18.9.06

Confrarias - Para a amiga do ABC

A Mariana Maziero estuda jornalismo numa universidade do ABC paulista e com mais dois amigos, está escrevendo matéria sobre vinhos. Um dos tópicos é sobre a mulher nesse pedaço. Mas o que ela quer mesmo saber é sobre as confrarias de vinhos: o que é discutido nesses clubes, como participar, como e quando são realizados os encontros, que cursos são ministrados, que tipo de vinho é mais consumido pelo sexo feminino, ou até mesmo o tipo de vinho indicado ao nosso sexo, como a mulher é vista nesse cenário? Ufa! E as perguntas não acabam aqui. Vamos lá.
Uma confraria pode ser definida como um grupo de pessoas que se reúne periodicamente para provar e debater sobre vinhos, sobre o assunto que mais lhe interessa, motivo desses encontros. Isso acontece desde os tempos de escola, de modo impositivo, quando éramos chamados para “grupos” de estudo, seminários disso e daquilo.
O que é discutido nesse grupo (ou confraria)? Ora, nas palavras de uma das maiores degustadoras e críticas de vinho do mundo, a inglesa Jancis Robinson, “vinho é simplesmente a bebida mais deliciosa, variada e mais complexa do planeta”.
- Para mim é incrível que o suco fermentado de uma única fruta, a uva, pode oferecer tantos e tão diferentes estilos em forma líquida. De cor quase branca, leve ao rico púrpura quase preto, macio e encorpado. Vem parado ou é um espumante, pode ser seco, sequíssimo ou doce, dulcíssimo.
E tudo isso vem do trabalho do vinicultor e da natureza. A uva pode oferecer um vinho de menos de 8% de álcool, passando pela média de 13,5% até mais de 15%. E, mais, os melhores vinhos têm a habilidade de durar por décadas (às vezes, por séculos). E não apenas durar, mas de melhorar com o tempo. Essa é a marca que definitivamente o diferencia de qualquer outra bebida. Além de tudo isso, o vinho carrega com ele muita história, a própria história da humanidade. E geografia para ele é crucial. Ele pode ser produzido por uma grande indústria ou por apenas uma pessoa, artesanalmente.
Poderíamos continuar e continuar. E tudo acima (e muito mais) é debatido, discutido, assim como num grupo de pessoas interessadas por futebol, culinária ou pôquer – as perguntas e o interesse são intermináveis. Como os tintos fermentam? E os brancos? Como conseguem suas cores, seus aromas, sabores? Como prova-los corretamente? Com que comidas eles podem combinar? Quais as temperaturas certas para servir essa bebida? As perguntas nunca acabam.
Qualquer pessoa pode ingressar numa confraria – basta ter o mesmo interesse por vinho, sem que necessite ser especializado ou um sommelier.
Agora, é bom diferenciar uma confraria, tal como a apresentei acima de um clube de vinho – que é uma entidade que cobra uma taxa periódica para que você receba determinados vinhos em casa. Ou para que você participe de reuniões de degustações assistidas por uma pessoa especializada. Ou mesmo para que você participe de cursos sobre vinhos.
No final, uma confraria acaba promovendo essas degustações e cursos, na medida em que o grupo aumenta. Acaba também sugerindo uma taxa para a compra de vinhos e até o aluguel de um espaço onde a turma possa se reunir.
Para que se tenha uma idéia da força que uma confraria ou um clube pode ter: um levantamento feito em 2004 pela vinícolas da Califórnia (o maior estado produtor de vinhos dos EUA) revela que 24% das vendas diretas de vinhos foram feitas para clubes (ou confrarias). É uma senhora fatia de mercado. Acho que nenhuma marca de vinho tem, sozinha, essa participação em vendas, em qualquer parte do mundo.
Criar confrarias e clubes são idéias que vêm sendo utilizadas com sucesso pelas vinícolas e comerciantes de vinho. A Impexo, um importante importador e exportador de vinho, com sede no Rio e filial em São Paulo (Rua Coronel José Eusébio, 95, Travessa Dona Paula), oferece um Clube do Vinho. Veja aqui.
Basta você se cadastrar para receber uma newlettter relacionada ao setor vinícola, com informações sobre degustações e promoções dos vinhos vendidos pela casa.
A poderosa rede Pão de Açúcar tem não as suas “Confrarias Pão de Açúcar”, que se propõem a “desvendar os mistérios da degustação de vinhos”. Você vai a qualquer filial da rede e se informa com o atendente da seção de vinhos como aderir a um desses grupos. O Pão de Açúcar tem uma das maiores e melhores seções de vinhos do país, para esse tipo de loja. O que não é surpresa, pois a direção da casa entregou a parte de vinhos (das compras, à seleção e à promoção e educação) a um dos maiores especialistas em vinhos do Brasil, o crítico e historiador Carlos Cabral. Ele é um renomado especialista e historiador de vinhos (é autor da imperdível “Presença do Vinho no Brasil”) e fundador da mais antiga confraria de vinhos do país, a SBAV – Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho, com sede em São Paulo (e hoje com filiais em vários estados).
Visite o site do Pão de Açúcar e saiba mais como inscrever-se nessas confrarias.
Existem sites na internet que se apresentam como clubes de vinho. É o exemplo do winept.com.
Aí mesmo em SP, temo um clube do vinho do Tatuapé. É o Vinus Club.
E veja também no site da Academia de Vinho uma das mais completas lista de associações, sociedades e confrarias enológicas.
Tenho certeza que cada um dos endereços que estão lá serão ótima referência para o trabalho que você estão fazendo. Vale, porém, prestar atenção nas confrarias que estão sendo criadas por mulheres e para mulheres. É o caso da Confraria Amigas do Vinho, criada no Rio de Janeiro e já com filiais em SP, Paraná, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. As Amigas do Vinho são filiadas à International Associated Women in Wine e à FEBAVE – Federação Brasileira de Confrarias e Associações Femininas do Vinho e do Espumante. Não deixe de visitar as Amigas do Vinho.
Qual o tipo de vinho mais consumido pelo sexo feminino? Não existe isso de “vinho para mulheres” e “vinho para homens”. É uma falácia do sexo masculino tentando mais uma vez submeter-nos. Vocês já devem saber que as mulheres possuem propriedades degustativas mais apuradas do que a dos homens.
Uma das maiores redes de supermercado da Inglaterra, a Tesco, contrata grávidas para testarem seus vinhos - que oferece em grande quantidade, qualidade e a bons preços. A equipe que negocia e compra vinhos para essa rede é composta quase que exclusivamente por mulheres e suas seleções são sempre elogiadas.
Seria a divisão de vinhos da Tesco radicalmente feminista, um clube da Luluzinha, onde homens não entram? Não, o caso não é bem esse. Sob o prisma científico, os homens perdem para as mulheres quando o negócio é identificar e qualificar aromas e sabores em geral e dos vinhos em particular. Segundo estudo do Grupo de Pesquisa Multissensorial da Universidade de Oxford, Inglaterra, as mulheres são melhores na identificação de aromas e sabores.
Através de técnicas, como a da ressonância magnética, cientistas e médicos registram o que acontece no nosso cérebro quanto nos submetemos a ações, como a de cheirar, por exemplo. O fluxo do sangue mostra quais as áreas são acionadas e com qual intensidade.
Não só a Universidade de Oxford chegou a esse resultado. A da Pensilvânia, nos Estados Unidos, também: demonstrou que as mulheres usam o cérebro até oito vezes mais do que os homens quando cheiram alguma coisa. "Sua capacidade olfativa tem amplo limite de detecção e definição mais aguda e certeira".
Numa outra pesquisa, realizada pelo Centro de Sentidos Químicos da Filadélfia, demonstrou-se que as mulheres em idade reprodutiva têm sua sensibilidade olfativa aumentada. Explica o estudo que "a mulher, nessa fase, precisa encontrar o seu par; precisa identificar fontes de alimentos nutritivos e evitar elementos tóxicos". É a velha luta evolucionária pela sobrevivência.
A Dra. Linda Bartshulk, da Universidade de Yale, coloca as mulheres na categoria de superdegustadoras, onde apenas se situam 25% das pessoas para quem as sensações de aroma e sabor são mais intensas. "35% das mulheres são superdegustadoras; apenas 15% dos homens estão nessa categoria".
Um crítico de vinhos inglês, Peter Richards, resolveu fazer conferir ele mesmo essas pesquisas. Foi para uma loja de vinhos e testou 20 clientes ao acaso, entre homens e mulheres. Ofereceu uma série de três taças de vinhos: duas com um branco espanhol e uma com um chileno também branco, todas apresentando apenas sutis diferenças.
Uma em cada duas mulheres identificou os aromas, contra apenas um homem em cada seis. Richard recolheu o seu time. A identificação de aromas e sabores ainda é uma área profissional dominada pelos homens, no mundo dos vinhos. Sua competência vem da prática, do exercício de cheirar e degustar diariamente.
Outro fato: nos Estados Unidos, são as mulheres as maiores compradoras de vinho (compram 60% dos vinhos do mercado) e consomem tanto quanto os homens. Essa história de que vinho branco e rosado é só para mulheres é historia de machista.
O que acontece é que a indústria do vinho vem há séculos sendo um negócio de homens. E só recentemente as mulheres estão podendo colocar um pé nessa porta – seja como enólogas, jornalistas, comerciantes etc. Os preconceitos ainda existem. A nossa citada Jancis Robinson ficou furiosa quando recebeu da revista Decanter (também inglesa e uma das melhores publicações do ramo) o título de “Homem do Ano” (personalidade do ano no setor de vinhos).
O vinho deixou há algum tempo de ser um produto elitista. É hoje um produto de consumo geral. Hoje, os produtores estão abrindo mercados como o da China, aparentemente estranho a essa bebida. Mas que, como “novo rico”, está querendo (e podendo comprar) os gostos ocidentais.
O vinho já é um mercado consolidado no Brasil, apesar de nosso baixo consumo per capita (2% da população). Só que, como em qualquer outro segmento, tem gente que se aventura demais, sem estudar o produto e o mercado. E acontece o que aconteceu com a febre das locadoras há alguns anos.
Temos bons vinhos no sul, onde agora, na Campanha gaúcha, encontraram uma boa área para vinhos, em particular os tintos. Na serra gaúcha, os brancos se dão melhor. Agora, usando técnicas especiais, estão produzindo vinho no Vale do São Francisco, em Pernambuco – vinho esse que já está sendo exportado para a Europa.
O crescimento se deve ao interesse pela bebida – que cresceu muito (aqui e em todo o mundo) a partir dos anos 80, principalmente pelas notícias a respeito dos efeitos positivos do vinho (o tinto em particular) para a saúde.
O interesse vem de muito tempo: quando morava no exterior, trabalhei uma vinícola, como picadora (colheitadora) e no laboratório da vinícola. No Brasil, tive uma loja de vinhos em Itaipava, na serra de Petrópolis e um atacado da bebida na cidade do Rio de Janeiro. Ambos os negócios não deram certo, pois sou péssima comerciante. Mas como jornalista formada não foi difícil aceitar convites para escrever sobre essa bebida maravilhosa.
Sou jornalista especializada em vinhos há oito anos. Se considerar meu tempo engajada com vinho no exterior, mais os tempos de comerciante e de jornalista, tenho uns 16 anos no ramo.
Escrevo de minha casa, em Secretário, um pequeno distrito ao lado de Itaipava. A internet é a minha grande aliada. Sou vizinha de porta de todo o mundo. Escrevo para o segundo caderno da Tribuna da Imprensa, o Tribuna Bis. Minha coluna (Adega & Bar) sai todas as quintas-feiras.
Escrevo também para um portal feminino, o Bolsa de Mulher. A coluna (Sonia Melier) costuma sair a partir das sextas-feiras.
E tenho o meu blog, o Sonia Melier. Não deixe de visitá-lo: http://soniamelier.blogspot.com/
Mulheres que atuam na área: conheço apenas de nome (e de admiração). Temos a Luciana Froes na Veja. A Deise Novakoski, que é sommelier de restaurantes classe A no Rio e escreve na Revista semanal de O Globo. E tem a Alexandra Corvo Alexandra Corvo é formada Sommelière pela Ecole d'ingenieurs Oenologiques de Changins, na Suíça e dirige a empresa Ciclo das Vinhas, especializada em cursos de vinhos para amadores e profissionais. Ela está sempre na Vejinha e no seu próprio site, o Ciclo das Vinhas.
Se ficou faltando alguma coisa é só clicar aqui para a Soninha. Será um prazer atendê-la. E não deixe de visitar o meu blog.

Nenhum comentário: