O blogueiro e influente crítico de vinhos Dr. Vino (o PhD Tyler Colman) perguntou aos seus leitores sobre o tipo de tampas de vinhos que mais detestavam. Os leitores tinham cinco opções de voto: a rolha de cortiça tradicional, a chamada “rolha técnica” (grãos de cortiça aglomerados, com discos também de cortiça em cada extremidade), a rosca metálica, a rolha sintética (de plástico) e, por fim, um voto neutro: “não me importo”.
Até ontem, para meu conforto, a pesquisa era liderada pelas rolhas de plástico, detestadas por 72% dos leitores do blog. Em segundo lugar, bem distante, as roscas de metal, com 13%. Os que estão se lixando para o tipo de tampa de seus vinhos somavam 6%. Em quarto lugar, as ditas “técnicas”, com 4%. As rolhas de cortiça ficaram em último, nessa escala invertida de preferência: apenas 5% não as aprovam. Ora, graças!
Em pesquisas mais elaboradas, as de cortiça continuam sendo as preferidas de consumidores e vinicultores em todo o mundo. Aqueles, pela tradição, costume. Estes pela capacidade da cortiça em comprimir-se e expandir-se, de formar um fecho seguro e ao mesmo tempo permitir que o vinho respire por longos períodos (receba micro quantidades de oxigênio ao longo de sua vida). A grande queixa contra elas é a possibilidade de contaminar-se com o fungo da TCA (2,4,6-tricloroanisol), que resulta na “doença da rolha””, no “gosto de rolha”, em sabores e aromas indesejados no vinho, inutilizando-o. Sabe-se que as causas dessa infecção não estão necessariamente nas rolhas, mas também nos barris de carvalho, na madeira existente nas adegas das vinícolas, no transporte utilizado para as rolhas etc. São as rolhas, porém, que pagam o pato: sobre elas recaem a maioria das reclamações. Falam que até 7% das garrafas colocadas no mercado apresentam esse problema. Um senhor prejuízo, para o consumidor e para o produtor, que não sabe que sua garrafa foi infectada. O resultado é que o produtor perde a garrafa, o cliente e seu vinho perde reputação.
Daí que, dos anos 90 para cá, a indústria começou a testar tampas alternativas. Temos as já citadas “técnicas”, eficientes em preservar o dióxido de enxofre (um conservante utilizado há séculos) na garrafa e mais utilizadas em vinhos destinados ao consumo em no máximo dois, três anos.
As rolhas sintéticas imitam as de cortiça quanto à forma e função, mas são de plástico e não apresentam risco de contaminação. São difíceis de remover, bem como de serem recolocadas na garrafa (diria que essa operação é impossível). E, pior: são mais permeáveis ao oxigênio do que as rolhas naturais. Derivadas do petróleo, não são biodegradáveis e, por isso, representam um sério dano para o meio ambiente.
As roscas metálicas, feitas de alumínio com um revestimento interno de plástico, são, sobretudo, práticas, basta uma ligeira torção na tampa para abrir a garrafa. São eficazes quanto à passagem do oxigênio e contra o TCA; Mas a ausência total de oxigênio resulta na supressão de suprimir aromas, resultando em outro e grave problema, o da redução.
A expressão técnica é “redução de sulfito”. As roscas de metal são praticamente anaeróbicas, não permitindo que o vinho respire, podendo deixá-lo com aromas detestáveis (borracha queimada, ovo podre). Para evitar isso, os produtores que adotaram essas roscas, “preparam” o vinho com uma solução de sulfato de cobre. E aí o que deveria permanecer natural, o vinho, cessa de existir. O tratamento com um aditivo potencialmente tóxico vai “reduzir” ou temporariamente eliminar os sulfitos, mas também alterará várias das características do vinho, como seus aromas e sabores. Esse problema está aparentemente sendo solucionado por uma nova geração de tampas de rosca, que permitem alguma passagem de ar.
As tampas de rosca metálica predominam na Nova Zelândia e, em parte, na Austrália. Seu uso está aumentando nos Estados Unidos. O consumidor está aos poucos se acostumando a elas. As roscas Zork derivam delas: seu exterior é de plástico, mas quando retiradas fazem aquele “pop” tradicional nas de cortiça. Algo, para deixar o consumidor mais confortável.
As rolhas de cortiça continuam incomparáveis se examinadas da perspectiva ambiental. Elas são as únicas derivadas de uma fonte renovável e é completamente biodegradável. As fábricas que as produzem são alimentadas pelos seus restos. Assim, tanto a produção como a reciclagem delas exigem pouca energia.
Quanto ao aquecimento global, as florestas de sobreiro (espécie do carvalho, o Quercus suber), fonte da cortiça, são regenerativas. Levam uns dez anos para amadurecer e suas cascas (súber) são colhidas a cada onze anos. Conseguem produzir por bem mais do que um século. E, importante, podem continuar produzindo em habitats secos, desolados, inférteis. Num futuro próximo, as florestas de sobreiro no Norte da África, Espanha e Portugal serão as únicas barreiras naturais a conter o Deserto de Saara.
Nelas vivem os famosos porcos “pata negra”, que se alimentam das sementes dessa espécie de carvalho (“bolotas”), uma dieta que determina o sabor e a textura marcantes do famoso presunto espanhol. Essas florestas dão emprego àqueles que criam os porcos e aos que cuidam dos sobreiros. Fazem isso há séculos. Comunidades inteiras deixariam de existir, fugiriam para as grandes cidades, se de repente, a indústria do vinho optasse em massa por outro tipo de tampa que dispensasse a cortiça.
As alternativas necessitam, para a sua produção, de muita energia, com o uso intensivo de petróleo, da mineração da bauxita para o fabrico do alumínio, com um grande gasto de energia elétrica. No final, vamos ter plástico e metal, um lixo de difícil absorção.
As rolhas de cortiça continuam sendo o modelo de qualidade, pelas quais as tampas alternativas são avaliadas. Nenhuma até agora conseguiu igualar sua capacidade de selar, sua flexibilidade e a propriedade liberar mínimas quantidades de oxigênio, razão pela qual o vinho poderá desenvolver-se e envelhecer graciosamente, sem problemas de oxidação ou de redução. Ou seja, o vinho comprovadamente vai amadurecer graças a essa gradativa admissão de mínimas quantidades de oxigênio. (veja pesquisa realizada pela Universidade de Bordeaux). Sabemos de vinhos selados com rolhas de cortiça podem ser bebidos depois de 20, 30, 50 anos de engarrafados. Não existe ainda uma prova dessas por parte de vinhos com tampas alternativas.
Por seu lado, os produtores de rolhas de cortiça estão tendo sucesso na prevenção do problema do TCA. Leia sobre as estratégias do produtor líder, o Grupo Amorim.
Do ponto de vista ambiental, a nossa escolha ficaria entre a mina de bauxita, o poço de petróleo e a floresta de sobreiro. Bauxita, petróleo ou sobreiro: quem você teria no seu quintal? Quem vai querer beber um vinho “curado” com sulfeto de cobre?
Enfim: o nosso bom e velho saca-rolhas ainda vai levar muito tempo para se aposentar. Felizmente.
Até ontem, para meu conforto, a pesquisa era liderada pelas rolhas de plástico, detestadas por 72% dos leitores do blog. Em segundo lugar, bem distante, as roscas de metal, com 13%. Os que estão se lixando para o tipo de tampa de seus vinhos somavam 6%. Em quarto lugar, as ditas “técnicas”, com 4%. As rolhas de cortiça ficaram em último, nessa escala invertida de preferência: apenas 5% não as aprovam. Ora, graças!
Em pesquisas mais elaboradas, as de cortiça continuam sendo as preferidas de consumidores e vinicultores em todo o mundo. Aqueles, pela tradição, costume. Estes pela capacidade da cortiça em comprimir-se e expandir-se, de formar um fecho seguro e ao mesmo tempo permitir que o vinho respire por longos períodos (receba micro quantidades de oxigênio ao longo de sua vida). A grande queixa contra elas é a possibilidade de contaminar-se com o fungo da TCA (2,4,6-tricloroanisol), que resulta na “doença da rolha””, no “gosto de rolha”, em sabores e aromas indesejados no vinho, inutilizando-o. Sabe-se que as causas dessa infecção não estão necessariamente nas rolhas, mas também nos barris de carvalho, na madeira existente nas adegas das vinícolas, no transporte utilizado para as rolhas etc. São as rolhas, porém, que pagam o pato: sobre elas recaem a maioria das reclamações. Falam que até 7% das garrafas colocadas no mercado apresentam esse problema. Um senhor prejuízo, para o consumidor e para o produtor, que não sabe que sua garrafa foi infectada. O resultado é que o produtor perde a garrafa, o cliente e seu vinho perde reputação.
Daí que, dos anos 90 para cá, a indústria começou a testar tampas alternativas. Temos as já citadas “técnicas”, eficientes em preservar o dióxido de enxofre (um conservante utilizado há séculos) na garrafa e mais utilizadas em vinhos destinados ao consumo em no máximo dois, três anos.
As rolhas sintéticas imitam as de cortiça quanto à forma e função, mas são de plástico e não apresentam risco de contaminação. São difíceis de remover, bem como de serem recolocadas na garrafa (diria que essa operação é impossível). E, pior: são mais permeáveis ao oxigênio do que as rolhas naturais. Derivadas do petróleo, não são biodegradáveis e, por isso, representam um sério dano para o meio ambiente.
As roscas metálicas, feitas de alumínio com um revestimento interno de plástico, são, sobretudo, práticas, basta uma ligeira torção na tampa para abrir a garrafa. São eficazes quanto à passagem do oxigênio e contra o TCA; Mas a ausência total de oxigênio resulta na supressão de suprimir aromas, resultando em outro e grave problema, o da redução.
A expressão técnica é “redução de sulfito”. As roscas de metal são praticamente anaeróbicas, não permitindo que o vinho respire, podendo deixá-lo com aromas detestáveis (borracha queimada, ovo podre). Para evitar isso, os produtores que adotaram essas roscas, “preparam” o vinho com uma solução de sulfato de cobre. E aí o que deveria permanecer natural, o vinho, cessa de existir. O tratamento com um aditivo potencialmente tóxico vai “reduzir” ou temporariamente eliminar os sulfitos, mas também alterará várias das características do vinho, como seus aromas e sabores. Esse problema está aparentemente sendo solucionado por uma nova geração de tampas de rosca, que permitem alguma passagem de ar.
As tampas de rosca metálica predominam na Nova Zelândia e, em parte, na Austrália. Seu uso está aumentando nos Estados Unidos. O consumidor está aos poucos se acostumando a elas. As roscas Zork derivam delas: seu exterior é de plástico, mas quando retiradas fazem aquele “pop” tradicional nas de cortiça. Algo, para deixar o consumidor mais confortável.
As rolhas de cortiça continuam incomparáveis se examinadas da perspectiva ambiental. Elas são as únicas derivadas de uma fonte renovável e é completamente biodegradável. As fábricas que as produzem são alimentadas pelos seus restos. Assim, tanto a produção como a reciclagem delas exigem pouca energia.
Quanto ao aquecimento global, as florestas de sobreiro (espécie do carvalho, o Quercus suber), fonte da cortiça, são regenerativas. Levam uns dez anos para amadurecer e suas cascas (súber) são colhidas a cada onze anos. Conseguem produzir por bem mais do que um século. E, importante, podem continuar produzindo em habitats secos, desolados, inférteis. Num futuro próximo, as florestas de sobreiro no Norte da África, Espanha e Portugal serão as únicas barreiras naturais a conter o Deserto de Saara.
Nelas vivem os famosos porcos “pata negra”, que se alimentam das sementes dessa espécie de carvalho (“bolotas”), uma dieta que determina o sabor e a textura marcantes do famoso presunto espanhol. Essas florestas dão emprego àqueles que criam os porcos e aos que cuidam dos sobreiros. Fazem isso há séculos. Comunidades inteiras deixariam de existir, fugiriam para as grandes cidades, se de repente, a indústria do vinho optasse em massa por outro tipo de tampa que dispensasse a cortiça.
As alternativas necessitam, para a sua produção, de muita energia, com o uso intensivo de petróleo, da mineração da bauxita para o fabrico do alumínio, com um grande gasto de energia elétrica. No final, vamos ter plástico e metal, um lixo de difícil absorção.
As rolhas de cortiça continuam sendo o modelo de qualidade, pelas quais as tampas alternativas são avaliadas. Nenhuma até agora conseguiu igualar sua capacidade de selar, sua flexibilidade e a propriedade liberar mínimas quantidades de oxigênio, razão pela qual o vinho poderá desenvolver-se e envelhecer graciosamente, sem problemas de oxidação ou de redução. Ou seja, o vinho comprovadamente vai amadurecer graças a essa gradativa admissão de mínimas quantidades de oxigênio. (veja pesquisa realizada pela Universidade de Bordeaux). Sabemos de vinhos selados com rolhas de cortiça podem ser bebidos depois de 20, 30, 50 anos de engarrafados. Não existe ainda uma prova dessas por parte de vinhos com tampas alternativas.
Por seu lado, os produtores de rolhas de cortiça estão tendo sucesso na prevenção do problema do TCA. Leia sobre as estratégias do produtor líder, o Grupo Amorim.
Do ponto de vista ambiental, a nossa escolha ficaria entre a mina de bauxita, o poço de petróleo e a floresta de sobreiro. Bauxita, petróleo ou sobreiro: quem você teria no seu quintal? Quem vai querer beber um vinho “curado” com sulfeto de cobre?
Enfim: o nosso bom e velho saca-rolhas ainda vai levar muito tempo para se aposentar. Felizmente.
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