17.8.08

Questões de linguagem

Rua Mata-Cavalos: Machado de Assis não cansa de citar essa rua, onde nasceu e morou por bom tempo Bentinho, o protagonista de Dom Casmurro. Mas por que Mata-Cavalos?
E por que Bordeaux, Chardonnay, Pinot, Merlot, Sauvignon, Petrus etc.? Pois fizemos uma rápida investigação ao redor da etimologia de palavras recorrentes no mundo dos vinhos, sempre com a ajuda do google, de alguns livros e de uma ótima cronista de vinhos, a americana Jennifer Rosen. Eis aí no que deu:
Como todos os diletantes sabem, o jargão do vinho tem matriz na França. E, nesse país, Bordeaux é rico em ofertas lingüísticas. Veja o seu próprio nome: eau é água; bord é beira, margem. Au bord de l’eau significa “ficar à beira d’água”, que no caso, é sentar à beira do estuário do Gironde (que desemboca no Atlântico) e seus tributários, o rios Garonne e o Dordogne, que possibilitaram a Bordeaux tornar-se o sucesso que é hoje, com um importante porto comercial para vinhos e outros produtos.
Entre o Dordogne e o Garonne fica um pedaço de terra chamado, naturalmente, Entre-deux-mers, “Entre dois mares”.
Ao norte, na margem esquerda do Gironde, temos o Médoc, com apelações muito famosas pelos seus vinhos tintos: Margaux, Saint-Julien, Pauillac, Saint-Estèphe, Listrac e Moulis. Pois Médoc deve seu nome ao latim, Medicullicus, ou “terra dos Medulli, antiga tribo celta que ali habitava. O Médoc é terra dos grandes Châteaux. Na apelação de Pauillac temos os Châteaux Lafite-Rothschild, Mouton-Rothschild e Latour, entre outros.
Lafite é o nome da família que foi dona dessa propriedade desde a Idade Média. Só em 1868 é que o Barão James de Rothschild adquiriu o château. Lafite vem do gascão, la hite ou “pequena colina”. Mouton, propriedade de outro braço da família, significa carneiro, sempre presente nos rótulos de seus vinhos. A propriedade pertencia ao Baronato de Mouton. Latour refere-se à torre (tour) existente na entrada da propriedade.
Na apelação de Saint-Julien, ainda no Médoc, o Château Ducru-Beaucaillou é cortado por um belo riacho. E Beaucaillou é uma homenagem a esse riacho, pois beau caillou significa “belos seixos”. Outra propriedade do Médoc, o Château Beychevelle recebeu esse nome em razão dos veleiros navegando pelo Gironde. Todas as vezes que passavam diante da propriedade baixavam suas velas, pois estavam chegando ao porto. O comando “Baixar Velas!” em francês é Basse Voile!, que com o tempo deu nome ao château: Beychevelle.
Um dos vinhos mais caros e mais reverenciados do mundo, o Petrus, na apelação do Pomerol, pegou o seu nome da palavra grega petros, ou pedra. O nome foi transliterado para o latim como Petrus, que deu origem a Pierre, Peter e Pedro.
O nome de duas das principais uvas de Bordeaux, cabernet sauvignon (para os tintos) e sauvignon blanc (brancos) dividem a mesma raiz: sauvignon vem sauvage, selvagem. Merle é o nome dado a uma variedade de tordos e no dialeto de Bordeaux a um melro preto, o Merlot, outra das grandes uvas da região.
Já na Borgonha, só utilizam a Chardonnay (branca) e a Pinot Noir (tinta). Chardonnay vem do latim cardonnacum ou “lugar cheio de cardos“. Cardo (do latim cardu) é aquela planta emblema nacional da Escócia. Já a Pinot Noir, a mais escura das uvas da família Pinot, deve seu nome ao formato de seus cachos: de uma pinha.
Alguns dos famosos vinhedos da Borgonha revelam origens singelas: Chambertin foi cultivado por um camponês chamado Bertin. Aquele era o seu champ, seu campo, espaço de terreno. A região da Campânia, na Itália, tem a mesma raiz, assim como Champagne e a nossa Campanha gaúcha.
Um prestigioso branco da Borgonha, o Chablis Grand Cru Les Grenouilles tem em sua propriedade um grande número de rãs: são as Grenouilles.
Os nomes dos rios Reno (Rhein) na Alemanha, e Ródano (Rhône), na França possuem, ambos, raízes indo-européias. Mas o primeiro vem da raiz reie ou fluir, e o segundo de ret ou rodar, mas também pode ser assar, grelhar, tostar. Lá, a região do Côte Rôtie pode significar literalmente “declive tostado”, pois é uma rocha fortemente banhada pelo sol.
Na segunda metade do século XVI, bem antes dos tempos de Bentinho, quem quisesse tomar a direção de São Cristóvão, tinha que percorrer um caminho que saia dos Arcos (da Lapa), contornava o Morro do Desterro (Santa Teresa) e seguir por uma trilha enfrentando perigosos atoleiros e barrancos, que muitas vezes não só impediam como matavam os animais. Esse era o Caminho (depois Estrada e em seguida Rua) de Mata-Cavalos, hoje Rua do Riachuelo. Se houvesse uma vinícola por lá, por certo teríamos o vinho “Mata-Cavalos”, nome não muito mais estranho do que Château das Rãs, do Baixa a Vela!, ou do que um vinho feito com a uva do melro preto.
Peço desculpas às leitoras que enviaram e-mails nas últimas duas semanas. Um piripaque eletrônico ocorreu no meu PC. Segundo os técnicos, pode ter sido uma entorse lombar, um resfriado, uma crise de fígado, um ataque de gota... Nossa, a lista ficou enorme. Enfim, o meu Outlook voltou a funcionar e agora tento colocar a correspondência. Continuem escrevendo aqui para o Bolsa ou para a Soninha.
Da Adega
Que tipo de vinho você é? Lá da Bahia, a leitora Ludmila Aguiar fez o teste (
veja aqui) sugerido na coluna Um blend de assuntos. E descobriu que é a sofisticadíssima Pinot Noir. “Sofisticada e mundana, provavelmente você conhece mais sobre vinho do que a maioria dos degustadores. Tem excelente gosto e aborda todos os aspectos da vida com atitude de gourmet. Acredita que as pequenas coisas da vida devem ser valorizadas e apreciadas, desde que com a melhor qualidade possível. Demorar mais tempo em fazer uma refeição ou em dar uma volta pela cidade sempre será um tempo bem gasto. No fundo você é uma charmosa sedutora. Seu estilo em reuniões sociais é refinado – nunca “festeiro”. Está melhor em companhia de queijos caros e de aromas intensos”.
Ludmila, que faz parte da Confraria Amigas do Vinho, seção Salvador, implicou corretamente com a última frase do teste. Em inglês é: “Your company is enjoyed best with: Stinky expensive cheese". Stinky pode ser, literalmente, “fedorento”. Mas acho que estavam mesmo é querendo indicar um queijo de aroma intenso, como são normalmente os queijos azuis, os Roquefort, Gorgonzola, Stilton.
Aliás, não concordo com a harmonização sugerida: um vinho com a Pinot Noir, elegante e sutil, seria facilmente sobrepujado por queijos muito intensos e musculosos.
Vinho de James Joyce na praça. Os vinhos suíços estão de volta ao Brasil, agora pelas mãos da importadora e distribuidora Vitis Vinifera, baseada no Rio de Janeiro. Entre eles, a leitora vai encontrar o Fendant du Valais, o branco com uva Chasselas, o preferido de James Joyce, célebre autor de Ulisses, Finnegans Wake (onde o vinho é citado), Retrato de um artista quando jovem, entre outras obras-primas. Compre pelo site da
Vitis Vinifera.
Vertical de Haut Brion. A mesma Vitis Vinifera e a
Escola Mar de Vinho realizarão no próximo dia 25, das 19h30m às 22h30m, uma vertical daqueles que muitos consideram o maior vinho do mundo: o Château Haut-Brion safras de 1988, 1996, 2001 e de 2002. A apresentação será do professor Marcelo Copello. O evento compreende ainda um jantar assinado pela chef Ciça Roxo. Não perca: as vagas são pouquíssimas. Informações e reservas: 21-2235-7670/2235-3968 e vanessa.miranda@vitisvinifera.com.br
O universo do vinho, sob o olhar feminino. Esse é o nome do novo projeto da Confraria Amigas do Vinho. A cada mês, a Confraria apresentará uma vinícola ou uma importadora. E o primeiro encontro acontecerá já no dia 2 de setembro, quando Bianca Bittencourt apresentará a Casa Valduga, sua história e seus vinhos. O encontro, que inclui degustação de vinhos da Valduga e um bufê de pães variados, queijos e pastas, acontecerá às 19h30m no Porto Bay Hotel (Av. Atlântica, 1500, Copacabana, RJ. Para ingressos fale com a Ana Valéria (21-9968-2454 ou imprensa.amigasdovinho@hotmail.com) ou Kátia Regina (21-9983-8318) ou Maria Lúcia, Presidente Nacional da Confraria (21-9797-8277 ou amigasdovinho@uol.com.br )

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