de plásticos coloridos para a base das taças; um cooler que resfria uma garrafa de vinho em seis minutos; uma tampa para vinhos com segredo, tal e qual o segredo das maletas executivas. Você bebe o seu Lafite e mais ninguém (atenção para anotar o segredo). Tudo isso e mais um “casaco” para manter o seu vinho resfriado adequadamente.
Pode também apelar para o cômico: um prendedor de taças (que fica segura pelo seu pescoço, livrando suas mãos).
Quando você conhece bem o amante de vinhos para quem quer presentear (sabe seus gostos, o tipo de taças e acessórios que usa) a coisa fica mais fácil: escolha aqueles vinhos que você mais admira, o que não quer dizer que sejam os mais caros.
Mas tem aqueles com os quais você não está familiarizado: você corre o risco de escolher mal o vinho ou o acessório. Então, como sugeriu um blogueiro, leve uma comida: algo para contribuir para o natal do presenteado, um tender especial, um azeite de primeiríssima, queijos artesanais (não necessariamente importados: os da Serra da Canastra são divinos). Todo bom amante de vinhos gosta de comer bem.
Minha sugestão é muito simples: dê vinhos, mas vinhos brasileiros. As nossas ofertas aumentaram em quantidade e sobretudo em quantidade. Temos vinhos de norte a sul do país, ofertas que valem ser provadas, vinhos que vêm conquistando prêmios e mais prêmios internacionais.
Para quaisquer das turmas, em particular para o a dos narizes em pé, é o tipo de presente que vai demonstrar que os ventos estão mudando (e mudando a nosso favor). Tente escolher alguns dos vinhos selecionados no 8º Concurso Nacional de Vinhos Finos. Você fará a escolha mais acertada, sem patriotadas. Os vinhos são bons, mesmo.
Corra que ainda dá tempo. E feliz Natal, mais uma vez.

19.12.11

Papai Noel existe

Minha sobrinha-neta, a Bebel, que vai fazer cinco anos, está aqui na Serra para passar o Natal. Ela mora em Campinas, onde nasceu, de pais cariocas, embora fale “polta”, deixando para trás o “porta” e o falar chiado da parentada daqui. E, como toda a criança nessa idade, imagino, começa a duvidar de quase tudo. Está há dois dias aqui em casa e, claro, já descobriu aquela caixa grande, com embrulho rebuscado, que tentei esconder num vão da casa. Perguntou logo se era o seu presente de Natal. Disse que não sabia direito, teria que esperar por Papai Noel. Mas ele existe, perguntou ela? Minha resposta foi uma tentativa de reproduzir o que escreveu o editor do falecido jornal americano, The Sun, para a menina Virgínia O’Hanlon. Ela queria a confirmação para a existência de Papai Noel e, aconselhada por seu pai, escreveu uma cartinha para o editor, Francis Church. Na sua cartinha, Virgínia dizia que muitos de seus amiguinhos afirmavam não existir Papai Noel. “Por favor, diga-me a verdade, Papai Noel existe?” Eis a resposta do editor (que, por minha vez, editei): “Virgínia, seus amiguinhos estão errados. Estão na idade de duvidar de tudo. Só acreditam no que veem. Acham que nada existe a não ser o que suas cabecinhas posam compreender. E todas as cacholas, Virgínia, sejam de gente grande ou de crianças, são pequenas. Nesse nosso grande universo somos meros insetos, formiguinhas, nossa inteligência é incapaz de perceber toda a verdade e conhecimento. Sim, Virgínia, Papai Noel existe. Existe tanto quanto amor, generosidade e devoção que fartamente nos dão beleza e alegria. Ai de nós se não existisse Papai Noel. Seria tão triste quanto à ausência de Virgínias. Não haveria poesia, romance nem a fé das crianças para fazer tolerável essa existência. Não teríamos prazer a não ser no que víssemos ou sentíssemos. A luz eterna com a qual a infância preenche o mundo seria apagada. Não acreditar em Papai Noel? Você pode também não acreditar em fadas! Pode pedir a seu pai para contratar homens e vigiar todas as chaminés na véspera do Natal e flagrar Papai Noel. Mesmo que eles não vejam Papai Noel descendo, o que seria provado? Ninguém vê Papai Noel, mas não existe sinal de que ele não exista? Você já viu fadas dançando no jardim? Claro que não, mas não temos provas de que elas não estejam lá. Ninguém pode imaginar todas as maravilhas não vistas ou invisíveis que existem no mundo. Você pode abrir uma boneca para descobrir o que faz ela falar, mas há um véu cobrindo o mundo invisível que nem o mais forte dos homens, nem mesmo um time de todos os mais fortes homens que já viveram podem rasgá-lo. Apenas fé, fantasia, poesia, amor, romance podem abrir essa cortina e ver essa beleza e glória celestial. Ela é real? Ah, Virgínia, em todo esse mundo não existe nada mais real e duradouro. Sem Papai Noel? Graças a Deus, ele vive e vive para sempre. Daqui a mil anos, Virgínia, daqui a dez vezes dez mil anos ele continuará a alegrar os corações das crianças”. Descobri essa carta num site interessantíssimo, o http://www.lettersofnote.com/, que reúne cartas, cartões postais, telegramas, faxes, memos desde Virgínias até Groucho Marx, John Kennedy, Benjamim Franklin. George Orwell, Elizabeth Taylor etc. Veja http://www.lettersofnote.com/2009/12/yes-virginia-there-is-santa-claus.htmlos originais da cartinha da Virgínia e do editor do The Sun. Na parte das chaminés achei prudente acrescentar janelas e portas. No fim, Bebel apenas me olhou desconfiada e saiu, talvez em direção daquele embrulho pobremente escondido. Feliz Natal, Bebel e leitores! Da Adega Estojos de Natal. Vou participar de um “Amigo Oculto” (ou “Secreto”) onde sei que vários participantes pediram vinho. Fora desse tipo de festas, conheço muito gente para quem uma garrafa de vinho seria o presente ideal, o mais oportuno – afinal, estamos em tempo de festas. Por isso, a iniciativa da Vinícola Aurora de oferecer estojos de vinhos premiados para essas festas é um senhor quebra-galho. Facilita demais o processo de escolha. Embalagens especiais com uma ou duas garrafas de vários vinhos e espumantes, com uma ou duas taças e até mesmo um decantador. Há estojos em que encontramos também um diário de viagens: a época é de férias. Eis as opções: Aurora Espumante Moscatel (o mais premiado do Brasil no exterior), com 2 taças de vidro; Aurora Espumante Prosecco (com 2 taças); Espumantes Conde de Foucauld Branco, Brut ou Demi-Sec – cada maleta contém 1 garrafa e 2 taças de vidro para espumantes; Marcus James Happy Hour frisantes - embalagem com 1 garrafa de Marcus James Happy Hour Branco e 1 garrafa de Marcus James Happy Hour Rosé; Aurora Varietal Cabernet Sauvignon - 1 garrafa e 1 taça de vidro; Marcus James Cabernet Sauvignon apresenta-se em 2 opções: 1 garrafa com 1 decantador de vidro e 1 garrafa com 1 taça de vidro; Aurora Colheita Tardia vinho de sobremesa– 1 garrafa e 1 taça de vidro; Saint Germain Cabernet Franc - 1 garrafa e 1 taça de vidro; Country Wine com 2 garrafas – 1 garrafa de Country Wine Tinto Suave e 1 garrafa de Country Wine Branco Suave. Veja mais no site da http://www.vinicolaaurora.com.br/ou na matéria da revista http://www.revistafator.com.br/ver_noticia.php?not=185426

17.11.11

As grandes jogadas

Neste 17 de novembro, a terceira quinta-feira do mês veremos mais uma vez o lançamento mundial do Beaujolais Nouveau. Por mais que uma pessoa viva com a cabeça enfiada na terra, como uma ema (ou avestruz, você escolhe), já ouviu sobre esse vinho e sua aparição mundial nos 17 de novembro. Acontece em meio a muito estardalhaço, festivais, em todo o mundo desde 1985. Antes, a promoção se restringia à França, mais precisamente à região de Beaujolais. Já escrevi aqui sobre isso aqui, em 2006, quando venderam 60 milhões de garrafas (“O Nouveau e as panaceias”).
Pois só esse ano, o Beaujolais Nouveau 2011 deverá vender mais de 67 milhões de garrafas em todo o mundo, um terço ou mais do que produz toda a região. Um vinho fresco, engarrafado apenas 6-8 semanas depois da colheita, feito para ser bebido logo. A maior parte da produção, 60%, fica na França. O restante viaja pelo mundo: os japoneses, grandes fãs do vinho, ficaram esse ano com sete milhões de garrafas.
O blogueiro Steve Heimof classifica o Beaujolais Nouveau como o maior esquema de marketing da moderna história do vinho. Mas ele chama atenção para outros grandes esquemas para vender mais vinhos. Vejamos:
1. O Paradoxo Francês: em 1991, o cientista francês Serge Renaud foi entrevistado pelo programa “60 Minutes”, da TV americana CBS, e explicou que, em razão principalmente do vinho tinto, os franceses tinham muito menos problemas cardíacos que os americanos, mesmo com uma dieta muito mais rica em gordura. Houve uma verdadeira revolução no mundo dos vinhos: com uma multidão correndo atrás do vinho, em particular o tinto (e, através dele, do hoje famoso resveratrol), para resolver problemas de saúde.
2. O Julgamento de Paris. Ele aconteceu em 24 de maio de 1976, criado e organizado pelo inglês Steven Spurrier, autor, crítico e comerciante de vinhos com forte base em vinhos franceses. Ele promoveu um confronto em vinhos da Califórnia e de Bordeaux. O “julgamento” resultou de duas degustações às cegas: uma para Chardonnays e outra para Cabernets (ou blends de Cabernets), todos topo de linha das duas regiões. Ao todo, foram onze jurados, mas as notas de Spurrier e da americana Patricia Gallagher não foram consideradas, deixando assim nove jurados franceses, sumidades em vinho todos eles. O resultado é sabido: os vencedores foram o tinto americano Stag’s Leap (concorrendo com um Mouton Rothschild, por exemplo) e o branco, também americano, o Château Montelena (à frente dos grandes borgonhas presentes). Virou livro e filme.
3. Sideways, o filme. Com base na novela quase autobiográfica de Rex Picket, o filme de 2004, dirigido por Alex Paine, colocou o vinho efetivamente na história do cinema. Claro que promoveu além de promover os vinhos em geral e as lindas vinícolas da Califórnia, fez a Pinot Noir disparar nas vendas, dando uma senhora derrubada na Merlot. É uma história simples, que viajam para provar vinhos. E descobrem muita coisa a respeito deles mesmos. Também já escrevi sobre o filme aqui, logo que saiu.
4. Cult Cabernet. É mais um fenômeno californiano: vinhos feitos com a Cabernet, que alcançaram celebridade (como é caso do Stag’s Leap, com justiça), criados por vinhateiros famosos, reputados, acompanhados por ótimas resenhas e produzidos em pouquíssima quantidade (como resultado, seus preços são altíssimos). São vinhos de boutique, com uvas colhidas à mão e selecionadas uma a uma, às vezes em duas tentativas. Formam uma elite e muitas vezes o consumidor tem de entrar numa longa fila para conseguir uma garrafa, quando consegue. E vai pagar caríssimo.
As marcas mais conhecidas seriam: Marcassin, Screaming Eagle, Bryant Family, Araujo, Shafer, Harlan Estate, Dalla Valle, Colgin, Grace Family etc.
Talvez pudéssemos acrescentar dois itens na lista do blogueiro:
1º) Fumé Blanc. Em 1968, entre o assassinato de Martin Luther King, o sucesso do musical Hair, a ofensiva do Tet no Vietnam e a invasão da Checoslováquia pelos russos, inesperadamente aparece no mercado o Fumé Blanc. Um novo vinho francês?
É que o hoje lendário vinicultor (e grande divulgador do vinho) Robert Mondavi, tão americano quanto Michael Corleone, comprou uma grande quantidade de uvas Sauvignon Blanc de um produtor local. Ora, as Sauvignon da Califórnia não vendiam muito bem naqueles dias, tinham paladar muito herbáceo, gramíneo. Daí que Mondavi decidiu por uma cortina de fumaça. Fez o vinho e o colocou em barris de carvalho para madurar.
Daí o nome o “fumé”, defumado pelo carvalho, um nome francês para emprestar prestígio e lembrar o vinho aos Pouilly-Fumé do Loire. Deu certo, certíssimo: as vendas foram às alturas. E vende até hoje. Fumé, inclusive, é reconhecido oficialmente como vinho feito com a Sauvignon Blanc, embora a maioria do consumidor americano até hoje não repare nisso.
2º) A Classificação de 1855. Pois nesse ano, o imperador Napoleão III, imperador da França, sobrinho do grande Napoleão, decidiu realizar uma Exposição Universal em Paris. Seu título oficial foi Exposition Universelle des produits de l'Agriculture, de l'Industrie et des Beaux-Arts de Paris. Segundo os desejos do imperador, os vinhos deveriam ser destaque entre os produtos agrícolas e para isso chamou a Câmara de Comércio de Bordeaux para organizar uma exposição.
Essa a origem da famosa “Classificação Oficial de Vinhos de Bordeaux de 1855”. A tarefa representava um vespeiro, mas os comerciantes conseguiram uma lista, hoje famosa e ainda pouco alterada. São 58 châteaux, ao todo: quatro premier crus, 12 seconds, 14 troisièmes, 11 quatrièmes e 17 cinquièmes crus.
Foi a primeira classificação desse tipo no mundo. A classificação acontecia pelos preços que os vinhos conseguiam no mercado, num critério que considerava não os preços do ano anterior, mas de centenas anos passados. Claro que é uma lista que justifica polêmicas. Sem dúvidas, contudo, foi ela que estabeleceu a região de Bordeaux como uma das fontes mais confiáveis de vinhos finos de toda não só de toda a Europa, mas de todo o mundo, muito antes, claro, que se pudesse pensar que poderíamos ter vinhos finos de qualquer outro lugar.
Acabou sendo uma senhora jogada mercadológica. Os vinhos de Bordeaux continuam sendo o grande padrão de qualidade e ajudaram a criar uma mística, com rótulos, classificações complicadas, além de preços assustadores, que serviu paradoxalmente para aumentar mundialmente o interesse na bebida. E até hoje o modelo de Bordeaux (ou da França), no que diz respeita a vinhos, é imitado.
E talvez justifique uma promoção como a do Nouveau. Afinal, “vinho jovem” ou "vin primeur", a Itália e muitos outros países também fazem. Os vinhos finos já estão pra lá de promovidos, via Bordeaux. Mas poucos conseguiram dar uma levantada em seus vinhos simples com tamanho sucesso. O problema é quanto gastam em transporte aéreo: um terço daquelas 67 milhões de garrafas chega aos seus destinos via área, elevando em muito a pegada de carbono, tornando pior os gases do efeito estufa. De qualquer modo, o pessoal de Beaujolais conseguiu transformar o Nouveau no vinho mais conhecido do mundo.
Da Adega
8º Concurso Nacional de Vinhos Finos e Destilados do Brasil, uma realização do Concurso Mundial de Bruxelas (considerado o mais importante e um dos maiores do mundo), realizado em Santana do Livramento (RS), de 12 a 14 de novembro, premiou 57 vinhos e Oito cachaças com medalhas Grande Ouro, Ouro e Prata.
Entre os vinhos, sete foram contemplados com medalha de Grande Ouro, 30 com medalhas de Ouro e 21 com Prata (veja a relação completa a seguir). Desses, o vinho Dom Pedrito Sauvignon Blanc 2011 foi escolhido como o “Vinho Branco do Ano de 2011”, o Espumante Habitat Dom Bonifácio Champenoise Brut 2009 o “Espumante do Ano de 2011” e o Salton Desejo 2007 o “Vinho Tinto do Ano de 2011”. Esta edição contou com um júri de 13 especialistas, brasileiros e estrangeiros, que avaliou as cerca de 200 amostras inscritas em provas às cegas, dentro dos padrões internacionais e do rigoroso controle técnico da entidade belga.
De acordo com Eduardo Viotti, diretor da revista Vinho Magazine e responsável pelas degustações do concurso, as oito edições têm apresentado uma média de notas sempre crescente, o que atesta a rápida e segura evolução da qualidade média do vinho brasileiro ao longo dos oito anos em que o evento é realizado no Brasil.
Os sete jurados estrangeiros, experientes jornalistas especializados de Nova York (Marc Golodetz) e San Francisco (Willian Blake Gray), dois jurados de Paris (Xavier Leclèrc e Marie Joanna Roginska) e dois de Montevidéu (Isabel Mazzucchelli e Daniel Arraspide) e também da Alemanha (Walter Eberenz) e de Bruxelas (Baudouin Havaux, presidente do júri), foram unânimes em reconhecer a alta qualidade alcançada pelos vinhos finos brasileiros e o nível médio excelente da produção.
Completaram o time de degustadores os experts, jornalistas e sommeliers Helena Hamu Mattar, Eduardo Viotti, Didú Russo, César Adames, Jairo Monson e Affonso Ritter.
Também foram premiadas cachaças nacionais, representando a mais típica e autenticamente brasileira de todas as bebidas. Os destilados premiados foram:
Cachaça Branca Itagibá Descansada (Itagibá) - Grande Ouro; Cachaça Colônia do Pito Ouro (Antonio Dias) – Grande Ouro; Cachaça Casa Bucco Envelhecida (Casa Bucco) – Ouro; Cachaça Branca Casa Bucco (Casa Bucco) – Ouro; Cachaça Branca Calor Brasilis (Casa Bucco) – Ouro; Cachaça Bendita Excelência (Bendita) – Prata; Cachaça Poesia Branca (Poesia) – Prata.
Para quem não tem o costume de dar uma pro santo, cachaça descansada é aquela que, após produzida, fica armazenada em recipiente neutro, por algum tempo (normalmente de 2 a 4 meses), de modo a ter tempo de saber o que vai ser de sua vida. Fica lá, encucando como vai nos encantar quando pudermos servi-la.

4.11.11

Saúde, Knip Schlip...

Falo primeiro de lua de mel. Tive que sair às pressas: primeiro para Campinas e em seguida São Vicente, onde fui madrinha de um casamento. Tive problemas para blogar, pois meu laptop começou a fazer greve desde Petrópolis. Em Campinas, um dos maiores centros científicos e tecnológicos do país e onde poderia colocar minha máquina funcionando novamente, o tempo foi consumido em contatos com potenciais compradores de minhas pintadas, afinal vivo disso. Resultado: corri para São Vicente: era uma das trocentas madrinhas do casamento de uma sobrinha que repentinamente lembrou-se de mim.
Sei que o sucesso de um blog depende em muito de sua frequência. E tenho blogado muito pouco. Em parte, de tempo, de viagens como essa, quando invariavelmente esqueço notas, documentos etc. em casa. E quando o laptop insiste em ficar calado. Pior é insisto em fundamentar o texto, informar sobre fontes, acrescentar referências, buscar algo novo. E isso atrapalha. Escrevo há 12 anos sobre o mesmo assunto. Muitas vezes fica difícil encontrar algo novo.
Mas o fato de ter parado em São Vicente já ajudou. A ilha paulista foi a primeira vila fundada pelos portugueses nas Américas. A expedição de Gaspar de Lemos chegou à ilha justamente no dia 22 de janeiro de 1502, que celebra São Vicente, padroeiro de Lisboa e também dos vinhateiros e vinagreiros – o que dá na mesma, tudo depende da mão de quem está fazendo a bebida: ou temos vinho ou temos vinagre.
Em tempo: de São Vicente rumei para Sampa onde o problema do laptop foi resolvido: era a bateria, que estava usando de maneira errada; quando ligo a máquina na corrente elétrica, devo retirar a bateria, o que nunca fiz. De SP para o Rio, de avião, e do Rio para a Serra de ônibus já deu para colocar esboçar minha coluna, que continua aí embaixo.
Poderia continuar a falar de outros santos padroeiros do vinho, como Santo Armando de Maastricht. Francês (584 – 675), nascido nobre, catequizador e bastante popular. É o santo padroeiro de cervejeiros, estalajadeiros, plantadores e mercadores de vinho. Falando assim, mais parece que era um alcoólico. Ah, é também o santo dos escoteiros, não me perguntem a razão.
Mas já falei de alguns padroeiros do vinho (veja aqui). Portanto, voltemos ao casamento, acontecimento que também poderia considerar para uma coluna. Pois falou em casamento, falou em lua de mel. E a lua de mel teria esse nome por um costume que data mais de dois mil anos. Na Babilônia, a noiva ganhava do pai um dote de hidromel (vinho à base de mel e água), em quantidade suficiente para pelo menos um mês de farra, período chamado para de “mês do mel” ou para o que é hoje “lua de mel”. Pelo que sei, talvez o único fermentado a desfrutar dos efeitos do pólen, a grande fonte de proteína das abelhas. Saiba mais sobre o vinho de mel ou hidromel.
Consegui chegar em Secretário na noite de 31 de outubro e nada indicava que estávamos em pleno Halloween, o dia das bruxas. A noite friiiiia, estava calma, muito calma. Como aproveitar a data nesse blog de recomeço? Foi uma velha amiga quem me ajudou.
Vocês conhecem o Maria Geek, um site, claro, para geeks, novidadeiras, doidas por tecnologia? Pois é dirigido pela Marcella Brum, minha editora em aventuras passadas (e que editora, gente). Pois ela e a Ciça Mattos bolaram esse espaço que põem a tecnologia a serviço das mulheres, tanto como entretenimento, socialização, como um instrumento de trabalho.
No Maria Geek achei uma receita do Bloody Mary, a “Maria Sanguinária” como uma lembrança de um dos muitos personagens cultuados durante o Halloween, os vampiros. No tópico “Os vampiros estão soltos” é feita referência ao Vampiraria, blog cheio de sangue e dedicado ao “sedutor submundo dos vampiros” (tenho certeza que eles não acham que o seu é um submundo). Até agora não entendi direito como uma festa nórdica veio parar por aqui e o que o Bloody Mary estaria fazendo num site de vampiros. Tá bom que tem esse “sanguinário” no nome.
O Bloody Mary foi criado por um francês, Fernand “Pete’ Petiot, barman do Harry's Bar de Paris, em 1920. Em 1934, o milionário John Astor, dono do famoso hotel St. Regis, na 5ª. Avenida, convence Fernand a se transferir dirigir o bar do hotel, onde ele apresenta o drinque, mas como o nome de Red Snapper (“Pargo Vermelho”), até que dez anos depois Astor decidiu que o nome original poderia ser do agrado do público. As receitas de ambos são absolutamente iguais. (Depois explico a história do Red Snapper).
Veja a receita do Maria Geek no filmete e saiba como fazer.
Tudo em cima? Padroeiros do vinho, origem da lua de mel, o espaço geek da amiga Marcella e suas incríveis novidades e com um drinque combinando com o dia das bruxas. Puxa, acho que já tenho uma coluna até que movimentada.
O título de hoje achei por último. Serve como um pedido de desculpas pela ausência um tanto longa. Fucei daqui, remexi dali e achei um tópico onde seu autor descobriu como brindar em dezenas de idiomas. Sabe como se brinda em zulu, língua do maior grupo étnico da África do Sul? Lá, tim tim é úugui uaua! Com todo o respeito, soa mais a grito de dor depois de uma topada. Em havaiano é Okole Maluna (sim, tem aquele gingado sensual do hula, a dança havaina); em hebreu é לְחַיִּים!, L’Chaim!; em húngaro, Egeszsegere!, que só saberia dizer sóbria. Já em grego é στην υγειά σας! (stin eyiassou!). Acho que os gregos não vão poder brindar tão cedo, pelo andar da carruagem na área do Euro. Também não sei se é só no Brasil que se dá um pro santo.
Saúde para todos e em 51 idiomas (até em marciano, como no título).
Da Adega
Aurora cheia de ouros e pratas. Cinco espumantes da vinícola foram premiados na 7ª Edição do Concurso do Espumante Brasileiro, realizado dias 25 e 26 de outubro na Câmara da Indústria e Comércio de Garibaldi, na Serra Gaúcha. O Aurora Chardonnay Brut, Aurora Moscatel e Marcus James Brut receberam medalha de ouro, enquanto os Conde de Foucauld Rosé Brut e Branco Brut ficaram com medalha de prata. Um senhor resultado, já que o concurso avaliou um total de 231 amostras de espumantes inscritas por 70 vinícolas. Saiba mais no site.
Circuito de Vinhos Brasileiros de Degustação. Olha só o estrago que essa viagem (veja cima) causou. Perdi esse evento, em particular as palestras de Marcelo Copello e de Deise Novakoski. Podia ter ficado no Rio para depois seguir para São Paulo. A coisa toda aconteceu dia 27 de outubro, no Iate Clube.
Os selecionados. Na 19ª Avaliação Nacional de Vinhos, safra 2011, realizada pela Associação Brasileira de Enologia e coordenada pela Embrapa Uva e Vinho, entre os dias 06 e 26 de agosto em Bento Gonçalves, RS, foram selecionados 16 vinhos entre 383 amostras apresentadas por 72 vinícolas, avaliados por 113 enólogos. Os vinhos foram testados às cegas:
Na Categoria Vinho Base para Espumante: 1) Chardonnay, da Domno do Brasil; 2) Chardonnay, da Casa Valduga.
Na Categoria Branco Fino Seco Não Aromático: 3) Riesling Itálico, da Cooperativa Vinícola Aurora; 4) Chardonnay, da Cooperativa Vinícola Nova Aliança; 5) Chardonnay, da Vinícola Góes & Venturini; 6) Chardonnay, da Vinícola Don Giovanni.
Na Categoria Branco Fino Seco Aromático: 7) Moscato R2, da Vinícola Perini; 8) Moscato Giallo, da Vinícola Don Guerino.
Na Categoria Rosé Seco: 9) Cabernet Sauvignon, da Vinícola Almadén.
Na Categoria Tinto Seco Jovem: 10) Merlot, da Vinícola Salton.
Na Categoria Tinto Fino Seco: 11) Merlot, da Basso Vinhos e Espumantes; 12) Merlot, da Luiz Argenta Vinhos Finos; 13) Syrah, da Vinícola Almaúnica; 14) Cabernet Sauvignon, da Rasip Agropastoril; 15) Tannat, da Vinícola Gheller; 16) Tannat, da Seival Estate.
Veja o resultado completo no site da Associação Brasileira de Enologia.

21.9.11

Uma vida boa

“Essa é uma carta difícil de escrever porque, quando postada, servirá para informar aos membros do fórum, convidados e amigos que eu morri”. Daniel Rogov, um dos mais influentes críticos de vinho e gastronomia que o mundo conheceu, postou seu próprio obituário apenas três dias antes de morrer, no último dia 7, em Telavive.
O grande crítico está se dirigindo aos participantes do fórum que moderava no Wine Lovers Page, onde também produzia artigos, além daqueles que publicava no diário israelense Ha’aretz.
Descobri Daniel Rogov na Internet, lá pelos idos de 2000, num site aparentemente já desativado, o stratsplace.com. Somava dezenas e dezenas de artigos sobre história, literatura, costumes quase sempre a partir de culinária, bebidas em geral e, claro, dos vinhos. Daniel queria, sobretudo, nos ensinar: “vinho e comida não são simplesmente coisas que entram em nosso corpo. São um reflexo de nossa antropologia, história, psicologia, necessidades sociais e, claro, prazer”.
Ensinava entretendo, com muito humor. Por ele ficamos sabendo quem foi a Suzette do famoso e flambado crepe, e como o pai do romantismo, François-René de Chateaubriand inventou o famoso bife, hoje mais famoso do que seu prolífico autor, sempre na cabeceira de Machado de Assis. Com Daniel aprendi como se faz o empadão de alho-poró, criado em homenagem a Lucrécia Bórgia para um de seus casamentos (e sem usar poções venenosas, especialidade da família).
Ele vai dos dois Apicius a Zola, do Maxim’s em Paris, ao Castelinho, em Ipanema nos ensinando uma centena de pratos, suas histórias, os costumes e os drinques e, sobretudo, os vinhos consumidos no percurso: temos a Sopa à Apicius (ou seja, do segundo deles, Gavius Apicius, autor do mais antigo livro de culinária, ainda em uso, De re coquinaria (“Sobre culinária”), a Perdiz à Borgonha, do Marques de Sade, os Bolinhos de Lagosta ao Molho de Camarão do jornalista norte-americano A. J. Liebling, que fez a fama da revista The New Yorker; o Fois Gras Sautéed (ou salteado) de Hemingway, seu preferido em Paris; o pato de Alice B. Toklas (escritora, magnífica cozinheira e eterna parceira de Gertrude Stein), temperados sempre com eau de vie, a guerra entre o braço britânico e o ramo francês dos Rothschilds (Château Mouton Rothschild vs Château Lafite).
Há tempos, procurava material especial para a Páscoa e me socorri em Daniel, lendo o que escreveu sobre o que se comia na Terra Santa em 2000 a. C. E lá estão dicas valiosas sobre o que foi comido e bebido por Jesus e seus discípulos na famosa Última Ceia. A matéria gerou polêmica; a turma que não admite que Jesus e seguidores tenham consumido uma bebida alcoólica protestou. Na Bíblia, onde se lê vinho querem que seja suco de uva. Só não posso é negar sete mil anos de evidências arqueológicas e químicas. Que milagre seria transformar água em suco de uva? Se fosse suco, a Bíblia não pediria moderação ao bebê-lo.
Mais recentemente, Rogov me passou dicas valiosas sobre a organização de degustações de vinho em casa, os bistros à vin (wine bars) de Paris (“dos poucos lugares de Paris onde se pode escapar das hordas de turistas e aprender muito sobre vinhos”) e um bocado sobre caviar, “a iguaria definitiva”, da qual Daniel nos oferece até uma receita, de Blinis com caviar, “a preferida do Tsar Nicolau II”.
Viajou um bocado. Esteve até no Rio de Janeiro, em fins de 1960. Daqui ele lembra um “wine bar-bistro”, localizado “na praia de Ipanema na interseção com a Rainha Elizabeth”. “Todas as suas paredes internas eram feitas de garrafas de vinhos dispostas horizontalmente. Um charme absoluto…” Será que Daniel conheceu o célebre Castelinho, reduto da boemia que transformou o bairro numa República independente, conhecida em todo o mundo? Foi o primeiro “point” da praia. Será que a caipirinha lhe escapou? Duvido.
Daniel Rogov nasceu nos Estados Unidos, filho de imigrantes judeus russos, financeiramente confortáveis e bem equipados culturalmente, para quem vinho e boa comida eram importantes.
Mal completou o secundário e suas boas notas lhe valeram um presente de viagem a Paris. Logo se apaixonou pela cozinha e vinhos locais. Chegou e ficou: foi em Paris onde começou sua carreira jornalística. Começou a enviar matérias sobre comida e vinhos para revistas e jornais da América e mais tarde para publicações francesas e suíças. Não queria nada com trabalho físico. Preferia acionar sua cachola. Ninguém conhecia quem era Daniel Rogov. “Não sabia nada sobre comida ou vinho, mas pense bem: nem os americanos”, diz Rogov. “Era tudo na base da Betty Crocker” (personagem criado pela General Mills em 1921, rapidamente transformado num símbolo culinário da América de antanho: dava receitas, respondia a perguntas das donas-de-casa e criava produtos prontos. Aqui no Brasil tivemos uma equivalente, criada pela antiga Fleischman-Royal, nos anos 60: a nutricionista Maria Silveira, de grande sucesso). Naquela época éramos todas “do lar”.
Depois de anos viajando pelo mundo, resolveu conhecer Israel, onde chegou em 1976. “Era quente o bastante para pegar uma praia, por isso fiquei”. Não foi só o clima que o motivou: trouxe com ele o endereço de uma amiga feita na França. Juntaram-se novamente e juntos ficaram até a sua morte. O casal tem uma filha que mora nos Estados Unidos.
Na sua chegada, os vinhos de Israel eram um xarope apenas tolerado nas ceias de Páscoa, nada que valesse a pena comentar. Na mesma época, um professor da Universidade da Califórnia em Davis em visita ao país aponta uma região ao norte, as Colinas de Golan (entre Israel, Síria, Líbano e a Jordânia) como ideais para o cultivo de vinhas. Daniel talvez tenha sido o primeiro a promover a região. Aliás, ele é considerado como o um dos responsáveis pelo grande salto de qualidade conseguido pelos vinhos do país, hoje aplaudidos pela crítica internacional.
Nome respeitado em todo o mundo, Daniel Rogov, além de crítico de vinhos e gastronomia do jornal Ha’aretz e autor de guias de vinhos israelenses sempre procurados, foi consultor de Hugh Johnson, um dos mais respeitados autores e críticos de vinho do planeta, para a Modern Encyclopedia of Wine e os Pocket Wine Book. Para o prolífico Tom Stevenson, outro grande autor, reconhecida autoridade em champanhe, contribuía para o Wine Report.
Muito pouco se sabia sobre a vida privada de Daniel. Rogov era como se assinava, mas seu sobrenome era Joroff. Até mesmo sua idade correta não é conhecida. Falam que morreu aos 70 anos, mas todos afirmam que tinha muito mais.
Para seus seguidores no fórum do Wine Lovers Page, deixou no último dia 7, o seu obituário, “uma carta difícil de escrever”, tinha consciência que sua morte era iminente. Estava mal (morreu de câncer no pulmão), o final não foi fácil, mas “consegui manter-me à custa do meu otimismo”. Quanto à comida e ao vinho, “escrevi sobre eles por todos esses anos com um profundo sentimento de amor e devoção, ambos emocional e intelectual”. Ele se considerava um Umberto Eco do vinho, escrevia de modo a deixar o leitor inteligente chegar às suas próprias conclusões. Ao final da carta, a nota de otimismo e esperança para os vivos: “No fim do dia, foi uma vida boa”.
Da Adega
Rapariga da Quinta. A wine.com anuncia o alentejano Rapariga da Quinta, com a Alicante Bouschet, Aragonês e Trincadeira, um português mais moderno, elogiado pela Wine Enthusiast. Veja aqui.
Bebida Online. Rum, whisky, licor, vodca, vinho: consulte o site Bebida Online e receba bebidas em casa. A base fica no Paraná, os preços são bons, mas há uma taxa pelo transporte, naturalmente. Se comprar acima dos R$ 799,00 o frete é grátis.
Compre 4 e leve mais duas. A Vinitude oferece o Elegance de Lesparre Merlot 2004, o Elegance de Lesparre Rosé 2005, e ganha duas meias garrafas do Les Grands Bois Chantant 375 ml 2008. Todos bordaleses. Veja aqui.
Espanhóis. Dê só uma olhada na Península Vinhos. Seus espanhóis são muito atraentes.
A Aurora foi longe. Está chegando agora na Nova Zelândia e com isso se faz presente em todos os cinco continentes. Os neozelandeses, com ótima mão para vinhos com a Sauvignon Blanc e Pinot Noir, vão agora poder experimentar nas festas de fim de ano do Espumante Aurora Boreal Moscatel.
De quebra, a vinícola de Bento Gonçalves conquistou seis prêmios no Vinus 2011, em Mendoza, com os espumantes Marcus James Demi-Sec (ouro duplo), Aurora Brut Chardonnay (ouro) e Conde de Foucauld Branco Brut (ouro). Medalhas de pratas foram conquistadas pelos espumantes Aurora Moscatel Rose, Aurora Pinot Noir Brut e Marcus James Brut. Saiba mais.

4.9.11

Nade de costas

A amiga finalmente conseguiu uma dica de programa para o fim de semana. Encontrou-a num site especializado: um restaurante é muito elogiado por sua clientela: um cardápio inovador e uma selecionadíssima carta de vinhos. Os elogios eram muitos. Ela não sabe direito como chegou ao site, pois colhe muitas dicas no Facebook, no Linkedin, no Twitter e ainda no velho e-mail.
 Saiu do restaurante pra lá de decepcionada, diria até que revoltada. Sentiu-se roubada, no serviço, nos pratos e nos vinhos, sem falar da conta. Leu no site a opinião do que seria um frequentador: os vinhos em taça eram maravilhosos. Nada disso: só resto de garrafa de vinhos de péssima qualidade.
O que talvez a amiga não soubesse é que, há anos, esse logro se repete na Internet. O mar não está pra peixe. A tal opinião do freguês não é falsa, não. Ela é verdadeira, só que o freguês vendeu a opinião dele. Como a Internet, principalmente agora com as tais redes sociais, tem a capacidade de rapidamente multiplicar informações, criar burburinhos (buzz), a dica chegou a ela como num passe de mágica.
Existem sites e serviços especializados. E como não poderia ser diferente, a prática chegou aos vinhos, como no exemplo abaixo:
“Ofereço um Guia de Vinhos que ensina como escolher diferentes vinhos e vai transformá-lo num profissional capaz de fazer bonito numa degustação – tudo por cinco dólares”.
E a pessoa que compra esse guia certamente não sabe nadica de vinhos. Quer apenas fazer bonito ou até usar esse “trabalho” para vendê-lo como se fosse seu. Mesmo à custa de uma fraude. Veja aqui. O “moneyman94” que oferece esse trabalho, mostra até a cara. Ele certamente pode escrever loas sobre qualquer vinho ou vinícola, que irão aparecer num site como um peixinho para você pescar.
O site Fiverr vende de tudo: de lições de espanhol à criação de slogans “cativantes” para qualquer tipo de produto ou pessoa, com direito a menções na Internet ou em qualquer outra mídia (num programa de rádio, por exemplo).
Todas as ofertas são baratinhas, apenas cinco dólares, como já indicado no nome do site. Vendem de tudo, sonetos shakespearianos, gritar repetidamente o nome de sua empresa o mais alto possível, promover um negócio ou seu website para milhares de pessoas. Claro, se o negócio é bom, lícito etc., não importa.
Você escreve um livro e por um trocadinho é transformado num novo Rubem Fonseca, pois encomendou “críticas” favoráveis que enrolarão a freguesia. Estou enganada ou o nome disso não é falsidade ideológica?
A justiça americana não tem dúvidas: é crime. Em 2010, a Reverb Communications, da Califórnia, foi “parada” pelo Procon americano (Federal Trade Comission) por publicidade enganosa. A Reverb, agência de promoção e RP, simplesmente fez com que seus funcionários escrevessem resenhas positivas para os jogos eletrônicos de seus clientes nas lojas da Apple iTunes. O caso é que omitiu que recebia por isso. Acionada, a Reverb, claro, botou e galho dentro e removeu da Internet aquelas “críticas”.
Em 2009 foi a vez da Lifestyle Lift, empresa de cirurgia plástica (ou cosmética, estética): ela teve que pagar uma multa de US$ 300 mil pelos falsos testemunhos sobre seus produtos/serviços na Internet. A empresa colocou anúncios na mídia, tipo “antes e depois”, considerados mentirosos, pois na prática os resultados foram desastrosos para as usuárias. Você pode ver uma matéria publicada no YouTube (partes 1 e 2) ou no Times. Aqui, é a sua pele que está em jogo, muito mais do que seu bolso. Você acredita numa opinião, no “depois”. E fica desfigurada.
A prática é antiga e, segundo matéria recente do New York Times, dezenas de milhares de avaliações (sobre qualquer coisa: publicações, produtos, serviços) são pagas. Mas, diferente de um anúncio formal, onde temos a assinatura e logomarca do responsável, essas parecem opiniões inocentes, honestas, singelas. Sites da importância do Amazon, o maior varejo virtual do mundo, Digital Point, entre outros. A Amazon, inclusive, possui um serviço, o Mechanical Turk, que paga por resenhas.
Essa prática é tão preocupante que levou pesquisadores da Universidade de Cornell a uma investigação. “Evoluímos por 60 mil anos aprendendo a falar cara a cara com as pessoas. Mas agora estamos nos comunicando virtualmente. E parece que está bem mais difícil identificar fraudes”, comentou um professor de ciência da comunicação da Cornell, T. Hancock.
Nos “comentários” que lemos nesses sites, como distinguir o falso do verdadeiro? O pessoal da Universidade desenvolveu um algoritmo (espécie de receita de bolo, onde os passos se repetem mecanicamente, sem que necessitem de decisões lógicas) e chegou a um padrão para as resenhas falsas.
Elas tendem a ser narrativas, falando de sua experiência num hotel (ou livro, vinho, casa, apartamento, torradeira, carro, o que for), sempre usando superlativos (o máximo!!, sem igual!!, cinco estrelas!!, deslumbrante!!, inesquecível!!), sem entrar no descritivo (pudera, a pessoa nunca esteve no lugar ou provou o vinho ou usou a torradeira). E sempre usando a primeira pessoa (eu isso, eu aquilo), para reforçar a credibilidade – num tempero onde se acrescenta “família”, para dar segurança: ninguém leva a família para um frege. “Estive com minha família em Brogodó, e o Timóteo Cabral é uma flor de pessoa, nada disso que falam por aí”.
Já outros comentários, garantem que Seráfia é bem pior. Pois é, a concorrência é diabólica. Temos também uma enxurrada de resenhas negativas. Se um dentifrício limpa mais branco pra uns, é um desastre para outros. Em quem acreditar? Veja a matéria no site especializado em reclamações do consumidor, o The Haggler (mais ou menos, “O Pechincheiro”).
Com relação diretamente aos vinhos, quem frequenta o CellarTracker, que tem mais de dois milhões de resenhas de vinhos feitas por clientes avulsos, ou o Snooth, que se proclama possuidor do maior banco de dados de vinhos do mundo, tem o direito de desconfiar que haja no meio alguma coisa “comprada”, algum abuso. Ambos vendem vinhos virtualmente. Acontece que ao lado de cada resenha temos um link para que o usuário possa checar o valor do comentário. Os perigos parecem menores.
Estamos, portanto, falando de uma Internet democrática, sem dúvidas, mas cada vez mais cheia de mentiras e de meias-verdades, a mais covarde das mentiras. Para quem frequenta redes sociais, faça como os passarinhos, que só dividem a minhoca quando seguros em seus ninhos. Portanto, a recomendação é a popular, mas infalível: em rio que tem piranhas, jacaré nada de costas.
Da Adega
III Serra Week. Se você quer mesmo ajudar a Serra a se recuperar do desastre do verão passado, prestigie a terceira edição do Serra Wine Week, evento realizado por restaurantes e hotéis da Serra (Petrópolis, Araras e Itaipava), que vão oferecer vinhos com preços especiais, jantares harmonizados, tudo com preço fixo.
Os vinhos serão fornecidos pela importadora Gran Cru, que selecionou importantes rótulos italianos, franceses, espanhóis, portugueses e chilenos para combinar com a oferta culinária, que vai da comida italiana à japonesa. Consulte o site do evento e saiba mais sobre a programação. Atenção que o Serra Wine Week começa dia 15 e encerra 25 de setembro. Não perca. Ajude a Serra.
Degustação Sensorial. Antes de partir para a Serra, não perca a Degustação Sensorial dia 14, às 19h30min, na SBAV-RJ (Sociedade Brasileira de Amigos do Vinho). Você vai degustar vinhos às cegas e ser estimulado a analisar a bebida através do tato, visão, audição, paladar e olfato. Logo, não precisa ser um expert em vinhos. A prova será conduzida por Cacá Azevedo, da SBAV, que utilizará recursos como lápis de cor para desenhar, esferas para traduzir o volume na boca e caixas de fósforo para reproduzir sons e texturas para o tato. Mais informações pelo telefone (21-2537-2424) ou pelo site.
Sommelier por lei. A presidente Dilma sancionou por fim a lei que regulamente a profissão de sommelier no Brasil (lei 12.467 de 26 de agosto de 2011). Agora, sommelier é o profissional tecnicamente formado, que à data da sanção da lei já exerça a função há mais de três anos. É o encarregado de executar serviço especializado de vinhos em empresas de eventos gastronômicos, hotelaria, restaurantes, supermercados, enotecas, companhias aéreas e marítimas. Obrigadíssimo, presidenta. Tinha mesmo que ser uma mulher para dar uma melhorada na nossa casa. Agora, falta baixar os impostos do vinho.

23.8.11

Entre secos e molhados

Vinho seco? Como um líquido pode ser seco? Essa dúvida esteve na cabeça de meu sobrinho, o Fábio, por muitos anos. Agora, depois de um ano trabalhando no Canadá, ele conseguiu tirar essa história a limpo.
O ceticismo a respeito da “secura” ainda campeia na cabeça de muita gente. Acontece que seco, neste caso, diz respeito ao sabor: tecnicamente é o oposto de doçura. Em vinhos completamente secos, o levedo conseguiu converter em álcool todo o açúcar natural contido nas uvas, durante a fermentação. Quando a fermentação é interrompida (natural ou forçadamente), o açúcar que resta (chamado de “açúcar residual”) alivia a sensação de secura do vinho, deixando-o mais agradável.
Por sua vez, vinho doce é aquele nem todo o açúcar foi convertido em álcool. E a expressão “seco” gera confusão a percepção de doçura varia muito de pessoa para pessoa. Meu sobrinho acaba de visitar com sua mulher, a Renata, uma das regiões vinícolas mais importantes do Canadá, em Niágara, Ontário. O casal experimentou alguns vinhos. Será que o Fábio, que não muito de beber, conseguiu tirar sua dúvida?
Primeiro, os “secos” (e depois os “molhados”). Pelo que li, a maioria das pessoas começa a perceber o doce nos vinhos a partir de concentrações de 0,5% de açúcar. Alguns vinhos são fermentados quase que totalmente secos, mas podem dar a impressão de doçura, sensação que tem origem não necessariamente no tal “açúcar residual”, mas no sabor de uvas maduras, eventualmente das notas de baunilha dos barris de carvalho ou ainda por fatores como acidez, taninos, álcool e glicerol (também subproduto da fermentação, contribui com um pouco de corpo e doçura para o vinho).
O açúcar que restou no vinho é medido em gramas de açúcar por litro de vinho, normalmente abreviado como g/l ou g/L. É muito raro encontramos vinhos com menos de 1g/L, pois certos tipos de açúcar não conseguem fermentar, como a pentose (tem esse nome por conter cinco átomos de carbono em seu núcleo).
Segundo a regras da União Europeia, os vinhos secos são aqueles com até 4 g/L (mas se bem equilibrados com acidez, até 9g/L), os meio-secos, até 12g/L (ou até 18 g/L se bem balanceados com a acidez), os meio-doces até 45g/L e os doces com mais de 45g/L.
Os espumantes apresentam especificações diferentes: um brut nature (quando não há adição de açúcar), de 0 a 3 g/L; extra brut, de 0 a 6 g/L; brut, de 0 a 12g/L; extra sec (extra seco), de 12 a 17 g/L; sec (seco), 17 a 32 g/L; demi-sec (semi-seco), 32 a 50 g/L; doux (doce), mais de 50g/L.
Qualquer vinho com mais de 45g/L, portanto, pode ser considerado doce. O famoso Château d’Yquem, mencionado aqui na última coluna, tem entre 100 e 150g/L. O Tokaji Eszencia vem com 450g/L. São divinamente doces, em nada enjoativos, pois suas uvas conseguem equilibrar deliciosos: feitos com uvas que conseguem reter a sua acidez. Os Château d’Yquem são feitos a partir de uvas afetadas pela Botrytis cinerea, um fungo que consome toda a água da uva, deixando apenas açúcar e ácido, fato conhecido como Podridão Nobre. Os Sauternes, os Tokaji Eszencia e os doces de Vouvray são, entre outros, feitos a partir desse fungo. Sua fermentação é muito lenta e a quantidade de açúcar é tão alta o processo é interrompido naturalmente deixando grande quantidade de açúcar residual.
Os vinhos fortificados, como os Porto e Xerez, têm também a fermentação interrompida – só que através da adição de um destilado de vinho (um brandy, uma bagaceira).
É bom que se diga que os dois principais açúcares envolvidos na criação do vinho são a frutose e a glucose. Como, em geral, as uvas para esse tipo de vinho são colhidas muito tarde (daí o nome de “late harvest”, colheita tardia, para esses vinhos), a quantidade de frutose é muito alta, pois a glucose é convertida em primeiro lugar. E a frutose pode ser duas vezes mais doce do que a glucose.
E, finalmente, chegamos ao vinho que encantou meus sobrinhos no Canadá: o icewine, (vin de glace, eiswein em alemão ou “vinho de gelo”) – o que faltava falarmos aqui.
Ele feito do suco de uvas congelado. O fruto é colhido lá pela época natalina, quando as temperaturas ficam na marca dos -8º C. Para garantir isso, as são colhidas à noite, num demorado e penoso processo. Estão tão duras quanto bolas de gude. Vão imediatamente para a prensa para a retirada do suco. Nesse processo, a água contida em cada uva permanece congelada na forma de cristais, restando apenas um pouco de concentrado de ácidos e açúcares da uva, o que resultará num vinho excepcionalmente doce e muito acre. Ele vai fermentar vagarosamente nos próximos meses e eventualmente se transformará no “vinho de gelo”, somando no final apenas 10-15% do total de vinhos de mesa produzidos no país.
O eiswein começou a ser feito sistematicamente na Alemanha a partir dos anos 60. E ao final de 1980 no Canadá, quando uns poucos vinhateiros perceberam que o icewine poderia transformar-se num trunfo para a indústria vinícola do país.
Fábio e Renata visitaram num fim de semana recente a área ao redor da cidade de Niagara-on-the Lake, à beira do rio Niágara, do lago Ontário e bem pertinho da mais famosa cachoeira da América do Norte. A região é linda e abriga 26 vinícolas, das quais meus sobrinhos destacaram duas: o Château des Charmes, da família Bosc, de raízes alsacianas, em Ontário, situada mais próxima das quedas. E a Vinícola Reif, mais ao norte, à beira do rio, ao lado da mais famosa (pelo menos para mim, que conheço o vinho), a Inniskilin, a principal produtora de icewine do país ou pelo menos uma das pioneiras. Mas essa, pelo que entendi, não foi visitada. O que sei é: do casal, o Fábio é o mais arredio às bebidas alcoólicas. O que não acontece com a Renata. Essa chegou muito “feliz” em casa, em particular depois de degustar e degustar e degustar vinhos doces nessas vinícolas. Eles provaram um Riesling Icewine Paul Bosc Estate Vineyard 2007 e outro, do mesmo ano, feito com a uva Vidal (essa e a Riesling são as mais utilizadas no país, pelas cascas mais resistentes às baixas temperaturas). Na Reif, devem ter degustado um icewine feito com a Cabernet Franc, o que dar uma cor rosada ao vinho (coqueluche entre os chineses): o Cab Franc Icewine 2008.
O Fábio comentou da “Renata alegrinha”, “nunca vi a Renata assim”, “pra lá de alegre”, muitas vezes. E repetiu o que todos reclamamos: “pena que esses vinhos são muito caros”. Ele ficou só na base da degustação nos wine bars das vinícolas. Não trouxe vinho para a casa.
Do Canadá só conheço o Inniskilin e o filme “Torrente de Paixão”, com a Marilyn Monroe corneando o marido na cidade de Niágara, lado americano. O filme é de 1953, vi tarde da noite numa dessas sessões da TCM. A história é um suspense com direito ao clichê do “bandido” morrendo cachoeira abaixo (depois de matar a traidora). Ninguém ali experimentou vinhos doces.
Acho que agora o Fábio aprendeu mais sobre os vinhos secos, mas a partir do outro lado da moeda: os molhados.
Da Adega
Povo educado sabe beber. Vale a pena dar uma lida no post do Mauricio Tagliari de mesmo título. É sobre certas leis no Brasil, como a Lei Seca, tortas pelo seu falso conteúdo moralista, com uma aparência de apreço pela vida das pessoas, cega com a campanha do tolerância zero. Se o bafômetro for tão intolerante como a lei, você pode beber um copo d’água que ele vai constatar álcool em seu corpo.
O corpo humano produz naturalmente o seu próprio suprimento de álcool, de modo contínuo, 24 horas por dia, sete dias por semana. Os níveis normais dessa produção ficam entre 0,01 e 0,03 mg de álcool na corrente sanguínea. Como diz o Maurício: lei seca sem um programa de educação torna-se pouco mais que um tormento para os bebedores educados. Leia o post.

13.8.11

Meu pai, esse cometa

“Pai, não põe limão na salada!” Lá estava eu, nos meus seis anos, reclamando como sempre. Não aguentava essa história de temperos – dos quais, por seu lado, o pai não abria mão. E olha que eram só umas gotinhas de limão, substituindo o detestável vinagre. Eu tolerava os verdes apenas com um pouco de azeite e sal.
Daqui a pouco vinha o prato principal: uma carne salteada com legumes, obra de minha mãe, que incluía, além das tiras de alcatra, gengibre fresco ralado, alho picado e pimentão vermelho em fatias (fora os aspargos, a acelga, as rodelas de cebola). Minha mãe ainda colocava vinagre branco. E meu pai entrava com vinho Madeira. Na mesa quase que obrigatoriamente uma garrafa de vinho, ora tinto, ora branco, que tomava com minha mãe, só os dois, demonstrando grande prazer. Observava com um misto de curiosidade e um respeito tangenciando o temor ante aquele líquido lindo, pois na taça poderia estar o equivalente ao gengibre, alho, cebola, pimentão e alho. Argh!
Mas eu tremia e cuspia essa temperada toda. Separava tudo, e ficava apenas com a carne, assim mesmo a contragosto, pois o tempero estava todo lá. Minha vontade era sair correndo. Sair da mesa, porém, era falta grave. Limão, cebola, gengibre, pimentão, alho eram sabores violentos para mim. Meus pais ficavam desorientados, sem graça. Mas insistiam.
Bem menina já distinguia todos esses temperos. Para mim, só faltava conhecer os vinhos. E isso só aconteceu bem mais tarde. Crescemos e nosso paladar cresce junto, mas sua capacidade de discriminar estímulos atinge a maturidade bem antes de nos reconhecermos adultas. Acho que nossa percepção de sabores chega ao máximo já pelos 15 anos.
Hoje, repito a receita de minha mãe (agora usando uma wok) e acho tudo muito sutil. Sim, a verdade é que a partir dos 20 anos, começamos a ir ladeira abaixo, pelo menos em termos de paladar. A turma que degusta vinho profissionalmente e está na quadra dos 50 anos evita esse assunto, insistem em desconhecer essa ladeira natural.
Reconhecer os sabores como o fazia com 15 anos, nunca mais. Contudo, os adultos possuem um trunfo na manga, uma vantagem que a turma mais jovem ainda não maneja devidamente. Podemos estocar em nossa memória praticamente tudo o que percebemos. Já pensou o que está lá registrado quando entramos nos cinquenta? O que não pode é um cinquentão desdenhar do paladar da garotada, capaz de descobrir detalhes surpreendentes.
Meu pai, um aficionado dos vinhos, não parava de falar sobre eles. Alertava para as sutilezas de suas cores. Aquela história dos matizes de brancos e tintos quando são jovens e quando ficam mais maduros. Aquilo me encantava e excitava. Queria experimentar, o que era tão proibido quanto sair da mesa antes da hora. Havia exceções, datas especiais quando beber o vinho era quase que obrigatório. Nesses casos, só um pouquinho, misturado com água e açúcar.
É fácil medir as alterações em nosso paladar à medida que o tempo passa. Já mocinha, conhecia cerveja, nossa levíssima. Mas aí topei com a Guiness, numa das muitas mudanças da família. A secular cerveja preta irlandesa, amarga que só ela, um verdadeiro desafio para novatas. Hoje, desce fácil, prazerosamente.
Naqueles tempos, meu pai apenas comentava sobre os vinhos: as cores, como eram feitos e em particular, suas origens, onde se demorava mais, contando histórias sobre regiões que mal ouvira falar. Por exemplo, foi ele quem me falou do galo preto, símbolo dos Chianti, que ele ainda tomava nos fiaschi, aquelas garrafas barrigudas semicobertas com palha (hoje, só aparecem penduradas nos tetos de pizzarias ou em sets de filmes e novelas).
Ele contava da hostilidade entre Florença e Siena, da guerra dos Guelfos contra os Gibelinos. Contava sobre aquelas duas repúblicas da Toscana na Itália do século XII e mostrava ilustrações com castelos, cidades muradas. Ficava maravilhada. Mas e o galo preto?
Florença queria fixar sua fronteira com Siena, mas seu objetivo era ficar com toda a região de Chianti. Siena não concordou e pediu que o assunto tivesse um árbitro neutro. O que foi feito, mas de modo curioso. Ficou acertado que um cavaleiro de Florença e outro de Siena cavalgassem de suas cidades assim que um galo em cada cidade cantasse. Onde se encontrassem seria fixada fronteira.
O povo de Siena selecionou um galo branco, bem roliço, pra lá de nutrido, um orgulho localmente. Já os florentinos escolherem um galo preto, que deram muito pouco o que comer – tão pouco que no dia da corrida, o galo desesperado de fome cantou muito cedo. Claro que o cavaleiro florentino chegou mais cedo, encontrou o oponente há poucos quilômetros de Siena. Não sei se tudo isso é lenda. Era meu pai quem contava, então era e continua sendo verdade. O fato é que toda a região do Chianti passou à jurisdição de Florença e o Galo Preto transformou-se em símbolo de Chianti.
O tempo foi passando e já madurinha brindava com meu pai os Madiran (terra do Cyrano de Bergerac, aquele narigudo, poeta e espadachim – eis como o velho me apresentava os vinhos), os da Borgonha (que Napoleão adorava), os Riesling, os argentinos antes dos chilenos, muitos vinhos do sul e, particularmente, os portugueses, inclusive os fortificados. Só bebia em casa. Na rua, nadinha.
Quando tive minha loja de vinhos na Serra, foi o velho quem mais me ajudou a formar a adega (e quem mais me levava garrafas “para experimentar”). Agora mesmo, quando o ex sommelier Christian Vanneque comprou uma garrafa do Château d’Yquem por US$ 117.000,00, safra de 1811, meu pai como que apareceu novamente diante de mim. Ah, como ele me falava sobre as safras. Por causa dele, sei que a safra de 1811 é uma das “safras do cometa”, nome aos anos em que ocorreu a passagem de algum cometa. Os produtores costumavam (e acho que ainda costumam) atribuir à passagem de um cometa antes da colheita às ótimas condições do clima e ao sucesso da safra e do vinho dela resultante. E, de fato, algumas das safras mais badaladas nos últimos duzentos anos foram as de 1811, 1826, 1845, 1852. 1861, 1985 e 1989 – em todas elas, apareceu um cometa.
(Vanneque, que foi sommelier chefe do famoso Tour d’Argent, de Paris, declara que pagou 117 mil dólares justamente para beber o reputado vinho doce de Sauternes. Vanneque tem certeza de que vai adorar. Eu, por meu lado, invejo o salário dos sommeliers franceses).
Quando minha aventura na loja de vinhos terminou, o velho não hesitou em elogiar minha coragem em enfrentar as agruras do comércio. E recomendou que não vendesse os vinhos que sobrassem: iríamos bebê-los todos, juntos. O que foi feito. Ele dizia que não podemos descobrir novos oceanos sem perder de vista a praia. E que eu sabia o endereço da praia. Era um cometa, esse meu pai!
Da Adega
A Speranza vive. Pois é, conheci primeiro a famosa pizzaria, a Speranza do Bixiga. E logo pelas mãos de meu pai, que na época fazia de Sampa uma de suas bases de trabalho. E descobri o que era uma pizzaria. Foi no fim dos anos 60, nessa mesma época do ano, um fila de espera danada, um frio mais danado ainda. E não tinha passado cometa algum. Agora, o que comemos foi maravilhoso, inesquecível. Falou em Speranza, meu pai aparece novamente.
Isso tudo para lembrar que nos tempos que correm temos a Cantina e a Pizzaria Speranza de Moema, mantendo a tradição de grandes pratos. Ambas participando mais uma vez do Restaurante Week, de 29 de agosto e 5 de setembro e cheias de novidades.
Experimente o cardápio da Speranza dessa semana especial: a Insalata de legume al forno, a torta napolitana de batata com salada de escarola, o gnocchi verdi com la mozzarella di búfala & provolone, o risoto di calabrese e pomodori secchi.
Isso sem falar da torta di limone e do cornettini di nutella.
Imperdível! Speranza Moema: Av. Sabiá, 786, fones: (11) 5051-1229; www.pizzaria.com.br, e-mail: atendimento@pizzaria.com.br

2.8.11

Taninos elegantes

Logo abaixo, na seção “Da Adega”, publico um release da Vinitude sobre o vinho Doña Paula Los Cardos Cabernet Sauvignon. E lá estão eles: “Um vinho com taninos elegantes e final marcante.” Taninos o quê?
Se existem os elegantes, pode ser que existam também taninos esculachados, ou mesmo grosseiros, malcriados, alguns talvez mais potentes e outros definitivamente débeis, sem contar com os espírito de porco.
A confusão pode aumentar quando nos deparamos com extensões dessa poética da crítica de vinhos e aprendemos que, além de elegantes, os críticos falam de taninos “redondos” (como, existem os quadrados?), suaves, maduros, aveludados, exuberantes, ásperos, “mastigáveis”. Já anotei até “taninos sensuais”, na certa de alguém perto de chamar cachorro de minha loura.
O termo “tanino” é largamente empregado no mundo dos vinhos e tenho certeza que muita gente não sabe exatamente o que seja, muito menos que ele possa ficar entre elegante e áspero. Explicá-lo é dar panos para manga. Tentarei.
São os taninos que causam aquela sensação de secura e até de amargor em sua boca quando bebe um vinho tinto. Formam um grupo de componentes químicos que podem ser achados em frutas, no chá e em cascas de árvores. Chegam aos vinhos via galhos, cascas e sementes de uvas – e, ainda, através da madeira dos barris. Desde o cultivo da vinha e até o processo de produção do vinho são sempre um fator de preocupação: dependendo de como são tratados, afetarão profundamente o estilo do vinho que chegará à sua mesa.
Eles têm a capacidade de ligar-se a vários outros materiais químicos, em particular com as proteínas. Se aplicados a peles de animais, os taninos unem-se às proteínas transformando uma pele macia, mole, num material duro o bastante para fabricar sapatos, solas, cintos e selas.
Os taninos foram também uma classe de compostos químicos existentes no vinho, os fenóis – que, por sua vez, dividem-se em duas categorias: os flavonoides e os não-flavonóides. Os nossos taninos estão no primeiro grupo.
Na vinha, os taninos agem como uma defesa. O seu papel é o de defender as plantas: quando jovens, as uvas ainda verdes, com sabor extremamente ácido e amargo, pois as sementes do fruto são o meio de sua reprodução, mas a planta só permite que o fruto seja consumido quando suas sementes ficam maduras. Quando um pássaro ou inseto tenta mastigar uma uva, taninos são liberados tornando a fruta horrível, amarga, indigesta.
Na medida em que as uvas amadurecem, a cor da casca se altera, tornando-a mais sedutora. Ao mesmo tempo, ficam menos ácidas e mais doces. E os taninos menos amargos. (Na verdade, os taninos não têm sabor: você os percebe pela maior ou menos sensação de secura e adstringência na boca, o que chamo de amargor).
Nessa progressão, os taninos vão de verdes, muito jovens e amargos, quase que “mastigáveis”, a mais macios, sedosos, aveludados. Ou seja: ficam maduros, mais elegantes.
São fundamentais para a qualidade dos vinhos tintos. Além de sua participação nos componentes de cor, aroma e sabor e na preservação, contribuem para a sensação do vinho na boca, sua percepção no palato, sua textura (sedosa, aveludada, redonda, macia, elegante?).
Logo, nossos taninos são fundamentais - como suportes da estrutura de um edifício. Se um vinho tinto tem carradas de fruto e de álcool, mas pouca acidez e taninos, não está bem estruturado.
Quanto aos taninos elegantes, podemos acreditar que já estão bem maduros, bem equilibrados num vinho pronto para ser degustado.
Da Adega
Taninos elegantes II. A Vinitude oferece o Los Cardos Cabernet Sauvignon 2009 por um preço também elegante. Confira. Vinícola Doña Paula é original do Chile e está na Argentina desde 1997. Nunca ganhou menos do que 90 pontos da Wine Spectator.
Para o Papai. Quem sabe o Millésime Cabernet Sauvignon 2008, quinto Millésime da história da Aurora, ou o Pequenas Partilhas Cabernet Sauvignon, ou o Chardonnay Brut, que conquistou para a vinícola gaúcha a sua 12ª medalha internacional esse ano, no concurso Vinagora, na Hungria. Saiba mais sobre as ofertas especiais da vinícola.
Dicas para Fondue. Para fondue de carne, um Pinot Noir Swiss Valley 2007. Para o de queijo, um branco, o Petite Arvine Premium 2007 (medalha de prata no Wine & Spirits Competition 2008, em Shangai). A Petite Arvine é uma uva branca natural do Valais, grande região vinícola da Suíça. Saiba mais. Vamos aproveitar o frio enquanto ele ainda está por aqui.
Wine Weekend 2011 A segunda edição desse evento vai acontecer de 18 a 21 de agosto, no Jockey Club de São Paulo. Um fim de semana prolongado, de degustação, aprendizado, compra de vinhos especiais, vinoterapia e galeria de arte (peças sobre vinho de Antonio Peticov, Zélio Alves Pinto, Guilherme de Faria).
Vinícolas (com a Salton, Vila Francioni e Valduga), importadoras (Expand, D’olivino, Ravin, MS Import, entre outras) vão oferecer rótulos nem sempre encontrados com facilidade.
Esse grande fim de semana vai acontecer de quinta a sábado das 12 às 22h e domingo das 12 às 20h. Os ingressos dão direito a uma taça de degustação (entregue no local). Veja no site.

20.7.11

Uma cesta com dois lances

A amiga tem outras coisas para pensar e talvez não dê muita bola para o fato de ser a Índia o país com a maior produção de uvas por área plantada do mundo: 25 toneladas por hectare. Agora, sabe quem vem em segundo lugar? Sim, no nosso Brasil, com 18 toneladas por hectare. Ficamos na frente dos Estados Unidos (umas 17 toneladas), Rússia (mais ou menos 16 t.), China (15,5 t.), Uruguai (15 t.), Alemanha (14,5 t.), África do Sul (14.5 t.), Argentina (14 t.), Chile (14 t.) e muitos outros. São 32 países analisados por um estudo estatístico chamada Mercados Globais do Vinho – 1961-2009, um amplo trabalho realizado pelo economista Kym Anderson (com seu colega Signe Nelgen), do Centro de Pesquisa sobre a Economia do Vinho, da Universidade de Adelaide, Austrália.
Falar sobre números pode ser chato, mas as surpresas compensam. Quem diria que produzimos mais uvas por área cultivada que nossos vizinhos mais famosos no que diz respeito aos vinhos: Uruguai, Argentina e Chile?
Quem diria que um país como a França dedica apenas 4,3% da sua terra às uvas? Pela fama que o país tem, somos levados a pensar que na Champs-Élysées encontramos uma parreira a cada metro dos seus quase dois quilômetros. A Itália, sim a própria “Oenotria”, a “Terra da Uva”, só tem 7,8% de sua terra dedicada às uvas. Nessa categoria, em honroso primeiro lugar, temos Portugal, com 13,5%, seguido pelo Chile (11%).
Os dados sobre heterogeneidade das variedades nos espantam também. Eu pensava que nesse quesito a Itália seria imbatível. Mas não é bem assim: as cinco maiores variedades italianas (Trebbiano, Sangiovese, Catarrato, Montepulciano e Barbera) correspondem a 38,2% das plantações do país.
Mas é Portugal que, mais uma vez, se destaca. Entre os 12 maiores produtores mundiais, Portugal é o mais diverso. Nenhuma de suas cinco maiores variedades (Periquita, Fernão Pires, Tempranillo, Malvasia e Tinto Amarela) ocupa mais do que 7% da área de vinhedos. Juntas tomam apenas 24,6% das plantações.
Sempre pensei que fosse a Austrália onde a produção de vinho fosse dominada por grandes companhias: as quatro maiores lá têm 62,3% de participação nas vendas nacionais de vinho. Na verdade, é no Chile que esse tipo de dominância mais acontece: lá apenas três empresas detêm 80% das vendas nacionais de vinho, o que faz do país o menos diverso dos mercados, pelo menos comercialmente. Compare com a Itália, onde as quatro maiores empresas têm apenas 9,7% do mercado doméstico.
E a França, amiga, que se presumia ter a maior participação nas exportações mundiais de vinho, naturalmente liderada pelos rótulos de Bordeaux e Champagne. Mas isso só valeu até o início dos anos 90. Atualmente, é a Itália o exportador líder, com 21,3%. A França, é verdade, continua líder em termos de valor (relação de dólar por litro exportado), com US$ 6,22 em 2010. E você acha que para o país esse número é significativo? Que nada: o vinho lá representou apenas 1,62% das exportações. Campeã nesse quesito é a Moldávia: o vinho lá representa 10% das exportações.
Quanto a volume de vinho, o Brasil fica em 15º lugar, com uma participação de 1,3% da produção mundial, à frente da Hungria (1,2%), Áustria (0,90), Ucrânia (0,9), Bulgária (0,9) e Nova Zelândia (0,8). Em termos de consumo, continuamos patinando. Entre 2000 e 2009, o consumo de vinho por capita caiu 1,32%. Em 2009 ficamos com 2,23 litros de vinho por adulto. Perdemos para a Itália, França, Espanha, Rússia, Argentina, Alemanha, Portugal, Chile, entre outros. Mas estamos na frente de Áustria, Ucrânia, Japão, Suécia.
Sim, em 2009, consumimos mais cerveja per capita (60,25 litros) e destilados (7,24 litros) do que vinho (2,23 litros). Mas dá para perceber que o consumo do vinho está aumentando. Não precisa nem de números para comprovar. Basta entrar num supermercado para sentir como a área dedicada a vinhos vem aumentando nos últimos anos. O que assusta é ver a Finlândia, que não produz vinho, com 12 litros per capita.
Quem quiser dar uma olhada nesse estudo é só consultar esse link e baixar vários arquivos em PDF.
O vinho na cesta básica. Não poderia deixar de comentar a isenção fiscal que o governo do Rio de Janeiro concedeu à Enoteca Fasano, uma faustosa importadora de vinhos. A medida foi fundamentada em decreto relativo à venda de alimentos da cesta básica, de 2002, que inclui os suspeitos de sempre: arroz, feijão, farinha, açúcar, café, carnes etc.
O que queria aqui é lembrar que, mais uma vez, o vinho volta a ser considerado como um alimento e não como uma bebida alcoólica – uma antiga pretensão de produtores e comerciantes. Como alimento, a alíquota seria menor e o produto poderia ser vendido mais em conta.
Projeto de um deputado gaúcho já andou por Brasília defendendo justamente esse ponto: o vinho faz parte da dieta de milhões de pessoas há milênios, ajuda a sustentar nosso organismo com vitaminas e minerais. Logo, seria também um alimento. O projeto não passou, ainda.
É bom que se diga que o Grupo Fasano nega ter solicitado benefício fiscal para a sua Enoteca. No site da Enoteca Fasano só encontramos vinhos e algumas massas – essas da própria Fasano, originárias do Uruguai: 500 g por R$ 27,00 (no supermercado, a massa nacional fica por R$ 3,00). E por mais que o vinho alimente, não dá para imaginar uma dieta sem feijão, arroz etc. A garrafa mais barata lá, na minha busca, foi o Rey de Los Andes Reserva Sauvignon Blanc 2008, por R$ 29,00. O consumidor poderia comprar seis garrafas dessas mais uma massa uruguaia e chegaria aos R$ 202,00, preço médio de uma cesta básica com 20 itens. Mas não se aguentaria em pé por muito tempo.
Veja que coluna de hoje virou uma cesta: de números e dúvidas. Já disseram que se usa estatística com um bêbado se socorre num poste, mais para suporte do que para iluminação. O trabalho dos australianos está seguramente no segundo caso. Já o decreto estadual mostra que a cesta bateu no aro e não entrou. Mas a idéia do vinho como alimento e com alíquota reduzida é muito boa.
Da Adega
Vinhos Bacalhôa premiados. Nada menos do que 42 prêmios os vinhos Bacalhôa conseguiram no International Wine Challenge, de Londres (24 medalhas, uma de ouro, seis de prata, dez de bronze e dez recomendações) e no Concours Mondial de Bruxelles, na Bélgica (um ouro e duas medalhas de prata). Mais prêmios ainda foram concedidos na International Wine & Spirits e no Decanter World Wine Awards (só aqui, nove medalhas).
A Importadora Portus Cale, SP, já oferece alguns desses premiados: JP Azeitão Branco 2010 (Concours Mondial de Bruxelles – Prata); JP Azeitão Branco e tinto 2010 (Intern. Wine & Spirits Competition – bronze); Tinto da Ânfora 2007 (International Wine & Spirits Competition - bronze); Quinta da Bacalhôa Tinto 2008 (Concours Mondial de Bruxelles – prata); Quinta da Bacalhôa branco 2009 (no International Wine Challenge - prata); Bacalhôa Moscatel de Setúbal 2004 (Concours Mondial de Bruxelles – Ouro e Troféu no Decanter World Wine Awards); Bacalhôa Moscatel Roxo 2000 (International Wine Challenge – prata).
Saint Germain de roupa nova. Uma das marcas de maior sucesso da Vinícola Aurora, a Saint Germain, substituiu a cortiça por tampa de rosca, passou a utilizar garrafas mais leves (menos vidro, mais vidro reciclado, menos efeito estufa, mais cuidado com o meio ambiente) e rótulos com identificação de cores por tipo de uva.
Gostei do resultado: agora ficou mais fácil identificar os Merlot, o Assemblage tinto, o Rosé de Noirs e o Cabernet Franc. Isso é igual a mais facilidades, segurança e elegância para o consumidor e mais carinho pelo planeta. Confira só no site da Aurora.

2.7.11

A cor do xixi

Lei & Vinho. Matéria recente da revista Wine Spectator informa que os crimes do vinho acabam de entrar da cultura pop, mais precisamente em séries de sucesso da TV americana. Num episódio de Law & Order: Criminal Intent deste mês, temos o assassinato de um importador de vinho, logo após ter vendido falsas garrafas de Bordeaux datadas do século 18 e com iniciais de George Washington gravadas.
Em capítulo também recente de White Collar (Crimes do Colarinho Branco) acontece um assassinato quando dois falsificadores tentam uma garrafa de Bordeaux, também do século 18 – garrafa essa que supostamente teria sido presenteada por Marie Antoinette a Benjamin Franklin. Já em Bones, o corpo de um crítico de vinhos é encontrado num barril de Cabernet Sauvignon.
Os falsos Bordeaux do século 18 são uma clara referência ao escândalo das garrafas de Thomas Jefferson, quando em 1985 a bilionária família Forbes arrematou um Château Lafite 1787 supostamente pertencente a Thomas Jefferson, o terceiro presidente norte-americano. Foi a garrafa mais cara até hoje vendida: US$ 156.000,00, num leilão da Christie’s, em Londres. Mas tudo indica que a garrafa era falsa.
Nas duas primeiras séries, temos dois dos “pais fundadores” dos Estados Unidos: George Washington, o primeiro presidente, e Benjamin Franklin, diplomata, inventor, um dos líderes da Revolução Americana.
Thomas Jefferson, o terceiro dos “pais fundadores” aparece no Lafite 1787. Fazia parte de uma coleção de garrafas de 200 anos de idade, pertencentes a um alemão negociante de vinhos, Hardy Rodenstock. Diz ele que descobriu essas preciosidades escondidas numa adega em Paris, cujo endereço ele se recusa a revelar. As garrafas tinham gravadas as iniciais de Thomas Jefferson, “Th.J.”
Além de Forbes, muitas dessas garrafas de Jefferson foram compradas também em leilão por um bilionário da Florida, William Koch, que começou a suspeitar sobre a autenticidade delas e envolveu a Scotland Yard e até um ex-agente do FBI para investiga-las e tentar alguma luz nessa adega. Por exemplo: as inicias do estadista foram gravadas por algo como uma broca de dentista, inexistente no século 18.
O mistério e as ações legais continuam até hoje. Bill Koch tem tempo e dinheiro e é teimoso. Possui uma adega com 43 mil rótulos e estima que tenha investido entre quatro e cinco milhões em vinhos falsificados. O negociante alemão tem se mostrado uma senhora raposa, difícil de pegar. Essa história já rendeu até um delicioso livro, “The Billionaire’s Vinegar: The Mystery of the World's Most Expensive Bottle of Wine”, de Benjamim Wallace. Não é mistério algum que os bilionários que compraram esse Lafite experimentaram vinagre, mesmo sem beber do vinho.
Nada disso é muito novidade. Por exemplo, a série inglesa Hustle (“O Golpe”, aqui), no ar desde 2005, apresenta um time de vigaristas londrinos cuja característica é só dar golpes em outros vigaristas, um jeito meio Robin Hood de ser. Num dos capítulos (de 2007, se não me engano), descobrem que a gerente de um abrigo para idosos está roubando dos velhinhos. Acontece que ela tem um calcanhar-de-aquiles: adora vinhos, desde que muito caros. E conseguem enganá-la com um Yquem de 1787 avaliado em US$ 8.000,00. Reparem que a safra é o fatídico 1787, ano em que Jefferson servia como embaixador na França. Sabe-se que foi um verdadeiro amante e conhecedor de vinhos – de grandes vinhos.
Diferente de Jefferson, a maioria dos entusiastas do vinho mal sabem distinguir entre uma imitação, mesmo bem feita, e um original. Os crimes de falsificação existem há muitos e muitos séculos. Vão desde forjar rótulos, substituir o conteúdo de garrafas (até comprando garrafas vazias de vinhos cult de sommeliers) e rolhas do que antes foram vinhos caríssimos. Por falar nisso, o eBay vende garrafas vazias de Lafite, Latour e outros vinhos cult bem baratinhas.
A legendária Berry Brothers & Rudd, casa inglesa que negocia vinhos desde 1698 não compra vinhos com safra anterior a de 2000; só oferece os que existem em seus vastos depósitos.
Em dois dos episódios citados, pessoas são assassinadas, o que não é muito comum acontecer no mundo dos vinhos. Mas os crimes atingem trepidantes níveis de filmes de ação e suspense. Recentemente, tentaram extorquir o mais famoso (e caro) vinhedo do mundo: o Domaine de La Romanée-Conti, na Borgonha. Ou pagavam um resgate milionário ou os vinhedos seriam envenenados. Como prova disso, algumas parreiras foram danificadas. A carta pedindo o resgate demonstrava que o chantagista conhecia bem o vinhedo. Mas, como todos os golpistas, esse precisava mais de grana do que tinha talento. E foi pego justamente ao tentar apanhar a mala de dinheiro com o resgate pretendido. A entrega foi num cemitério. Tchan, tchan, tchan!!!
Em tempos de grandes vendas, como agora, com o boom asiático, onde um milionário chinês compra um Latour 1961 por 200 mil dólares (e provavelmente vai bebê-la com Coca-Cola) dá para entender porque os falsificadores estão a todo o vapor.
O encarregado das investigações sobre os vinhos do bilionário da Flórida, Brad Goldstein, revela que os Bordeaux e uns poucos Borgonha estão entre os vinhos mais falsificados do mundo. Os rótulos mais visados seriam:
Château Cheval Blanc 1947 (existem mais garrafas desse vinho no mercado do que a vinícola produziu), Château D’Yquem 1811 (esse lendário Sauternes só chegou ao mercado em 1970; talvez o 1811 tenha sido produzido pela raposa alemã); Mouton Rothschild 1924 (esse foi o ano em que pela primeira vez a vinícola engarrafou seus vinhos; evidente que as centenas de garrafas com safras anteriores a 1924 e constando no rótulo que o vinho foi engarrafado na vinícola são falsas); Pétrus 1924 (é um dos favoritos dos fraudadores, criando cápsulas com a cor errada e rótulos feitos com papel artificialmente envelhecido) e o grande Domaine de la Romanée-Conti La Tache 1952 (é o alvo preferido dos falsários, quando buscam um Borgonha para vender).
Acabaram-se os tempos em que os filmes destacavam mais cerveja e uísque, geralmente envolvendo a Máfia, a Lei Seca etc. O vinho é a bebida da vez, talvez em razão de sua maior presença em todo o mundo e de sua história e imagem um tanto exclusivista. Isso é igual e mais lucros para o crime, morador mais antigo nesse cenário.
E se os vinhos fossem falsificados antes mesmo de fermentarem? E se, nesse caso, não existissem “bandidos” no sentido mais comum do termo?
Um vinho qualquer coisa. Já pensou em tomar um vinho fluorescente? Pegaram um gene de água-viva (a medusa) e o transferiram para a folha de uma parreira, mais precisamente da Vitis vinifera - a mais cultivada para a produção de vinhos finos em todo o mundo.
Pois esse gene fez com que a folha da parreira ficasse brilhando: um verde de letreiro de néon, sob uma luz ultravioleta. Não duvide, amiga, que daqui a pouco, transferem esse gene para uma uva e veremos uma garrafa de vinho brilhando na prateleira.
O autor dessa proeza é o Dr. Dennis Gray, professor de biologia desenvolvimentista da Universidade da Flórida, Estados Unidos. E infelizmente seu interesse principal é a uva. O “pai das parreiras brilhantes” acha que a parte mais difícil de suas pesquisas está mesmo é na indústria e nos consumidores, relutantes em aceitar vinhos geneticamente modificados.
Já existe um fermento geneticamente modificado, o ML01, criado em 2006 por outro biólogo, da Universidade de Colúmbia. O ML01 é o único organismo geneticamente modificado aprovado para uso comercial por vinicultores pelos Estados Unidos, Canadá, Moldávia e África do Sul. Em todo o resto do mundo está proibido. Essa cepa permite que se realize de uma só feita, a fermentação alcoólica e a malolática, encurtando o tempo de processamento do vinho: menos tempo, menos dinheiro.
Falam que com cepas geneticamente modificadas poderão tirar mais aromas e sabores dos vinhos. O que você acha, amiga? Se fermentos geneticamente alterados se espalharem, o vinho vai virar de vez um produto manufaturado, mais um refrigerante no mercado. Todos terão os mesmos sabores. Tudo o que o vinho tem de natural, tudo o que resulta de uma dádiva da natureza, onde o homem sempre teve muito pouco o que fazer; todas as características do lugar de origem, do famoso “terroir”, que dão aos vinhos qualidades exclusivas se perderiam.
Em troca, poderíamos ter vinhos “fashion”, mais amarelos, laranjas e vermelhos para o verão, mais violetas, cinzas e marinhos para o inverno. Talvez, nossas bochechas ficassem também amarelas (ou cinzas etc.) e todos saberiam que vinho bebêramos. Um show.
E toda essa artimanha genética teria a capacidade de transformar o vinho numa bebida qualquer, que deixaria como única lembrança não os seus aromas e sabores, mas a cor e o brilho do nosso xixi.
Da Adega
Aurora leva ouro em Bordeaux. A Vinícola Aurora conquistou três prêmios no 11º concurso Les Citadelles Du Vin, durante a maior feira de vinhos do mundo, a Vinexpo, realizada em Bordeaux, França. No concurso, realizado de 28 a 30 de maio com o apoio da Organização Internacional da Uva e do Vinho (OIV), teve a participação de mais de 300 appellations, 76% delas fora da França, 20 países representados, o que garantia diversidade. O júri foi formado por mais de 70 especialistas internacionais, aprovados pela OIV.
A Aurora recebeu medalha de ouro com o seu Marcus James Brut e medalha de bronze com o Espumante Aurora Chardonnay Brut, além de um prêmio especial, conferido ao produto que obtém maior pontuação entre os inscritos pelo país. Saiba mais.