15.10.10

File com fritas sem o filé

Quando dei uma parada nas bebidas, muita gente ligou perguntando se eu estava doente. Isso, para não indagar se tinha ficado louca. Ou se o consumo constante de álcool não teria me colocado na condição de dependente alcoólica. Expliquei tudo numa coluna em janeiro de 2008 (Pit Stop).
Contudo, reparei que ficara isolada, uma voz única nesse meio de consumidores regulares de bebidas alcoólicas, que tomam vinho por gosto e profissão. Poxa, será que só a Soninha teve o estalo de ir a um médico por verificar que talvez não estivesse bebendo tão moderadamente assim? Sim, porque a maioria acha que sendo profissional, pode beber à vontade.
Dois anos depois, agora em outubro de 2010, Tim Atkin, um respeitado e renomado colunista de vinho, que tem a honra de ser um dos poucos Masters of Wine, o título máximo na carreira de um profissional do vinho, concedido pelo Institue of Masters of Wine, instituição inglesa fundada em 1953 que elimina mais do que aprova luminares do vinho.
Pois Tim percebeu que algo não andava bem com ele. E foi a um médico. Logo, defrontou-se com a amarga pergunta: “Quanta taças de vinho você consome semanalmente?”
É uma pergunta e também um dilema. Comenta Tim: “Você vai mentir, sabendo que a maioria dos médicos multiplica por dois o que os pacientes lhes respondem?” Ou diz a verdade “e recebe como resposta uma verdadeira lição que faz você sentir-se como se já pertencesse à ala dos alcoólatras, com uma garrafa de etanol nas mãos?”
Tim resolveu contar a verdade. “Como provador profissional, degusto uma média de 250 vinhos por semana. “Mesmo que cuspa tudo fora, meu corpo absorve um pouco do álcool que eles contêm”, informa Tim.
E fora Tim (e a Soninha), nunca vi ninguém relatar esse aspecto. A maioria das pessoas compra essa história de que degustar vinho profissionalmente não significa consumir álcool. Nada disso, algum álcool é sempre ingerido. E, não final das contas, acabamos bebendo em demasia.
Pelas contas de Tim, degustar 100 garrafas “é o mesmo que beber uma garrafa de vinho”. Ora, por semana, só nas degustações profissionais, Tim bebia o equivalente a duas garrafas e meia de vinho. Mas ele não ficava nisso, apenas.
Bebia mais. Tinha o vinho que consumia durante o jantar, nunca menos do que duas taças. Calcula que nessas refeições, consumia 50 taças por semana, equivalentes a mais ou menos 7 garrafas de 750 ml. No total, Tim consumia 10 garrafas e meia de vinho a cada sete dias (considerando 7 taças por garrafa).
Claro que seu médico ficou apreensivo. Quem não ficaria? No site de Roberto Parker Jr., o mais respeitado crítico de vinhos do mundo, lemos que em média ele degusta 10 mil vinhos por ano. Mais ou menos o equivalente ao que consome Tim. Parker segurou seu nariz em um milhão de dólares. Acho que ele, Tim e todos os degustadores deveriam mais é fazer um seguro de seus fígados.
Tim lembra que o departamento de saúde do governo inglês considera “seguro” o limite de 21 taças semanais de vinho (para homens), mais ou menos três garrafas. Comenta que não deveria preocupar-se, pois o ator francês Gérard Depardieu (ator e importante vinicultor na França e em Portugal) afirma em alto e bom som que entorna seis garrafas por dia. Depardieu já teve uns dois piripaques, até agora. Não é pra menos. Fora os vinhos, ele ainda come uns dois franguinhos às refeições. Isso, sem contar com aqueles cafés da manhã sevados com os magníficos e gordurosos queijos de sua terrinha.
Perto dele, Tim é um moderado. Conhece vinicultores que bebem 7 garrafas por semana desde meninos. E muitos já estão na casa dos 80 anos. Contudo, estamos falando de exageros, de quantidades absurdas.
E Tim fez exatamente como a Soninha. Decidiu cortar as bebidas, dar um tempo, fazer um pit stop. E começou a dar atenção aos vinhos sem álcool. Na Inglaterra, é um segmento do mercado que vem crescendo. Ele cita os vinhos da “Alcohol-Free Shop”, por exemplo. No site, verificamos que, na verdade, o vinho ainda contém 0,5% de volume alcoólico. Talvez o mais conhecido produtor de vinhos sem álcool do mundo, o alemão Carl Jung, garante que seus vários vinhos possuem apenas 0,2% de álcool. A brasileira “Vinhos La Dormi” anuncia que produz sem álcool, absolutamente sem álcool. “Depois da fermentação, o vinho passa por um processo de desalcoolização em Bandeirantes, no Paraná, onde é engarrafado. Durante esse processo não sofre nenhum processo químico, somente físico. Seus vinhos mantêm todas as características de um vinho normal: paladar, aroma e propriedades medicinais”. Não acredito que não haja resíduos de álcool.
Esses processos físicos são novidades como a “osmose reversa” ou a técnica dos “cones giratórios”. No passado, diluía-se água no vinho, reduzindo seu volume alcoólico. Mas os resultados eram pobres. Já os tais “cones” conseguem remover tanto o álcool quanto as essências de sabor do vinho (ésteres etc.). O álcool é descartado ao máximo e as essências recolocadas no vinho, mas sempre com um tantinho de álcool para conduzir os elementos de sabor e promover algum corpo, alguma estrutura.
Tim e eu concordamos que esses vinhos são artificiais. Vinho de verdade pode variar em seu volume alcoólico – de 5,5% (para um doce Moscato D’Asti) e 20% (para os fortificados Porto, Madeira etc.). Mas existe muita opção de vinho parado na casa dos 11%, como os Riesling, Prosecco, Vinho Verde. Todos brancos. Pois é muito mais difícil acharmos um tinto nesta faixa. Se quisermos mesmo um tinto, a solução é temperarmos com água.
É o que o inglês tem feito: ora um branco bem fraquinho, ora um tinto diluído. Diferente de mim, que dei uma radical parada nas bebidas. Submeti-me a um “descanso’ e passei um tempo a seco: apenas água, sucos, café, chá. E é assim que vinho fazendo. De tempos em tempos, médico, exames, avaliações, descanso. Depois, volto aos meus vinhos, vinhos de verdade.
Vai ser um problemaço para Tim, pois para ele, “vinho sem álcool é como filé com fritas sem o filé’. Punto e basta!
Da Adega
Sanjo vezes três
. No
7o Concurso Nacional de Vinhos Finos e Destilados/Concurso Mundial de Bruxelas - edição Brasil 2010, a vinícola Sanjo conseguiu três premiações: medalha Gran Ouro com seu Núbio Sauvignon Blanc 2009 e mais duas medalhas de ouro com o Maestrale Integrus Chardonnay/Sauvignon Blanc 2008 e com o Núbio Rosé Cabernet Sauvignon 2008. E isso concorrendo com apenas cinco rótulos.
O concurso aconteceu em Bom Jardim da Serra, Santa Catarina, entre 9 1 11 de setembro. Foram avaliados 186 vinhos na Campanha Gaúcha, Vale dos Vinhedos, Flores da Cunha, São Joaquim, Caçador, Cambos Novos e Vale do São Francisco.
A Sanjo (Cooperativa Agrícola de São Joaquim) reúne um grupo fruticultores, a maioria descendente de japoneses. São Joaquim fica na Serra Catarinense. Era até agora conhecida apenas como o lugar mais frio do Brasil. Mas a região ficou quentíssima com os vinhos da
Sanjo.

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