22.2.11

Um fruff nada aromático

Na sua primeira crítica de vinho, pelo Twitter, classificou de “merda” o Landskroon Shiraz 2007, um tinto sul-africano. Tuitou apenas isso: “Kak. 1/10”. A pontuação, de 1 a 10, estacionou mesmo na menor marca. “Kak” é gíria sul-africana, que poderia ser traduzida como “caca” ou, eufemisticamente, “horrível”, “repugnante”, se quiséssemos abrandar o comentário. Mas a verdade é que é “merda” mesmo e ponto, opção estilística e ideológica do crítico.

Andy Hadfield diz que não suporta esnobes do vinho, não tolera enochatices. E até hoje não consegue engolir a maioria das palavras que formam o chamado jargão do vinho. Bouquet flutuante? Taninos justos? Acabamento de carvalho? Para ele essas palavras ficariam melhores ao lado de esqui, jeans e pintura.

O sul-africano Andy Hadfield é empresário, dirige a One Big Widget, de consultoria de marketing para várias corporações da África do Sul. Não gosta do jargão e de muito palavrório, mas claro que adora vinhos. Há três anos começou a catalogar os vinhos que experimentava utilizando o Wine Notes, um aplicativo do iPhone. Logo, resolveu divulgar seus comentários pelo Twitter. E o retorno parece que foi bom. As pessoas pareciam gostar dessa prática minimalista e mais dinâmica de criticar vinho de modo franco, econômico, ecoando a fala das ruas. “É quando chamo uma garrafa de merda uma garrafa de merda”.

Então, achou que poderia transformar o seu hobby em alguma vantagem financeira e lançou o blog Real Time Wine.

Pode ser divertido, sem dúvidas. O Boschendal Sauvignon Blanc 2009 “cheira a spray de banheiro. Sabor vibrante e frutado. Nota: 5/10.” O Warwick Professor Black Sauvignon Blanc 2010 é “uma salada de frutas tropicais com sorvete de manjericão. Nota: 8/10”. O Savanha Chenin Blanc 2009 é “Azedo. Como laranjas estragadas cheias de álcool. Não é bom. Nota: 4/10”. Já o Uitkyk Sauvignon Blanc 2009 “parece papel perfumado. Ou apenas papel. Mas seu gosto é caramelado. Frutado. E bom. Nota: 7/10”.

No blog, Andy mantém uma seção de “Palavras Proibidas”. Entre elas, Nota (que frequentemente vemos se referindo a aromas: notas disso e daquilo), pois “isso não é música, caso contrários teríamos algum barulho acontecendo”. Harmonia é outra (“a não ser que estejamos falando sobre anjos”). No lugar de Cor acha que “tinto ou branco já serve”.

Essa história de texto curto, cada vez mais curto, antecede a Internet. Dizem que vem da TV, em particular da MTV, com seus videoclipes, cortes frequentes, seu grafismo, além da música, tudo numa linguagem dinâmica e econômica, atraindo os jovens em particular. Essa linguagem foi imitada na imprensa, talvez por motivos econômicos e na esperança de atrair uma nova geração de leitores. Entram em cena fotos a cores. E textos menores.

Chega então a Internet, a banda larga, que absorve tudo isso. Absorve e está substituindo as mídias impressas. O público se encanta com mais informações em tempos cada vez menores. E acontece o sucesso da chamada media social, do Facebook, Twitter, Squidoo etc., mais milhares de blogs e de smart phones e os torpedos das mensagens instantâneas (SMS).

Já li matérias de 10 páginas (mais ou menos cinco mil palavras) sobre fermentação. Se fosse hoje, não daria pé. Não por falta de espaço, mas porque o leitor quer ler menos, perder menos tempo.

Não estou reclamando. Parece que é o que é: temos menos paciência, menos tempo hoje de encararmos artigos longos seja sobre vinho ou qualquer outro assunto. Parece também que ninguém está dando muita bola para os livros. A Internet não é um meio ameno para os formatos longos, a não ser que seja para best-sellers que caibam num Kindle ou iPad. Queimar a mufa, nem pensar. O leitor comum quer mais é entretenimento.

E o que tudo isso pode significar para a compreensão do vinho, em particular para a turma mais nova e para as gerações que estão por acontecer? O crítico Steve Heimof se pergunta se o vinho poderá ser entendido por resumos seguidos de plim plins, como quer o crítico sul-africano.

Os leitores do Andy certamente não vão perder tempo com os vinhos “merda” e seus sinônimos. Vão comprar os vinhos “legais” e seus sinônimos. Notas acima de 7 e tá acabado. Legal. Nada de complicado para as suas cabeças.

Andy diz que o seu formato vai transformar seus leitores em críticos de vinho, também. Pode ser. Nesse formato só um recado, mesmo. Com ele, é difícil explicar até as mais simples trivias: como degustar, como abrir uma garrafa, quais os defeitos mais comuns, como entender um rótulo (rótulo alemão é bom nem tentar). E por aí vai.

Para Andy é mais fácil chamar o diabo de fedepê e estamos conversados. Esquecendo-se de alertar que mesmo essa entidade pode travestir-se como um anjo querubim ou ter chifres e rabos pontiagudos e até vestir Prada. Uma bebida de pelos menos 8 mil anos, produzida e consumida em quase todo o globo, apresentada em estilos os mais diferenciados que facilmente completaria uma Bíblia mais um Alcorão mais um Upanishades. No espaço de 140 dígitos só caberia mesmo um comentário – no caso de Andy, algo de impacto rasteiro: ora o vinho é uma caca, ora é bão.

Fora o óbvio, gostar da bebida em si, o vinho me atrai por ser um assunto praticamente inesgotável, riquíssimo, variadíssimo. Viajo com ele, atravesso séculos e mais séculos de história, topo com culturas as mais diferenciadas. E, no fim, vejo que ainda faltam milhares de horas para esgotar o assunto. E isso me dá prazer, que quero dividir com os leitores.

Andy não é o primeiro a usar o Twitter para comentar sobre vinhos. Um bom número de blogueiros está fazendo isso. Mas note, ele parte do blog para tuitar. O blog, o texto mais longo continua como necessária atração principal.

Andy talvez seja dos primeiros a optar pelo calão, pelo dialeto popular. Mas observe que apenas um sul-africano acostumado ao jargão das ruas de lá saberia o que é kak. Não há como fugir: os surfistas têm o seu jargão, assim como os médicos, os arquitetos. E os enófilos. O sul-africano trocou um jargão por outro, bem mais pobre.

A bola está com os editores e blogueiros: manter um formato de jornalismo que possa passar informação de modo adequada às necessidades dos leitores. Caberá a esses leitores, especialmente os mais jovens, tomar pé da situação que se apresenta: sair do texto mais longo para um mundo reduzido a 140 caracteres e um sinal sonoro pode representar um perigoso passo em direção ao isolamento tribal e à ignorância.

Minha nota, para o formato do Andy: um blog às vezes divertido com um fruff de aroma sulfídrico. 1/10.

Da Adega

Cadê o Châteauneuf. Recebi um e-mail promovendo um Châteauneuf-du-Pape: pela bela foto da mensagem, parecia que era o Xavier, uma garrafa de R$ 210,00 por R$ 185,00. Fui checar no site da promotora, a Tradebanc Wine & Food, loja virtual especializada em vinhos. E o Xavier não estava listado. Pelo menos até segunda, 21, pela manhã, dizia lá que nenhum Châteauneuf foi encontrado. Certamente, a leitora terá mais sorte.

Vinotage. Amiga, dê só uma olhada na linha de produtos Vinotage, feita a partir de uvas e de vinhos: cremes, hidratantes, shampoos, máscaras, óleos, sabonetes, tônicos faciais.

A Vinotage está no coração da maior região produtora de uvas e vinhos do país, a Serra Gaúcha, no RS. Na composição de seus cosméticos estão lá os polifenóis das uvas, as procianidinas mais potentes que a vitamina C e E no combate aos radicais livres.

A Vinitude também é uma loja virtual, indo dos vinhos aos cosméticos.

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