29.10.10

Doce in, Seco out

Você prefere os vinhos doces aos secos? Então já sentiu que a maioria dos bebedores de vinhos te olha atravessada, como se você ainda estivesse no bê-á-bá dos vinhos, uma reles amadora. Mas, prepare-se que agora vão começar a te olhar diferente. Um olha cheio de culpas ou, melhor, um olhar repleto de desculpas.
Assim como a sociedade tem padrões, como os de comportamento (sem eles, a casa pode vir abaixo), com o mundo dos vinhos é a mesma coisa. Ele tem os seus padrões. E um de seus modelos está nos vinhos secos. É por eles que a indústria, o comércio e a crítica de vinhos costumam medir a qualidade dos vinhos. E, na seqüência, os seus consumidores.
Os apreciadores de vinhos doces, por exemplo, costumam ser vistos como bebedores pouco sofisticados, apenas iniciantes que precisam ter seus paladares educados de modo a conformar-se aos padrões e aderir aos vinhos secos.
Agora, esse tipo de sabedoria mostrou-se incorreta. O Master of Wine Tim Hanni e a médica Virginia Utermohlen, professora da Universidade de Cornell, EUA, analisaram as respostas de 1.500 questionários online envolvendo consumidores de vinhos e outras bebidas. E concluíram que a fisiologia desempenha papel importantíssimo quanto a determinação das preferências pelos vinhos.
Fisiologia é uma subcategoria da biologia. É a ciência das funções mecânicas, físicas e bioquímicas nos humanos. A palavra vem do grego physis (natureza, origem) e logia (estudo de). Enquanto a fisiologia estuda a função, a anatomia, sua prima-irmã, estuda a forma.
Os citados questionários continham com perguntas sobre gênero, idade, preferências por vinho (estilo, variedade), atitudes com relação à seleção de vinhos, freqüência de consumo, características que os respondentes mais buscavam nos vinhos (tipo de sabor), preferência de bebidas por ocasião (em casa, em jantares, nos bares), tipos preferidos de cervejas e cafés.
Diante das respostas, os dois pesquisadores distinguiram dois grupos principais de entrevistados: o “Doce” e o “Tolerante”. Os primeiros somaram 324 respondentes e os segundos 341. O grupo “Doce”, como o nome indica, prefere vinhos doces. O “Tolerante” fica com os secos.
Vemos que se trata de um estudo sobre como os consumidores percebem sabores e aromas e como a sensibilidade de cada um determina diferenças marcantes.
Sabor, como sabemos, promove sensações que acontecem em nossas bocas. Os aromas acontecem a partir de nossos narizes. Só que para nossas cacholas ambos ocorrem na boca. A sensibilidade aqui se refere à intensidade de sabores e aromas percebida pelos consumidores (no caso, os respondentes).
E essa pesquisa desnudou fatos espetaculares. O grupo de consumidores categorizados entre os "Doces”, por exemplo, talvez sejam aqueles com o mais alto nível de sensibilidade, tanto que precisa da doçura para abrandar outros sabores. Declara alto e bom som que prefere vinhos doces. Seus vinhos preferidos são o Riesling, o Zinfandel Branco, o Chardonnay, uma Sangria, vinhos bem frutados. Esse grupo refere-se a esse estilo ora como macio, como frutado ou doce mesmo.
Os consumidores do grupo “Tolerante” são menos sensíveis: para eles, o sabor quanto mais potente melhor. Preferem os vinhos tintos encorpados. Optam por designações como um vinho de tantos pontos (apelando para avaliações de terceiros, que mais têm a ver com uma suposta importância do vinho ou do crítico), vinho complexo, intenso. Talvez, mal comparando, seja o tipo de pessoa que vai colocando sal na comida antes de prová-la.
Tim Hanni, um dos pesquisadores, afirma que “a indústria do vinho deve aos amantes de vinhos doces uma ENORME desculpa”. Diz que se a paixão por vinhos doces deve ser incentivada oferecendo-se mais vinhos com esse perfil aos consumidores. Ele tem razão em estar preocupado. Na falta de escolha, esses consumidores se bandeiam para coquetéis ou cervejas. Quem sai perdendo é o mercado de vinhos.
Em razão dos padrões vigentes, os vinhos doces sempre tiveram pouca ou má divulgação nas últimas décadas, tudo porque gostar deles significava até agora uma espécie de mancada social em muitos círculos. Eles ficaram esquecidos ou relegados a apenas acompanhar sobremesas.
É o caso dos vinhos do Porto, dos Jerez, dos vários Moscatos, dos Sauternes, dos Tokaji, dos Rieslings, dos Chenin Blancs do Loire, dos Eisweins alemães, canadenses e, agora, os de Santa Catarina.
Não tem muito tempo, e a nossa cozinha foi sacudida pela volta do jiló. Nesse caso, o padrão era diferente. Como é que alguém poderia gostar de algo tão amargo? Luiz Gonzaga, no Que nem Jiló canta a saudade de seu amor, uma saudade que faz doer, “amarga que nem jiló”. Mas esse fruto (sempre confundido com legume) deu a volta por cima. Foi adotado por chefs famosos e ganhou lugar honroso entre os quitutes de qualquer pé-sujo ou limpo que se preze.
O mesmo deve acontecer com os vinhos doces e seus amantes. No mundo dos vinhos, o padrão mesmo está é na variedade, na fartura de opções, no caleidoscópio de sabores e aromas, qualidade que nenhuma outra bebida é capaz de fornecer. Vamos aos doces, então.
Saiba mais sobre a pesquisa de Tim Hanni e Virginia Utermohlen.
Da Adega
Degustações gratuitas da Ville du Vin.
Maior rede multimarcas do mercado de vinhos, a
Ville du Vin vai promover degustações gratuitas de vinhos selecionados, através de eventos semanais em três de suas unidades: Vila Nova Conceição, Klabin e Shopping Villa Olímpia, todas em São Paulo.
Tais encontros acontecerão sempre a partir das 18 h. Na programação, degustação de rótulos da alemã Gustave Lorentz, dia 3 de novembro na unidade Vila Nova Conceição. Nos dias 4 e 5, o encontro será no Shopping Vila Olímpia. E, no dia 6, no Klabin.
Na segunda semana de novembro, será a vez dos espanhóis da vinícola Castaño, com degustações no dia 10 (Vila Nova Conceição), dias 11 e 12 (Shopping Vila Olímpia) e dia 13 (Klabin).
Os espumantes encerram a seqüência: dia 17, na Vila Nova Conceição; dias 18 e 19 no Shopping Villa Olímpia; e no dia 20, na Chácara Klabin. Saiba mais no
site.

21.10.10

Sabe com quem está falando?

Eu já adivinhava. Quando a Diageo, a maior produtora e comerciante de bebidas do mundo, dona de marcas como a Smirnoff, Johnnie Walker, Baileys, entre outras, revela que 65% dos consumidores de vinho no Brasil são mulheres, não fiquei muito surpresa com a pesquisa da Sophia Mind, empresa especializada em estudar o comportamento do consumo feminino.
O Sophia Mind pertence ao Grupo Bolsa de Mulher e acaba de lançar o seu primeiro livro: “Poderosas Consumidoras: o que quer e pensa a nova mulher brasileira” (Rede de Mulheres Editora, 199 páginas).
“Poderosas Consumidoras”, contudo, traz surpresas muito maiores. É a maior pesquisa realizada sobre a brasileira contemporânea até hoje no país. Mais de 14 mil mulheres usuárias da internet, de todas as regiões do país, foram entrevistadas. Temos aí um retrato do que quer e de como pensa a nova mulher brasileira, seus hábitos, prioridades e comportamentos com relação a consumo, finanças, matrimônio, filhos, carreira etc.
Pelo que li, do marqueteiro Luiz Alberto Marinho (no Blue Bus), o estudo da Sophia Mind revela que as mulheres “são responsáveis pela decisão de compra de 2/3 de tudo o que consomem as famílias brasileiras. Estou falando de um total de R$ 1,3 trilhão, o que faz do Brasil um dos maiores mercados femininos do mundo”.
Bate com a pesquisa da Diageo: as brasileiras aqui lideram o consumo (e as compras de vinho). Já temos aqui 40 grupos (ou confrarias) de vinhos exclusivamente femininos.
Em 2006, a Editora da Universidade da Califórnia, publicou o “Women of Wine: the rise of women in the global wine industry” (“Mulheres do Vinho: a ascensão das mulheres na indústria mundial do vinho”). Lá aprendemos como as mulheres vêm ganhando cada vez mais terreno no segmento do vinho, historicamente dominado pelos homens.
Nos Estados Unidos, as mulheres, desde 2003, lideram as compras de vinhos, principalmente influenciando mais de 80% dos dólares gastos nas garrafas. Isso representava, na época, US$ 3,4 trilhões por ano. Essa influência se estendia também pelos mercados de automóveis, serviços financeiros, computadores pessoais etc.
Pelo Marinho, ficamos sabendo que a pesquisa do Sophia Mind identificou quatro mercados influenciados pelas brasileiras. O primeiro compreende vestuário feminino, produtos de beleza, produtos para a casa e serviços de educação para filhos. Neles, elas concentram 83% das decisões de compra.
O segundo “compreende gastos com entretenimento, saúde, reforma da casa, compra de eletrodomésticos e serviços para a família, como telefonia e internet”. O controle aqui também é majoritário: 67% das decisões.
No terceiro (serviços bancários e eletrônicos), “as decisões são mais equilibradas”. Mesmo assim, interpreta Marinho, “elas determinam 53% desses gastos”.
No quarto grupo, que inclui compra de carros, manutenção de aparelhos domésticos e produtos de cuidados pessoais masculinos, “as mulheres decidem 36% das compras”. Pois é, queridas, não podemos deixar aquele idiota comprar uma loção de barbear com cheiro de bordel, não é?
Apesar de toda essa liderança, a quase totalidade das entrevistadas (89%) “declaram-se insatisfeitas com pelo menos um segmento de produto ou serviço”. Conclui Marinho que “o foco no consumidor não é mesmo o forte das marcas nacionais”.
Nos Estados Unidos, muitas empresas já entenderam que vender vinhos para mulheres não só é importante como não tem nada com criar rótulos cor de rosa, vinhetas rococós, ou que os vinhos devem ser os rosados e baboseiras desse tipo.
Lá nos States, o vinho é hoje a bebida preferida das mulheres de 30 anos para cima. E a maioria prefere os tintos, escolhe seus vinhos pelas cepas e valoriza particularmente a participação deles nas refeições.
Os homens continuam um tanto acuados quanto a ascensão das mulheres num pedaço que tinham como exclusivo deles. É uma saia justa que ficou evidente quando, por pesquisas, revelou-se que as mulheres eram melhores provadoras de vinhos do que os homens. Dizem que a maioria delas são “superprovadoras”, pessoas que possuem 100 vezes mais papilas gustativas por centímetro quadrado do que os meros mortais.
Melhores ou não, estamos ficando cada vez mais evidentes na foto. Esse livro é, desde já, o presente de Natal para seu marido, namorado, amigo, colega etc. Eles precisam saber com quem estão falando.
Poderosas consumidoras”, de Andiara Petterle e Bruno Maletta, já está à venda desde o dia 19, quando foi lançado na Livraria da Travessa, no Shopping Leblon.
Da Adega
O primeiro Icewine brasileiro
. Icewine ou “vinho de gelo” é produzido com uvas congeladas. A água na uva congela e é separada (com sementes e cascas) de um mosto rico em açúcares. Assim, temos um vinho naturalmente doce, resultado de um trabalho árduo, difícil que a Vinícola Pericó acaba de lançar em nosso mercado.
O Pericó Icewine foi cultivado a 1.300 metros, em São Joaquim, Santa Catarina, a região mais fria do Brasil onde a neve é atração turística e o sujeito de um vinho normalmente fantástico. O nosso icewine, ao contrário dos demais pares alemães, canadenses e austríacos, é feito com a tinta Cabernet Sauvignon. A Vinícola Pericó existe desde 2002, quando começou a preparar a terra para plantio de Cabernet, Pinot Noir, Merlot, Chardonnay e Sauvignon Blanc. Em 2007 a vinícola lançou o seu primeiro vinho, o Taipa Rosé. Seguiram-se seus espumantes, em 2008. E agora temos esse pioneiro Icewine.
Saiba mais sobre o nosso “vinho de gelo”.

15.10.10

File com fritas sem o filé

Quando dei uma parada nas bebidas, muita gente ligou perguntando se eu estava doente. Isso, para não indagar se tinha ficado louca. Ou se o consumo constante de álcool não teria me colocado na condição de dependente alcoólica. Expliquei tudo numa coluna em janeiro de 2008 (Pit Stop).
Contudo, reparei que ficara isolada, uma voz única nesse meio de consumidores regulares de bebidas alcoólicas, que tomam vinho por gosto e profissão. Poxa, será que só a Soninha teve o estalo de ir a um médico por verificar que talvez não estivesse bebendo tão moderadamente assim? Sim, porque a maioria acha que sendo profissional, pode beber à vontade.
Dois anos depois, agora em outubro de 2010, Tim Atkin, um respeitado e renomado colunista de vinho, que tem a honra de ser um dos poucos Masters of Wine, o título máximo na carreira de um profissional do vinho, concedido pelo Institue of Masters of Wine, instituição inglesa fundada em 1953 que elimina mais do que aprova luminares do vinho.
Pois Tim percebeu que algo não andava bem com ele. E foi a um médico. Logo, defrontou-se com a amarga pergunta: “Quanta taças de vinho você consome semanalmente?”
É uma pergunta e também um dilema. Comenta Tim: “Você vai mentir, sabendo que a maioria dos médicos multiplica por dois o que os pacientes lhes respondem?” Ou diz a verdade “e recebe como resposta uma verdadeira lição que faz você sentir-se como se já pertencesse à ala dos alcoólatras, com uma garrafa de etanol nas mãos?”
Tim resolveu contar a verdade. “Como provador profissional, degusto uma média de 250 vinhos por semana. “Mesmo que cuspa tudo fora, meu corpo absorve um pouco do álcool que eles contêm”, informa Tim.
E fora Tim (e a Soninha), nunca vi ninguém relatar esse aspecto. A maioria das pessoas compra essa história de que degustar vinho profissionalmente não significa consumir álcool. Nada disso, algum álcool é sempre ingerido. E, não final das contas, acabamos bebendo em demasia.
Pelas contas de Tim, degustar 100 garrafas “é o mesmo que beber uma garrafa de vinho”. Ora, por semana, só nas degustações profissionais, Tim bebia o equivalente a duas garrafas e meia de vinho. Mas ele não ficava nisso, apenas.
Bebia mais. Tinha o vinho que consumia durante o jantar, nunca menos do que duas taças. Calcula que nessas refeições, consumia 50 taças por semana, equivalentes a mais ou menos 7 garrafas de 750 ml. No total, Tim consumia 10 garrafas e meia de vinho a cada sete dias (considerando 7 taças por garrafa).
Claro que seu médico ficou apreensivo. Quem não ficaria? No site de Roberto Parker Jr., o mais respeitado crítico de vinhos do mundo, lemos que em média ele degusta 10 mil vinhos por ano. Mais ou menos o equivalente ao que consome Tim. Parker segurou seu nariz em um milhão de dólares. Acho que ele, Tim e todos os degustadores deveriam mais é fazer um seguro de seus fígados.
Tim lembra que o departamento de saúde do governo inglês considera “seguro” o limite de 21 taças semanais de vinho (para homens), mais ou menos três garrafas. Comenta que não deveria preocupar-se, pois o ator francês Gérard Depardieu (ator e importante vinicultor na França e em Portugal) afirma em alto e bom som que entorna seis garrafas por dia. Depardieu já teve uns dois piripaques, até agora. Não é pra menos. Fora os vinhos, ele ainda come uns dois franguinhos às refeições. Isso, sem contar com aqueles cafés da manhã sevados com os magníficos e gordurosos queijos de sua terrinha.
Perto dele, Tim é um moderado. Conhece vinicultores que bebem 7 garrafas por semana desde meninos. E muitos já estão na casa dos 80 anos. Contudo, estamos falando de exageros, de quantidades absurdas.
E Tim fez exatamente como a Soninha. Decidiu cortar as bebidas, dar um tempo, fazer um pit stop. E começou a dar atenção aos vinhos sem álcool. Na Inglaterra, é um segmento do mercado que vem crescendo. Ele cita os vinhos da “Alcohol-Free Shop”, por exemplo. No site, verificamos que, na verdade, o vinho ainda contém 0,5% de volume alcoólico. Talvez o mais conhecido produtor de vinhos sem álcool do mundo, o alemão Carl Jung, garante que seus vários vinhos possuem apenas 0,2% de álcool. A brasileira “Vinhos La Dormi” anuncia que produz sem álcool, absolutamente sem álcool. “Depois da fermentação, o vinho passa por um processo de desalcoolização em Bandeirantes, no Paraná, onde é engarrafado. Durante esse processo não sofre nenhum processo químico, somente físico. Seus vinhos mantêm todas as características de um vinho normal: paladar, aroma e propriedades medicinais”. Não acredito que não haja resíduos de álcool.
Esses processos físicos são novidades como a “osmose reversa” ou a técnica dos “cones giratórios”. No passado, diluía-se água no vinho, reduzindo seu volume alcoólico. Mas os resultados eram pobres. Já os tais “cones” conseguem remover tanto o álcool quanto as essências de sabor do vinho (ésteres etc.). O álcool é descartado ao máximo e as essências recolocadas no vinho, mas sempre com um tantinho de álcool para conduzir os elementos de sabor e promover algum corpo, alguma estrutura.
Tim e eu concordamos que esses vinhos são artificiais. Vinho de verdade pode variar em seu volume alcoólico – de 5,5% (para um doce Moscato D’Asti) e 20% (para os fortificados Porto, Madeira etc.). Mas existe muita opção de vinho parado na casa dos 11%, como os Riesling, Prosecco, Vinho Verde. Todos brancos. Pois é muito mais difícil acharmos um tinto nesta faixa. Se quisermos mesmo um tinto, a solução é temperarmos com água.
É o que o inglês tem feito: ora um branco bem fraquinho, ora um tinto diluído. Diferente de mim, que dei uma radical parada nas bebidas. Submeti-me a um “descanso’ e passei um tempo a seco: apenas água, sucos, café, chá. E é assim que vinho fazendo. De tempos em tempos, médico, exames, avaliações, descanso. Depois, volto aos meus vinhos, vinhos de verdade.
Vai ser um problemaço para Tim, pois para ele, “vinho sem álcool é como filé com fritas sem o filé’. Punto e basta!
Da Adega
Sanjo vezes três
. No
7o Concurso Nacional de Vinhos Finos e Destilados/Concurso Mundial de Bruxelas - edição Brasil 2010, a vinícola Sanjo conseguiu três premiações: medalha Gran Ouro com seu Núbio Sauvignon Blanc 2009 e mais duas medalhas de ouro com o Maestrale Integrus Chardonnay/Sauvignon Blanc 2008 e com o Núbio Rosé Cabernet Sauvignon 2008. E isso concorrendo com apenas cinco rótulos.
O concurso aconteceu em Bom Jardim da Serra, Santa Catarina, entre 9 1 11 de setembro. Foram avaliados 186 vinhos na Campanha Gaúcha, Vale dos Vinhedos, Flores da Cunha, São Joaquim, Caçador, Cambos Novos e Vale do São Francisco.
A Sanjo (Cooperativa Agrícola de São Joaquim) reúne um grupo fruticultores, a maioria descendente de japoneses. São Joaquim fica na Serra Catarinense. Era até agora conhecida apenas como o lugar mais frio do Brasil. Mas a região ficou quentíssima com os vinhos da
Sanjo.

10.10.10

Pernas Abertas e Bundas de Fora

Nos anos 80, Wolf Blass, um australiano produtor de vinhos criou um espumante tinto e o chamou de René Pogel. Ora, Wolf já era um empresário bem-sucedido, cheio das idéias. E continua assim até hoje: em 2006 lançou vinhos em garrafas de plástico (para reduzir peso, baratear transporte e aquecer menos o globo).
De volta aos 80, todos pensaram que a René era epônimo de alguma francesa, uma homenagem de Wolf a certa figura lendária de Champagne ou a um romance do passado. Esqueceram que Wolf sempre foi brincalhão até que descobriram que René Pogel, de trás para frente virava “Leg opener”, literalmente “abridor de pernas” – o que aparentemente ofendeu a muita gente. Rapidinho Wolf retirou o vinho do mercado. Os espumantes sempre foram associados com as artes da sedução e Wolf certamente não queria confusão com censores de qualquer tipo ou com as verdadeiras Renés.
Os vinhos, em sua maioria, continuam a ser apresentados pomposamente. É Château pra lá, Domaine para cá, Conde disso e Marquês daquilo que não custa nada trazer um pouco de humor para a mesa.
É o que tem acontecido com alguma freqüência, principalmente do Equador pra cima. O tinto sul-africano “Goats do Roam” enfureceu os franceses da Côtes du Rhône, pois foneticamente o nome do vinho sul-africano imitava o da região francesa. O dono do vinho, Charles Back, explicou que na sua vinícola “as cabras (goat) perambulavam (roam) pra valer (do). Hoje esse vinho dá nome a uma segunda vinícola de Charles.
Mas o que fazer com um vinho chamado “Chat-en-Oeuf” (“Gato sobre Ovo”), cuja pronúncia é a mesma de Châteauneuf, lembrando o mais famoso vinho da Côtes du Rhône, o Châteauneuf-du-Pape? O curioso é que se trata de um vinho da mesma região. Enfurecer-se pra quê?
Os trocadilhos funcionam, assim como vinhos que implicam em alguma autocrítica, uma aparente desvalorização, como talvez seja o caso do “Fat Bastard”. Um “Bastardo Gordo”, sendo que no dia-a-dia “bastard” equivale mesmo à babaca, um termo ofensivo.
Além de rótulos com insinuações sexuais, trocadilhos, nomes de celebridades, vinhos com nomes de animais ainda fazem sucesso. Veja o êxito do Yellow Tail, o maior sucesso de vendas dentro e fora da Austrália. Nessa linha, temos o “Cat’s Pee on a Gooseberry Bush” (Xixi de Gato na Moita de Groselha), “Cigare Volant” (“Charuto Voador”, um eufemismo para disco voador, como aparece no rótulo”). Além desses, lembro de “Pinot Evil” (Pinot Malvado), “Vampire Merlot” (Merlot Vampiro), “Bored Doe” (Corça Entendiada).
É claro que vinhos assim se destacam nas prateleiras das lojas. Afinal, entre milhares de vinhos aparentemente iguais, eles precisam fazer algo a mais para chamar a atenção. E o fato de possuírem nomes divertidos não significa que seus criadores não estivessem seriamente empenhados em fazer um excelente vinho.
Aqui no hemisfério sul, o estilo preponderante é o do Novo Mundo: no rótulo, o nome da varietal (ou varietais) e o do produtor. Uma chatice. Não sei por que não se insipiram um pouco nos rótulos das nossas cachaças, que, aliás, tem muitos nomes. Já foi jeribita, birita, piribita, jurubita, marafo, angico, cumbe, geba, maçangana, malungo etc. Hoje, pode ser abrideira, branca, danada, dengosa, teimosa, tira-teima, água de briga, uca, etc.
Quantos as marcas, temos desde Paraty (fabricada desde 1700), que virou sinônimo de cachaça, até “Amansa Corno” e “Assovio de Cobra”. E “Aliada’, para animar nossos pracinhas na II Guerra; a “5X2”, celebrando o placar da vitória brasileira sobre os suecos e que nos deu a Copa de 58. E até uma “Minuto de Silêncio”, do Estado do Rio: os produtores e donos da destilaria eram três irmãos, todos eles surdos e mundos – que, claro, sempre trabalharam em silêncio.
Sabemos que as novidades quase sempre são tão ou mais velhas do que Matusalém. Uma vinícola (e appellation) na Borgonha, situada na Côte d´Or, é chamada de Montre Cul (ou “Mostre o Traseiro”; se quiser pode traduzir como bunda ou cu, seria até mais correto).
Os vinhedos dessa appellation existem desde o ano 92 da nossa era, quando Domiciano era o imperador romano. No rótulo de um de seus tintos, vemos uma colhedora de uvas em plena ação: agachada no seu oficio, só os consumidores reparam que ficou com a bunda de fora.
O rótulo do Château Mouton Rothschild de 1993, como é da tradição, traz uma ilustração de Balthus no rótulo: uma jovem nua. Balthus era um mestre da arte figurativa, um artista renomado, que costumava mostrar ninfetas em poses sensuais. Nos Estados Unidos, o rótulo teve de ser mudado, isto é: retiraram o desenho. Uma atitude hipócrita, pois as duas maiores revistas masculinas do mundo, a Playboy e a Penthouse já estavam mostrando garotas nuas em pelo desde 1973.
Uma moralidade com a bunda de fora. O que se quer mesmo é mais informalidade, mais bom humor em nossas mesas.
Da Adega
Bolhas Italianas no Fim do Ano
. A novidade agora fica por conta dos espumantes italianos Asti Villa Jolanda DOCG e Santero DOCG, de Asti, Piemonte, Itália. São produzidos pela Cantina Santero, com a moscato bianco, colhidas manualmente.
O Asti Villa Jolanda tem cor amarelo palha, perlage fina e persistente. Aromático, destaca notas de frutas em compota. Harmoniza com salada de frutas e tortas doces de frutas.
O Asti Santero, também com aroma delicado, oferece uma pitada de sálvia. É perfeito para doces, como bolos e tortas.
É a Malbec do Brasil que está trazendo esse regalo para o nosso fim de ano. Para maiores informações, ligue para (11) 3274 1360 ou
veja aqui.

5.10.10

Sônia em Leilão

Chamaram-me para avaliar uma centena de vinhos. Um proprietário aqui da Serra faleceu e deixou para um dos seus filhos, entre outras coisas, uma bela coleção de vinhos.
E bateram na minha porta. Não sei se por falta de opção ou por eu morar por perto. Não posso recusar ofertas de trabalho, principalmente um trabalho desses, de dar água na boca e ainda render alguma coisa para a pizza de domingo.
A responsabilidade é grande, pois a partir da minha avaliação o atual proprietário da coleção negociará com leiloeiros de modo a que se estabeleça uma estratégia para a apresentação dos vinhos e seus preços, quer dizer: os preços para os lances iniciais do leilão.
Quando acabei a avaliação (128 vinhos) verifiquei que estava sem tempo para a minha coluna. Que fazer? Que tal mostrar um pouco desse trabalho para minhas queridas leitoras? Um pouco, pois o trabalho acabou somando umas boas 50 laudas.
Nas minhas notas vocês vão verificar que talvez tenha escrito demais. O caso é que eu não sei o perfil do leiloeiro. Se fosse com a Christie’s, casa versada em leilões de vinhos, não seria problema algum. Não seria nem necessário queimar pestanas fuçando preços de vinhos. Eles sabem tudo e muito mais sobre o assunto.
Por aqui não conheço leiloeiro especializado em vinhos. Só em penteadeiras. Daí tentar ajudar o meu temporário patrão a vender o seu peixe e não apenas buscar preços etc.
Na introdução ao trabalho, explico alguns dos programas de busca que utilizei, falo de alguns aspectos da apresentação das garrafas e, por fim, entro nos vinhos. São uns poucos exemplos.
No fim dos anos 90, o neozelandês Martin Brown criou o primeiro programa global de busca de vinhos, o
Wine-searcher.com, Além de ser pioneiro, ele lista hoje mais de 4 milhões de rótulos disponíveis em quase 20 mil lojas em todo o mundo. Pelo programa podemos selecionar a moeda, o país ou continente, se queremos varejistas que entregam o vinho em qualquer parte do globo, se desejamos avaliações para leilões, se queremos garrafas standard (750 ml), meias-garrafas ou magnums.
Existem várias outras ferramentas de busca, como a do programador canadense Eric McGee, a
Globalwinestocks.com, dedicada principalmente aos comerciantes de vinho. A Vinopedia.com, dos holandeses Jeroen Starrenburg e Jasper Hamming, é bem fácil de usar, mas soma apenas 1,600 mil vinhos, até o momento. A Snooth.com apresenta-se como o maior site de vinhos do mundo, com mais de 1 milhão de usuários mensais, mas críticos do quilate de uma Jancis Robinson verificam que os preços registrados nem sempre estão corretos.
Assim, no presente trabalho utilizamos basicamente a ferramenta original (e maior), o
Wine-searcher.com.
Observamos que, com exceção do vinho Madeira 1928, nenhuma das garrafas apresenta problemas de ullage. É um termo derivado do francês que indica o espaço entre a base da rolha e o líquido na garrafa. Quando esse espaço aumenta temos uma indicação de que houve evaporação ou vazamento. Em qualquer dos casos, oxigênio pode ter entrado na garrafa, ameaçando a bebida de oxidação. No Madeira, hoje um senhor de 82 anos, isso seria mais do que o esperado. Trata-se, porém, de um vinho que já foi produzido assim, oxidado. E ele vive muito bem por mais de 100 anos.
As garrafas, desde a sua aquisição, foram guardadas num climatizador Euro-Cave, em temperaturas e umidade apropriadas.
Os vinhos
1. Château Pétrus 1993 – O mais famoso vinho do Pomerol e talvez o mais caro de Bordeaux. É uma propriedade relativamente pequena. Foi comprada por Mme Lacost Loubat em 1925 e consiste em apenas 11,5 ha, plantados com Merlot e Cabernet Franc. O blend atualmente gira em torno de 95% Merlot e 5% Cabernet Franc.
Não há classificação oficial no Pomerol, mas Pétrus é extra-oficialmente reconhecido como um Premier Cru.
A propriedade hoje é dirigida pelo filho do negociante M. Jean Pierre Moueix, Christian, e pela sobrinha de Mme Loubat, Mme Lily Lacoste. O vinho tem distribuição muito restrita. E graças a isso e sua cor, de excepcional concentração, seu bouquet e riqueza de sabores, tende a alcançar preços mais altos do que qualquer outro tinto de Bordeaux.
Na edição de 15 de outubro de 1994, a revista Wine Spectator deu 94 pontos (de 100) para esse vinho e o avaliou em US$ 1.000,00 para início de leilões.
Hoje, em Bordeaux, França, o vinho pode ser encontrado na loja
Comptoir des Vignobles por US$ 1.620,86, a garrafa, fora taxas. Veja em http://www.wine-searcher.com/find/cheateau+p%E9trus/1983/france
A estimativa é que, com taxas e transporte, esse vinho alcançaria aqui pelo menos R$ 3.500,00.
2. Château Cheval Blanc 1974. É um 1er Grand Cru Classé, de Saint-Èmillion, Bordeaux. Segundo a grande crítica Jancis Robinson, esse vinho “é indiscutivelmente o mais charmoso vinho entre os 1er Cru de Bordeaux.
A propriedade existe desde 1832 e logo seus vinhos ganharam fama internacional, com medalhas até hoje em seu rótulo das Feiras Internacionais de Londres e Paris, em 1862 e 1867. O Cheval Blanc é um vinho poderoso, mas não agressivo, sempre elegante, baseado num blend e Cabernet Franc, principalmente, e Merlot. Embora Saint-Émillion, no lado direito do rio Gironde, seja uma região da uva Merlot, Cheval Blanc normalmente contém uma alta percentagem de Cabernet Franc, o que o torna ainda mais característico. Com taninos macios, amadurece esplendidamente, sempre expressando o seu terroir, mais sutil e complexo com o caminhar do tempo. “É simplesmente um vinho fabuloso”, afirma outro crítico, o crítico Chris Kissac (ver:
http://www.thewinedoctor.com/bordeaux/chevalblanc.shtml).
O Cheval Blanc 1947 é provavelmente o mais celebrado vinho do século XX. Esse mesmo vinho é servido ao temido crítico Anton Ego, no Gusteau, o restaurante do filme Ratatouille. É um símbolo.
Na
Millesimes, SA (Provence-Alpes, França), uma garrafa de 750 ml está sendo vendida por US$ 265,00, fora taxas. Com elas, mais transporte, o vinho chegaria aqui em torno dos US$ 550,00. A sugestão para o preço inicial num leilão seria de US$ 1.000,00.
3. Tokaji Aszú 5 Puttonyos Messzeláto Dúlö 1988 – 3 garrafas (de 500 ml, como é o padrão). Tokaji em Húngaro quer dizer “de Tokaj”, pois se trata de um vinho da região de Tokaj-Hegyalja, uma “Designação de Origem Protegida”, área famosa em todo o mundo pelos seus vinhos doces, feitos por uvas afetadas pela chamada “podridão nobre”. Os vinhos de Tokaj são mencionados até no hino nacional húngaro.
Na verdade, Aszú se refere a um estilo de vinho, o mais famoso da Hungria (e o que é citado no hino). Literalmente, significa “seco”, mas o termo acabou associado a vinhos feitos com uvas atacadas pela Botrytis cinerea, um fungo que remove toda a água da uva, deixando apenas açúcar, ácidos e minerais.
Puttonyos são originalmente as cestas utilizadas para colher as uvas. Hoje é número, de 3 a 6, representam a quantidade de açúcar no vinho.
Entre as uvas autorizadas na região (
Furmint, Hárslevelű, Moscatel, Zéta, Kövérszőlő e Kabar), a Furmint é a principal, com pelo menos 60% dos blends.
Os Tokaji começaram a ser feitos 200 anos que seus igualmente célebres rivais doces, os Sauternes.
São vinhos perfeitos para acompanhar sobremesas à base de frutas (principalmente damascos, peras, melões e mangas). Mas também fazem ótima companhia a tortas de nozes, de limão, de laranja caramelizada, estrudel de maçã, pudim de pão e sobremesas à base de café ou de chocolate. Ótimos com queijos duros como o Mimolette holandês ou o Beaufort e ainda queijos azuis (como gorgonzola).
A Wine Spectator avaliou na sua edição de 15 de setembro de 1995 o Tokaji Aszú 5 Puttonyos Messzelátö Dúlö 1988 com 81 pontos e seu preço, nos Estados Unidos, na época, US$ 20,00. Com taxas, transporte e devidas correções, esse vinho estaria por US$ 100,00.
4. La Grand Dame Rosé Brut, 1989, Veuve Clicquot. Não precisamos de muitas palavras para informar sobre essa famosa casa fundada em 1772 por Philippe Clicquot-Muiron. Quando morreu, sua mulher a famosa viúva Clicquot é que consagrou o champanhe como bebida da burguesia e nobreza européias. E não apenas isso: ela fixou as práticas, as técnicas que consagraram o famoso “método tradicional”, a maneira como até hoje os grandes espumantes são produzidos.
La Grande Dame foi criada em 1972 para celebrar o bicentenário da vinícola e também homenagear Madame Clicquot. Por isso, é considerada pelos críticos o melhor champagne do mundo.
O primeiro Rosé da Clicquot foi criado apenas três anos após a fundação da casa, em 1775. È o primeiro rosé da história de Champagne.
Um único fornecedor, nos EUA, fixa o preço de uma garrafa em US$ 249,00. Sugestão para leilão: US$ 300,00.Seu eu fosse a herdeira não venderia coisa alguma. Ficava na minha saboreando os vinhos e bendizendo que os comprou. Só que eu não faturaria nada e olha que estou com algumas contas penduradas.

16.9.10

Pelo Nariz

Às vezes é bom brigar com namorados. Pelo menos, numa dessas ocasiões o lucro foi meu, pois ganhei um presentaço a título de reconciliação. Era o estojo básico do famoso “Le Nez Du Vin” (O Nariz do Vinho), que vem numa caixa coberta por um tecido vermelho que a fazia parecer um dicionário. Dentro dela, duas dúzias de frascos, cada um evocativo de um aroma específico de vinhos, tintos e brancos.
Na época, tinha acabado de me associar a uma loja de vinhos na Serra de Petrópolis. E, evidentemente, aprender sobre mais sobre a bebida era prioritário. Meu readmitido namorado deve ter gasto um bocado, pois esses kits custam um bocado. Ganhei o estojo com 24 aromas que custa hoje, lá fora, em torno dos 230 dólares. Já os vi por aqui, em muito poucos lugares, é verdade, na base dos 400 reais. Na Amazon estão custando hoje entre 400 dólares (o estojo mais completo, com 54 aromas) e 130,00, o mais simples, com 12 fragrâncias. Já pensou seus preços ao chegarem aqui?
Além dos frascos, o estojo contém dois manuais, ambos de autoria de Jean Lenoir, um famoso crítico de vinhos francês que há 30 anos criou O Nariz do Vinho, já com um certificado profissional em degustação de vinhos e com um diploma do Departamento de Ciência da Universidade de Dijon. Com base num dos cursos sobre sabor e aroma que dava na Borgonha (foi professor por 10 anos lá), aprendeu com a reconhecer aromas contidos em pequenos frascos, método utilizado por um de seus professores. E pouco a pouco começou a memorizar os aromas mais típicos em centenas de vidrinhos. E foi assim que chegou ao Le Nez Du Vin.
No primeiro manual, Lenoir introduz sua metodologia, explica sobre os aromas primários, secundários e terciários na bebida. Fala de notas de fruta, como cassis (ou groselha preta) e cereja, de notas florais, como as das rosas e das violetas, de notas vegetais (pimenta verde e trufas), notas de assados, como a dos defumados e notas de animais, como couro e almíscar (cheiro de peixe, de maresia). Ensina também que devemos desenvolver nossa “educação aromática” em ambientes livres de cheiros alheios, como os de cigarro ou mesmo de perfumes.
No segundo manual, Lenoir explica os aromas em cada um dos 24 frascos: limão, toranja (grapefruit), abacaxi, lichia, moscatel, pêra, morango, framboesa, cassis, groselha preta, amora, cereja, espinheiro (Fagara pterota), mel, violeta, pimenta verde, trufa, alcaçuz, broto da groselha, baunilha, pimenta, manteiga, torrada, amêndoa torrada e de defumado.
O autor explica como esses 24 aromas podem ser encontrados em muitas cepas. Um vinho com a italiana Sangiovese terá aromas de morango, framboesa, alcaçuz e algo de defumado. Já a Pinot Noir oferece cereja e violeta, groselha e alcaçuz. Vinhos de Bordeaux e da Borgonha exibirão notas de defumados. O manual sugere o óbvio: se conseguirmos praticar continuadamente com esses vidrinhos acabaremos por memorizar todos os seus aromas e, portanto, levar nossos narizes a identificar uma grande quantidade de vinhos.
Já falei sobre nariz por aqui (veja coluna Ai, o meu nariz). Exercitá-lo é importante, claro. Os perfumistas formados em Grasse, a 15 quilômetros de Cannes, França, conhecida com a capital mundial do perfume, são conhecidos como NEZ (nariz, em francês). São eles que criam, compõem os perfumes, as fragrâncias que tanto evaporam nossas bolsas quanto garantem nosso sucessoa partir de poucas gotas. Acho que Lenoir tirou daí o título dos seus estojos. (Saiba mais sobre o Le Nez Du Vin)
Quando ganhei Le Nez já tinha alguma prática. Comecei a aprender sobre aromas em vinícolas, com profissionais. O plá era ir para a ruas, para os mercados e começar a acostumar meu nasal a tudo que encontrasse: de alface ao limão, de manga às couves, cebolas, batatas. Meu aprendizado foi muito parecido como o da Meg Ryan na comédia romântica O Beijo, quando o seu par romântico, Kevin Kline, larápio e, ao mesmo tempo, vinicultor, lhe ensina a conhecer aromas dos vinhos. Ele tem uma mala velha e nela dezenas de frascos com fragrâncias de vinhos. Dentro da mala, havia folhas, galhos etc., tudo o que o francês conseguiu reunir para o seu próprio aprendizado.
Esses kits ajudam, tenho certeza. Mas é fundamental sair por aí obrigando o nariz a sair da preguiça e a tornar-se mais musculoso. Vamos aprender a diferenciar uma couve mineira de uma nabiça e temos de conhecer os vinhos, de todas as regiões, de todos os hemisférios. É uma missão interminável.
Sim, o nosso senso de olfato precisa ser educado. Ele é, quase sempre, subutilizado. Precisamos gastar um tempo cheirando e fazendo livres associações. Não é muito diferente de aprender letras: saber sobre literatura russa ou sobre os pintores expressionais ou até como ouvir o Rigoletto.
Uma vez, meus sobrinhos começaram a brincar com os frascos. Um deles pegou o de pimenta verde e disse: “Tem cheiro de salada”. Bem, pensei, está no caminho certo. No frasco de framboesa, ditou: “Parece iogurte de morango”. Entendi que ele não tinha a referência direta da fruta, mas o aroma lembrava as sobremesas de iogurte que consumia com freqüência. Nada mal. Seu irmão, mais novo, pegou o de “Defumado” (que para mim cheira como bacon ou carne defumada) e decretou: “Cheira como salame”. Eles estavam se utilizando do banco de dados de sua memória olfativa.
O crítico inglês Jamie Goode, que é PhD em biologia, explica que o vinho tem propriedades físicas que podem ser medidas, são reais. “Se diferentes pesquisadores examinarem um mesmo vinho utilizando ferramentas analíticas, como a da espectrofotometria, devemos esperar deles os mesmos resultados”.
Acontece que o vinho tem um grande número de componentes aromáticos que podem ser detectados pelo nosso sistema olfativo. Possui ainda elementos químicos que induzem a uma resposta do paladar.
Só que a composição química é uma propriedade do vinho, mas o sabor do mesmo não é, pois resulta da interação entre o provador e a bebida. E o provador vai trazer para essa experiência algo dele que alterará significativamente a percepção do vinho. Eu jamais percebi um cheiro de salame naquele frasco. Mas meu sobrinho, sim. E ele não estava errado.
Sim, nós não provamos da mesma maneira que os instrumentos de medição. A informação sensorial que recebemos durante uma degustação é codificada através de sinais elétricos pelos receptores olfativos, papilas gustativas e fotoreceptores visuais. Tudo isso passa por um processamento complicado em nosso cérebro antes de alcançar uma versão devidamente editada da realidade – a percepção consciente do vinho.
Assim, o que nós chamamos sabor do vinho não é propriedade do vinho, mas algo dependente do que processamos em nosso cérebro. E todas nós apresentamos diferenças quanto ao nosso repertório olfativo. “Cada um de nós tem o seu próprio mundo de sabor e aroma”, afirma o crítico inglês.
Daí que exercitar nossos narizes é muito bom, com ou sem Le Nez Du Vin. No meu caso, do jeito da Meg Ryan, ora brigando, ora fazendo as pazes com seu amor de ladrão. Mas sempre metendo o nariz onde nem sempre era chamada.
Por falar nisso, essas fragrâncias têm 10 anos de validade. Nem me lembro do nome completo do namorado gastador, mas as fragrâncias que me deixou ainda funcionam. Vivo birrando com namorados. E eles comigo. Mas presente como Le Nez Du Vin, nunca mais! Estou deixando passar as oportunidades pelo meu nariz.
Da Adega
Deise, Zona Sul e neozelandeses.
Pois o Zona Sul promoveu quinta-feira, dia 16, uma degustação de vinhos da Nova Zelândia, apresentados pela respeitada sommelier, consultora e crítica de vinhos Deise Novakoski e pela proprietária das vinícolas
Te Mara e Auntsfield, Janiene Bayliss. Dos Te Mara, estão Pinot Gris, Riesling, Sauvignon Blanc e Pinot Noir. Da Auntsfield, Chardonnay, Sauvignon Blanc e Pinot Noir. A apresentação aconteceu no Zona Sul da Dias Ferreira, Leblon.
Aurora com novo Millésime. A poderosa Cooperativa Vinícola Aurora está lançando o seu Aurora Millésime 2008, o quinto de sua história. É um tinto 100% Cabernet Sauvignon. Millésime é francês para a data da safra. É normalmente utilizada quando a cepa ou cepas utilizadas no vinho foram todas colhidas no mesmo ano e quando essa particular colheita mostrou-se excepcional. As outras safras da Aurora de igual qualidade (e que tiveram, portanto, o seu Millésime) foram as de 1991, 1999, 2004 e 2005. Esse Cabernet passou por maceração prolongada e descansou em carvalho francês por 10 meses. Antes de sair para o mercado, ficou em garrafa por mais 12 meses. Chegará ao consumidor com 13% de álcool, mas bem equilibrado, potente e em torno dos 50 reais.
Saiba mais.

3.9.10

As taças de Helena e de Clara

Como segurar taças de vinho? Se a Taís Araújo segura as taças que tomou durante a novela pelo bojo, então é assim que devemos fazer, não é? Mas, olha, a Clara (Mariana Ximenes), que diferente da “Helena” de “Viver a Vida” é uma periguete, segura pela haste. A Clara seria mais bem educada, pelo menos enologicamente? Aparentemente, não. Já a Helena, Top Model, vem de uma família bem preparada, sua mãe é dona de uma pousada, sabida nas artes de servir bem. Helena tem vivência internacional, gira em ambientes refinados. Quem estará certa? E quem vai apostar que Helena já não tenha segurado a taça pela haste e Clara pelo bojo?
O caso é que as novelas, ao contrário do que se pensa, acabam sendo escolas eficientes. Há alguns anos, a italiana Eliana La Ferrara, economista de desenvolvimento, baseada na Universidade Bocconi, em Milão, analisando pesquisas antropológicas, reparou que brasileiras pobres começaram a decidir ter famílias menores (portanto, ter menos filhos), a partir do que viam nas nossas novelas.
La Ferrara e mais dois outros economistas, Alberto Chong e Suzanne Duryea, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, partiram então para verificar se as novelas tinham realmente o poder de promover grandes alterações demográficas. E verificaram que, região por região brasileira, a partir da chegada das novelas da Globo, a taxa de nascimento decresceu. E descobriram mais: as crianças começaram a ser batizadas com nomes dos personagens da novela. Os telespectadores se identificavam fortemente com seus personagens, praticamente transformando-os em membros de suas famílias, contagiando-se com seus comportamentos. Daí, talvez, esse excesso de Maicons e Deivids.
Isso não acontece apenas com as novelas da Globo. Dois outros economistas e catedráticos, os americanos Emily Oster e Robert Jensen, verificaram que também na Índia, com o crescimento do acesso à TV a cabo, o índice de fertilidade dos casais também decaiu. E, mais, as indianas começaram a ter mais autonomia, a protestar com veemência contra a violência de seus maridos e a autorizar que suas filhas se matriculassem em escolas.
Na Índia, como no Brasil, as novelas costumam retratar vidas em centros urbanos e entre gente de classe média alta, na qual os personagens femininos trabalham fora e são donas de seus narizes – vidas que lá, como aqui, acabam se tornando aspirações.
Além do menor número de bebês, as novelas seriam a origem de um número maior de divórcios, de uma consciência maior contra abusos, violências. É de se louvar que estejam sendo utilizadas por grupos ativistas como os principais veículos educativos, para tratar de assuntos como preconceitos de várias ordens (racial, religioso e social, entre eles), para educar melhor sobre problemas de saúde e de comportamento (HIV, tetraplegia, síndrome de Down, homossexualismo etc.).
Não importa se as novelas acabem sendo a enésima versão de Romeu e Julieta misturada com Hamlets, Macbeths, Lears, Chapeuzinho Vermelho, Gata Borralheira no liquidificador criativo dos seus autores. São ainda o principal entretenimento do público em geral, com o poder de influenciar o cotidiano das pessoas. Antes, o núcleo dos ricos só bebia uísque e, nas festas, champanhe. Entre os pobres, só cerveja e as branquinhas. A partir dos anos 90, o vinho começou a aparecer e hoje os bens de vida tomam seus vinhos com freqüência e espumantes a toda a hora.
Bem, acho que me alonguei demais. Quem quiser ler mais sobre o poder das novelas procure aqui.
Afinal, quem está certa, Helena ou Clara? Segurar pelo bojo ou pela haste? Se dependermos das novelas, estamos fritas. Já vi novela com um protagonista fazendo um verdadeiro enochato. Ele desprezava “vinhos com a Pinotage”, não deixando de deitar regra ensinando que Pinotage é um cruzamento das francesas Pinot Noir e Cinsaut.
Sei que muito do que os personagens fazem, dependem de marcações da direção, da produção etc. Mas resulta também do trato social ou da base educacional de cada ator.
Tenho várias razões para preferir segurar pela haste. Em primeiro lugar, eu, Helena, Clara e todas nós teríamos dificuldades em apreciar as cores de nossos vinhos segurando a taça pelo bojo. E, fora a beleza dos matizes, a aparência dos vinhos diz um bocado sobre eles.
Por exemplo, se o vinho é de um branco pálido, provavelmente trata-se de um branco jovem e foi maturado em tanques de aço e não em carvalho. Você saberá de cara que a ausência do carvalho será sentida no sabor.
Já se o vinho é de um dourado profundo, quase com certeza será um branco com alguma idade ou oxidado (assim como o marido rico da Helena).
E se Helena continuasse a segurar o vinho pelo bojo, arriscaria dele ficar mais aquecido do que o recomendável. Seria que ela iria querer provar de um branco morno? A haste foi criada exatamente para isso: evitar que nossas mãos aquecessem a parte bojuda da taça, fazendo o mesmo com o vinho.
Fora isso, tenho mais uma razão, essa de matar: segurar pela haste é um bocado mais elegante. Talvez você conclua que as Top Models, na vida real ou nas novelas, têm lá seus tropeços. Ponto para a bandida da Clara: elegância é fundamental. E não se importe muito, amiga, pois no final sabemos que o lobo mau vai morrer e vamos todas brincar novamente na floresta.
Da Adega
Yosef e o Palhete de Ourém
. Um leitor, provavelmente espanhol, Yosef Arad, achou uma coluna publicada, imaginem, em julho de 2006, O que houve com o Clarete? Ele está procurando
"...el divino Clarete como lo conoci por primera vez en Portugal hace mas de 25 anios - Color Rubi, dulzon y suave como el terciopelo, igual a la mujer amada que lo compartio conmigo con queso cremoso portugues, uvas moscatel heladas y caviar rosado, en fin una tarde de amor y clarete...quiero recordarme de ese sabor pero no lo puedo encontrar en ningun mercado, sera que desaparecio como muchas otras cosas del siglo pasado ?"
Como na coluna falo de vários tipos ou de interpretações de Clarete (Claret, Clairet, Clairette, Clarete propriamente), o fato de ter provado desse vinho cor rubi, doce e suave, difícil de achar, acho que ele está se referindo ao Palhete de Ourém, uma especialidade portuguesa cuja produção tem séculos de história. Brancos, tintos e palhetes possuem uma linha cronológica de 800 anos, dos tempos em que D. Afonso Henriques celebrou uma série de acordos com a Ordem dos monges de Cister.
Mas para consegui-lo talvez Yosef precise viajar até Ourém, na sub-região da Alta Estrematura, Portugal. Falar em vinhos de Ourém é falar do “Medieval de Ourém”, é falar no vinho palhete. Um “vinho branco pintado com uvas tintas”, produção tradicional nas regiões dominadas pelos monges da Ordem de Cister e que se tornou, com o tempo, exclusivo da zona de Ourém.
Este vinho, hoje, fez com que se criasse uma DOC, denominação de origem controlada. Os produtores têm que ter as suas vinhas registradas. Para produzir o “Medieval de Ourém” são necessários 80 por cento de uvas brancas Fernão Pires e 20 por cento de uvas tintas da casta Trincadeira. As uvas brancas são colocadas em vasilhas de madeira. As uvas tintas são esmagadas e permanecem entre cinco a oito dias em grandes vasilhas, curtindo, de modo a que o líquido absorva a cor escura da casca. Após este processo, as duas qualidades são misturadas, permanecendo cerca de um mês nas barricas. Depois da fermentação, o vinho é passado a limpo. Existem 12 produtores deste vinho, sendo o maior a “Divinis” com o seu “Medieval”.
Yosef: o melhor é
viajar até a Estremadura. Tenho certeza que, lá, você encontrará o doce Palhete cor de rubi e terá mais uma tarde de amor.

28.8.10

Conversa de Botequim

Você está num bar sendo entrevistado pelo diretor de uma empresa. Em jogo o precioso cargo de gerente de uma divisão. Foi o diretor que o convidou e escolheu o local. No meio do papo, ele lhe oferece uma bebida. “Quer um refresco, uma cerveja, um vinho?” Então, você olha o cardápio e escolhe um simples “Merlot da casa”. Pensou que bebericar um vinho fizesse você parecer mais agradável, mais sofisticado do que se pedisse o cotidiano cafezinho?
Enganou-se, pois pelo vinho você foi avaliado como uma pessoa pouco inteligente, literalmente como um idiota. Foi reprovado, perdeu o lugar. Apenas por ter escolhido a bebida alcoólica.
Estamos comentando mais uma pesquisa sobre vinhos, realizada e apresentada recentemente. “Idiota” foi a expressão utilizada pelos pesquisadores norte-americanos que idealizaram a pesquisa: um da Universidade de Michigan (Scott Rick) e outro da Universidade da Pensilvânia (Maurice Schweitzer), ambos graduados em administração de empresas, professores e pesquisadores nas duas escolas.
Ambos acabam de apresentar e publicar os resultados de uma série de seis entrevistas que buscou associações causadas por bebidas alcoólicas em candidatos a empregos. Todos os pesquisados tinham nível de gerente de departamento.
Cada série reuniu cerca de 600 candidatos, foram feitas em sua maior parte em restaurantes e bares e filmadas (às escondidas). Esses vídeos, em seguidas, eram mostrados para grupos de gerentes e avaliados.
“Quando esses candidatos eram observados consumindo ou apenas segurando uma bebida eram avaliados como menos inteligentes (quando a bebida era alcoólica) do que se estivessem com uma água ou refresco”, comentam os pesquisadores. “Na verdade, a mera menção a bebida alcoólica pelos candidatos levava os avaliadores a considerá-los menos inteligentes, mesmo que não tivessem bebendo”.
Os pesquisadores deram o nome de “viés do idiota bebedor”, que valia para quem aceitasse cerveja ou vinho, fosse homem ou mulher. E o curioso é que essa noção persistia mesmo quando o avaliador também estava consumindo álcool e quando o entrevistado não escolheu beber, mas a ele foi oferecido um drinque. Viés ou distorção, talvez, dos gerentes que assistiram e deram notas aos vídeos.
Distorção, pois demonstra preconceito. Os candidatos claramente foram induzidos a beber qualquer coisa, estavam ora num bar, ora num restaurante, lugares próprios para esse tipo de consumo. Foram considerados inaptos, mesmo quando o entrevistador bebeu vinho em primeiro lugar.
É claro que ninguém estava ali para encher a cara. Acredito que a maioria bebia por cortesia. Se nos Estados Unidos acham que isso deixa as pessoas menos inteligentes ou “idiotas”, esse é mais um problema lá de cima.
Para mim, existem três tipos de bebedores de vinho. O bebedor como eu e você, leitora, que formamos o maior desses três grupos, que na maioria das vezes quer experimentar o Dal Pizzol Ancellota, uma Chenin Blanc da África do Sul, tentar um Pinot Noir da Nova Zelândia, um Casa Valduga Brut Premium, não ter problemas em pedir dicas ao dono da loja de vinhos. Ou seja, estamos aí para dar uma volta no mundo dos vinhos e aproveitar o que pudermos.
O esnobe do vinho (também chamado de enochato) forma o segundo grupo, aquele com ar de superioridade sobre qualquer matéria relativa aos vinhos; dono da verdade, ignora qualquer vinho que não esteja consagrado pelas revistas ou colunistas famosos; só bebe rótulos caros ou famosos (o que dá no mesmo), e acumula mais preconceitos do que conhecimento sobre quase tudo no mundo dos vinhos.
O terceiro grupo é o dos “aficionados do vinho”, aquelas pessoas entusiasmadas, boladas pela bebida. Elas naturalmente carregam um pouco de esnobismo, mas o negócio delas é estudar a matéria a fundo, saber sobre elas. Mas são mentes abertas, dividem seus conhecimentos. Lêem livros, fuxicam a internet, pertencem a confrarias, não se importam por rótulos, mas por qualidade, por bons preços e principalmente por variedade, pela chance de saber mais. Sabem que existe muito mais do que Bordeaux e Borgonha.
Agora, essa história de que um mero bebedor de vinho possa ser menos inteligente – ou mesmo idiota – só me faz rir. Um quarto grupo?
Tudo isso me lembra o centenário de Noel Rosa, que comemoramos esse ano. Noel também faz do bar, no caso o nosso querido e importante botequim, um lugar para conversas. O seu Conversa de Botequim, ao contrário dos bares e restaurantes da pesquisa americana, retrata um espaço democrático, um centro de integração social, um lugar sem diferenças sociais e preconceitos de qualquer ordem. É nele que todos se encontram, homens, mulheres, jovens e maduros. Novas amizades são feitas, velhas amizades se sedimentam. Está tudo lá no samba de Noel: aquele “dedo de prosa”, a cumplicidade do garçom, a quem pede dinheiro emprestado, pois o dele ficou com bicheiro, a despesa pendurada. O bar, o botequim, o lugar certo para beber e conversar.
Os dois catedráticos americanos também sabem que o consumo de álcool tem papel importante em muitas das relações profissionais, incluindo-se as entrevistas de trabalho, negociações e encontros informais. A presença do álcool nesses encontros pode criar uma atmosfera relaxante, facilitando a relação. Ao mesmo tempo, contudo, pode influenciar o comportamento de modo indesejável.
Os dois pesquisadores partiram da hipótese de que ver uma pessoa com álcool pode ser percebida como um problema. Essa percepção age como uma lente que leva a resultados ambíguos – tal como esse que classifica os entrevistados de idiotas ou menos inteligentes.
Será que os gerentes que analisaram os vídeos não sabem que conversar e também beber faz parte da história do mundo? Até Cristo, na Santa Ceia, sentou-se com seus amigos e todos se serviram de vinho. Judas foi o único que não bebeu; saiu mais cedo, com aquelas 30 moedas.
Por que tanto preconceito? Noel combateu intolerâncias de toda a ordem: contra mulheres, contra artistas, contra negros e até os sexuais (dedicou um samba a Madame Satã, Mulato Bamba). Uma senhora ousadia para a época.
O resultado da pesquisa é, lembrando Noel, uma média requentada... por preconceitos. Os idiotas são os outros.
Da Adega
O primeiro vinho fino em Tetra Pak
. No lugar do leite e do suco, põe vinho. Não qualquer um, mas o Onorabile, o novo vinho fino da Vinícola Wine Park, o primeiro em embalagem cartonada, asséptica, a nossa conhecida e prática Tetra Pak (nada de vidro, de rolha ou de cápsula). Nessa embalagem, o Onorabile virá com duas opções: o tinto (um Cabernet Sauvignon e Merlot) e o branco (Chardonnay e Riesling).
O Onorabile tem 33% a mais de vinho do que as garrafas tradicionais, de 750 ml. E a embalagem representa apenas 3% do peso do vinho, além de trazer um selo certificando que é confeccionada com papel cartão autenticado pelo Conselho de Manejo Florestal, organização que fixa os padrões para o gerenciamento responsável das florestas. No final, o meio ambiente é respeitado. O vinho fica protegido dos raios UV, não necessita de cuidados para armazenamento. Vinho fino, de qualidade, bem protegido, fácil de guardar – e mais barato. Na Argentina, esse tipo de produto representa 45% do total da produção. No Chile, é ainda maior: 52%. A novidade chega mês que vem às lojas. A Vinícola Wine Park fica em Garibaldi, na Serra Gaúcha, na antiga Maison Forestier. Seu espumante Gran Legado Brut Champenoise foi eleito o melhor nacional na Expovinis Brasil 2010.

22.8.10

Tiro no pé e outras

Servir champanhe como cerveja. Cientistas da Universidade de Reims, a maior e principal cidade da terra do espumante, Champagne, descobriram que devemos servir a preciosa bebida como cerveja. Ou seja, sem aquele cuidado, vagar, meticulosidade dos sommeliers, que resultam numa perda maior de dióxido de carbono (CO2), as imprescindíveis bolinhas. Servindo como uma cerveja – e assim produzindo mais bolhas na taça – a concentração de CO2 dissolvido será bem menor. No fim, fazendo como os cervejeiros, você terá mais bolhas na taça.
Os cientistas de Reims confirmaram também que quanto mais alta a temperatura da bebida, maior será a perda de CO2 dissolvido durante o serviço, provando que baixas temperaturas prolongam a difusão das bolhas e a viscosidade da bebida. A bebida ficará mais tempo gelada, retendo mais bolhas. Leia um resumo da pesquisa aqui.
Quer um drinque, beba vinho. A autora, jornalista e blogueira Kara Newman oferece dicas curiosas, caso você queira substituir coquetéis por vinhos.
Se a leitora gosta de coquetéis à base de gim, beba Sauvignon Blanc, a cepa branca original de Bordeaux (mas que vinga em quase todas as regiões vinícolas). Ela também é límpida ácida, refrescante, com notas que lembram limão e ervas, tal como o gim.
Chá gelado? Substitua por um vinho com a Pinot Noir: não é muito encorpado e contém taninos, tal como o chá.
Gosta de um café expresso? Em seu lugar, tente vinhos com a Shiraz/Syrah ou com a Malbec. São igualmente escuros, robustos e fortes, tal como o expresso.
Seu drinque preferido é a Piña Colada? Troque-o por um vinho com a Viognier, uma cepa branca originária também da França, perfumada e suculenta, que virou moda a partir dos 90 e faz o vinho mais famoso da região de Condrieu, no Vale do Ródano (é a única branca permitida lá). Mas, por favor, não use aquelas sombrinhas decorativas do drinque cubano, o delicioso “abacaxi amassado”, numa tradução literal.
É caída por uma cervejinha leve? Procure por um vinho argentino com a Torrontés, a grande cepa branca do país. É leve, saboroso e não muito doce.
Troque o uísque do fim de tarde por vinhos com a Nebbiolo, Barolo ou por um Barbaresco: uma grande variedade de aromas e sabores nesses tintos italianos sempre bem encorpados.
O seu drinque preferido é mesmo uma água mineral gasosa (de preferência a Pellegrino)? A solução está na Cava, o famoso, seco, ácido e refrescante espumante espanhol.
Estou doida para testar essas dicas para voltar ao assunto.
Garrafa com dois gargalos. Sempre tive certeza de que não visitei ainda todos os corredores desse hospício que é o mundo das bebidas (e em particular o dos vinhos). Não é que criaram agora uma garrafa de vinho com dois gargalos? Quem ocupa essa enfermaria são aos criativos da Ampro. Deram até um nome a ela: “Design Business Bottle”, uma “garrafa de negócios com design”, projetada, especial para uma reunião de negócios.
Foi feita, segundo seus criadores, para “capturar a essência do seu negócio em conexão com o negócio do cliente”. Daí os dois gargalos: um para uma parte e outro para o cliente. Funciona como uma lembrança para cada contrato que assinarmos. A garrafa tem dois gargalos, cada um coberto por dois copos: um vem com a inscrição “Nosso Negócio” e o outro com “Seu Negócio”. O vinho é doce, como o pessoal da Ampro espera que corram os negócios de ambos os lados. Veja a garrafa aqui. O bom é que esse hospício fica bem longe: a Ampro, empresa de design, premiadíssima em todo o mundo, é baseada em Bucareste, Romênia.
Um escocês no seu tanque. Pois é, já está criado um novo combustível, derivado de uísque escocês dos legítimos. O biodiesel nasceu das bolações da turma da Universidade Napier, em Edimburgo e pode ser usado em qualquer carro, não precisando de adaptações. Emprega os dois principais subprodutos do processo de produção da bebida: o “pot ale” (também chamado de ”burnt”, que são resíduos ricos em proteína deixados no alambique) e o “draff”, os grãos deixados após a fermentação. Essas substâncias eram utilizadas até agora como ração animal. Mas podem ser transformados em butanol, transformando-se em ração para seu carro.
Por ano, na Escócia, são produzidos 1.600 milhões de litros de “pot ale” e 187 mil toneladas de “draff”, quantidades que animam os cientistas a levarem essa novidade para os postos de gasolina – pelo menos na Escócia. Será que o bafômetro vai confundir-se? O bafo do carro vai misturar-se ao do motorista? Queria ver aqui.
Um tiro no pé. Ano que vem teremos garrafas de vinho com um novo selo de controle, igual ao das garrafas de uísque. Ele valerá para os nossos e os vinhos importados. A Receita Federal alega que com isso inibirá a fraude, em particular na importação. O Instituto Brasileiro do Vinho, que reúne todos os produtores nacionais, diz que pelo menos 25% dos 60 milhões de litros de vinhos importados (dados de 2007) entraram no país ilegalmente.
O grande crítico e autor Carlos Cabral diz que esse é mais um entulho arbitrário. “Como se já não bastasse a gangorra do câmbio, e os inúmeros impostos que caem sobre os vinhos importados, excluindo-se os do Mercosul, este imposto, segundo os “gênios” que o defendem, fariam o consumidor migrar do vinho importado para o vinho nacional. Ledo engano, além de estúpida convicção. Alguns produtores brasileiros ainda julgam que o Brasil é um imenso cartório, e antes de serem competitivos e criadores buscam na proteção do Estado uma desculpa para suas incompetências”. Veja mais.
A excelente Deise Novakoski lembrou recentemente na sua coluna que “estamos em tempo de nota fiscal eletrônica, do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), dos medidores de vazão e de outros mecanismos modernos de combate à sonegação; Não há razão plausível que justifique a ressurreição de selagem, concordam?”
Mas acontece que a lei da selagem foi aprovada com 13 votos favoráveis e apenas dois contra. Aprovada pelos produtores. A colunista lembra que o enólogo Luiz Henrique Zanini disponibilizou o endereço uvifam@hotmail.com para todos os que gostam ou estão envolvidos com o vinho, de consumidores, a produtores, importadores e revendedores possam se manifestar. Nossos próprios produtores deram um tiro no pé. (Leia mais: “Vinho no país da burocracia”, Rio Show, O Globo, 16 de julho de 2010).

14.8.10

Ozzy e o elefante na sala

Estava muito bêbado, como sempre, quando sua mulher e empresária o deixou no quarto de um hotel e sem roupas, para que não saísse. Mas ele vestiu um dos vestidos dela e se perdeu pelas ruas de San Antonio, Texas, com uma garrafa de Courvoisier. Aí, sentiu uma vontade intensa de urinar, sem idéia de onde eram os banheiros públicos. Precisava se aliviar, ali mesmo, naquele instante. Olhou em volta, encontrou uma esquina tranqüila e começou a urinar numa parede caindo aos pedaços.
Aí, ouviu uma voz atrás dele.
-- Você me dá nojo.
Voltou-se e viu um sujeito com chapéu de caubói.
-- Você é uma desgraça, sabe disso?
-- Minha namorada roubou minhas roupas – explicou. – O que mais eu devia vestir?
-- Não é o vestido, seu inglês veado. Essa parede que você está usando como banheiro é parte do Alamo.
Ozzy Osbourne foi imediatamente algemado e preso. Ele tinha mijado num dos principais monumentos históricos dos Estados Unidos. Imaginem alguém vandalizar a estátua do Cristo Redentor!
Ele até que tentou tirar a carteira de motorista; insistiu uma dezena de vezes, mas sempre acabava com o carro na grama ou desmaiava ao volante. Pois estava sempre bêbado. Resolveu o problema comprando um cavalo, meio de transporte que não compreendia exames (fora o fato de que, supostamente, o cavalo andava sempre sóbrio).
Fez xixi no copo de um empresário; nos hotéis era comum não conseguir chegar ao quarto, pois apagava nos corredores, impedindo a passagem. Escondia “tortas” de haxixe e, depois, não conseguia lembrar-se onde as havia colocado. O resultado é que um pouco dessa erva foi oferecida, por engano, como bolo a um pastor. Que ficou zureta por uma semana. O mesmo aconteceu com seu cachorro, que não parou de correr por dias.
Sim, é verdade que comeu a cabeça de um morcego em pleno palco. Só que pensava que era um morcego de plástico, normalmente usado para encenações. Acontece que jogaram um de verdade no palco, ele pegou e com a boca retirou-lhe a cabeça.
A primeira coisa que perguntou ao entrar no famoso centro de reabilitação Betty Ford foi onde era o bar. Até mesmo tentou matar sua mulher, mãe de três dos seus filhos, empresária, grande arquiteta e incentivadora de sua carreira. Não é de espantar, pois fora carreiras de cocaína, maconha, haxixe, bolinhas, gim, uísque, canecas e mais canecas de cerveja e quatro garrafas de Hennessy diárias, ainda fumava trinta charutos por dia, sem contar os inúmeros maços de cigarro. Todos os dias, nos últimos 40 anos, ele misturava tudo isso e mandava. É de espantar que tenha sido um grande nome no mundo pop, que ainda seja muito popular e seus discos e shows continuem fazendo sucesso, vendendo muito. É de espantar que continue vivo.
Acabei de ler “Eu sou Ozzy”, autobiografia de Ozzy Osbourne, um dos nomes mais importantes do rock, um dos criadores da famosa banda Black Sabbath, personalidade alucinada, talentosa, mas com uma longa história de abusos ligada às drogas e ao álcool. Nesses 40 anos de história, contudo, não falta humor, candura e amor. Ele “inventou” o heavy metal e quase tudo na vida dele tem sido heavy.
E o que tem esse livro e a vida de John Osbourne a ver com vinhos (ou com as bebidas, em geral), temas constantes dessa coluna?
Olha, leitora, diante de mim está mais uma reportagem sobre os miraculosos efeitos do vinho para a saúde de seus bebedores. Desta vez, uma pesquisa inglesa afirma que o vinho e, de resto, as bebidas alcoólicas, reduzem não só o risco como a severidade das artrites – o que vale para pessoas que bebem mais de 10 dias por mês.
Outra matéria, desta vez sobre uma pesquisa norte-americana, informa que o resveratrol, componente químico existente nas cascas das uvas tintas, faz com que vivamos mais tempo, além de reduzir a diabetes tipo 2, doenças do coração,, inclusive ataques cardíacos.
Não estou duvidando das propriedades do vinho ou do álcool para a saúde. Afinal, muitas dessas pesquisas são comprovadas. Acontece que um consumidor menos atento pode ficar pensando que as bebidas alcoólicas podem nos transmitir superpoderes, habilidades sobre-humanas.
E uma das qualidades da história que Ozzy nos conta é que, se ele teve alguma habilidade sobre-humana, foi continuar vivo aos sessenta e tantos anos e ainda com alguma saúde. Para espanto de muitos médicos! E isso ele só conseguiu quando finalmente parou de drogar-se e de beber.
Ao divulgarmos matérias sobre saúde e bebidas, estamos potencialmente induzindo nossos leitores a beber, pois beber faria bem à saúde. Sabemos que uma parcela dos consumidores precisa apenas de uma ou duas desculpas para pisar na bola.
Mas não posso deixar de ver que sempre teremos um elefante na sala. As pessoas produzem, vendem, servem e bebem vinho porque o álcool que ele contém nos faz sentir bem. Claro, o vinho tem muitas outras qualidades. É gostoso, aromático, tem cores fabulosas, melhora o gosto das comidas, é peça fundamental em celebrações, fora o fato de ser uma sombra da humanidade, sempre presente em sua história. Muita gente acha, como eu, que o sucesso comercial do vinho está primariamente no seu conteúdo alcoólico. Só que parece que ninguém vê esse elefante. Sob esse aspecto, de sentirmo-nos bem, o vinho e as drogas não são muito diferentes. Não espanta que o governo da Califórnia utilize o sucesso da sua indústria vinícola (muitos empregos, grande faturamento) para legalizar, taxar e regular o consumo da maconha no estado.
O crítico deve sempre estabelecer um diálogo entre a criação e a recepção, entre a arte ou a manufatura sobre a qual escreve (vinhos, bebidas no caso) e a sociedade. Precisamos alertar para os elefantes à nossa volta.
Ozzy é disléxico, tem transtorno de déficit de atenção (hiperatividade), o que resultou num grande complexo de insegurança. Não aceitava fracasso, rejeição ou qualquer tipo de pressão. E passou a se automedicar com as bebidas e as drogas. Numa das clínicas de desintoxicação que freqüentou, conheceu um dentista que, para beber (sempre às escondidas) enchia o tanque de água do limpador de pára-brisa com gim em seu BMW. Desconectava o tubo de plástico do bocal do capô e o redirecionava para o painel. Para beber, bastava entrar no carro. E com a cuca cheia de gim, chegou uma vez ao consultório tão bêbado que acidentalmente fez um buraco na cabeça de um paciente. O dentista não tinha os problemas de Ozzy. Mas era um alcoólico.
Eu sou Ozzy é uma leitura divertida e instrutiva. Ozzy nos fala na primeira pessoa, como se estivéssemos batendo um papo, uma longa conversa que começa numa cidadezinha operária na Inglaterra, onde mal tinha para comer e acaba com Ozzy e família muito unidos, prósperos e felizes. Vamos saber um bocado sobre o mundo do rock and roll e muito sobre o elefante na sala que ninguém quer ver.
Da Adega
Degustação de tops chilenos
. É a sua chance de participar de uma degustação às cegas de cinco grandes rótulos chilenos. Revelo, porém quais as belezas que você provará sem conhecer os rótulos: Almaviva 2006, El Principal 2006, Don Melchor 2006, Caliterra Cenit 2006 e Caballo Loco N°11.
A degustação será harmonizada com queijos (brie, grana padano, reblochon, chabichou, Saint maure). Ao final, haverá um jantar especial. A promoção é da
Ville du Vin, um grupo que hoje conta com sete lojas, a maioria em São Paulo. Essa degustação de chilenos será realizada na sua unidade de Vila Nova Conceição, SP. Reservas pelo telefone (11) 3045-8137 ou pelo e-mail.
Australiano em bag in box. Já começam a proliferar por aqui as bag in box para vinhos. São embalagens tipo longa vida, mas como uma bexiga de plástico no interior que garante a conservação e o sabor do vinho inalterado por meses.
Agora, direto da Austrália, chega ao mercado o Stanley Shiraz Cabernet Sauvignon 2006. Mas numa caixa de 4 litros, a primeira a ser oferecida aqui. É um blend de 60% Cabernet e 40% Shiraz e 12,5% de volume alcoólico.
A novidade está sendo vendida pela
Boxer do Brasil, grande importadora de cervejas que agora está também de olho nos vinhos.

6.8.10

Fazer o quê?

Aceito ou não?
O sommelier passou com uma garrafa aberta, colocou-a no balcão do bar e chamou o maître (que, no caso, era também o dono do restaurante onde eu esperava por uma amiga).
O rosto denunciava aborrecimento e frustração. “Olha só, o cliente devolveu a garrafa só porque não gostou do vinho”. Conhecia todo mundo naquele restaurante, que ficava num ótimo ponto, próximo ao Museu Imperial, em Petrópolis. O sommelier, formado pela Associação Brasileira de Sommeliers, no Rio, já acumulava rica experiência tanto em lojas de vinho como em restaurantes. O dono era velho conhecido e assíduo cliente da minha loja, em Itaipava, onde todo o fim de semana levava pelo menos uma caixa de vinho.
Perguntei se ele ia ficar no prejuízo ou mandar devolver a garrafa. Antes de responder, provou um pouco do vinho. Nada de anormal: não estava oxidado nem contaminado com a tal da “doença da rolha”. Já falei sobre esse problema aqui: veja O saca-rolhas vai se aposentar.
O meu amigo, igualmente frustrado, perguntou-se: “Será que as pessoas pensam que eu sou uma loja, sou um Serviço de Atendimento ao Cliente? A garantia que dou está aqui (apontando as suas três geladeiras climatizadas); minha lista de vinhos não é grande, mas posso garantir a origem das garrafas. Esse vinho não tem defeito algum. Só porque o cliente não gostou dele? Ofereço outra e fico no prejuízo? E se ele comprasse uma lâmina de barbear, levasse para a casa, usasse e não gostasse? Ia conseguir devolvê-la à loja, sem mais nem menos?”
O que você faria no lugar o maître, leitora?
Claro que se aquela garrafa tivesse os problemas citados acima, deveria realmente ser devolvida, sem questões. Aqui no Brasil, os restaurantes ficaram no prejuízo. Mas em alguns países, essa garrafa poderia ser devolvida ao importador ou à loja de onde o vinho foi comprado.
As coisas podem ficar mais esquisitas com relação às garrafas mais antigas, por exemplo, um vinho de 1988. Muitas coisas acontecem dentro da garrafa à medida que o vinho envelhece. Aromas de couro ou de cogumelos são comuns, mas a maioria das pessoas os estranha, pois está mais acostumada com vinhos jovens, de safras recentes (pelo menos, 90% dos vinhos consumidos). E cabe ao sommelier explicar que o vinho se transforma na garrafa à medida que envelhece. E que essa transformação pode representar na verdade uma mudança na qualidade do vinho. Quando o vinho é bom, ele ganhará novos aromas, novos sabores, adquire qualidades que a maioria dos consumidores desconhece. Outros, simplesmente, perderão o que tinham de frutado, ficam demasiadamente macios, frágeis mesmo: esgotam-se, acabam “cansados”.
Uma garrafa, como a que foi recusada, nem sempre pode ser reutilizada. Talvez, possa ser vendida na base da taça, no caso dos restaurantes que também servem vinhos dessa maneira. Quando se trata de um vinho mais antigo, fica difícil servi-lo na base da taça, pois se oxida muito rapidamente.
O tal cliente reclamão solicitou do sommelier uma aventura, experimentar “algo novo”. E o profissional foi correto em escolher um vinho artesanal, feito de modo não convencional, completamente diferente do que o grosso da indústria oferece - logo, diverso do que a maioria das pessoas costuma consumir. O cliente estranhou e recusou-se a continuar naquela “aventura” (que ele mesmo havia solicitado). Os bons sommeliers costumam deixar bem claro que vinhos como esses poderão parecer estranhos às papilas gustativas dos clientes.
Mas eles adoram quando o salão está cheio de gente interessada em experimentar novidades.
Por isso, não entendo quando a maioria dos clientes dá carta branca aos chefs para criar seus pratos, da maneira que quiserem. Estão sempre prontos a experimentá-los, sem reclamações (e a pagar preços salgadíssimos por eles). Contudo, mostram-se limitados na escolha de vinhos. Se o cliente for assim, pobre de espírito, não deveria desejar “aventuras”. Que fosse honesto com o sommelier.
Aliás, os preços das bebidas e os dos vinhos em particular são sempre uma dificuldade no negócio de restauração. As margens costumam ser pequenas e cada centavo conta. E a maioria das queixas sobre os restaurantes, que eu saiba, recai sobre os vinhos – “sempre muito caros”. Mas considerando tudo, aluguéis, equipamento (taças etc.), salários (a começar o do sommelier), pode ter certeza de que não se faz muito dinheiro com o vinho. Os preços estão altos, sim, mas verifique o que o governo cobra de taxas, impostos etc. do importador ao atacadista. É desesperador.
No final, o nosso sommelier voltou com uma nova garrafa, aceita pelo cliente manhoso. Nas boas casas, o cliente sempre terá razão. E o vinho devolvido ficou comigo mesmo.
Era um Tempranillo Condessa de Leganza Reserva La Mancha 2002. Um tinto feito em La Mancha, a mesma região de onde sairá o vinho de Andres Iniesta, o meio-campista que fez o gol da vitória sobre a Holanda, sagrando campeã do mundo a Espanha. Esse vinho não tem muito de artesanal, mas vem de uma região muito pouco conhecida entre nós. Uma maravilhosa cor rubi, frutas como numa compota, madeira, cacau, longo na boca. Tempranilho é a mesma Aragonês em Portugal. Uma delícia que nos custou, a mim e à amiga que estava esperando, umas 40 pratas, com um desconto, pois o vinho já estava aberto e já fora experimentado. Mesmo assim, uma senhora barganha. Salvei a casa e minhas papilas aplaudiram. E acho que o Iniesta vai marcar mais gols com seu novo vinho. Fazer o quê? Craque é craque.
Da Adega
Premium em meias garrafas
. A Casa Valduga acaba de lançar novas garrafas de Cabernet Sauvignon e Chardonnay em garrafas de 375 mm. Ideais para quem bebe sozinho ou em mesas onde se disputam carnes e peixes. Agora, o mercado conta com o Premium Cabernet Sauvignon 2007 e o Premium Chardonnay 2010 nessas garrafinhas – que custam metade da garrafa de 750 ml. Saiba mais no site da
Casa Valduga.
Para o Papai. Cerveja Bauhaus, 600 ml. É uma lager e é Premium, pois é ouro-malte (poucas são feitas assim no Brasil). E é mineiríssima, terra do ouro. A promoção é da
Vinis.

30.7.10

Veneno e contraveneno

O TAMANHO DAS TAÇAS. Poderia ser também o tamanho da sobriedade. Há algum tempo, os bares ingleses inventaram de servir vinho em taças de tamanhos fora do padrão, bem maiores, o que levou a protestos pelas autoridades da saúde. Com os vinhos com maior teor alcoólico, beber “apenas” uma taça poderia resultar em problemas.
A Riedel, o mais famoso fabricantes de taças do mundo, oferece algumas taças com capacidade de até 621 ml. Certo: não vamos enchê-las até a boca; até a metade é o suficiente (e prudente). Mas 306 ml é uma grande quantidade, quase metade de uma garrafa de vinho.
Mas agora inventaram uma taça ainda maior, gigantesca, com a capacidade para todos aqueles 750 ml. VEJA AQUI, não só a taça como o vídeo. A novidade custa 12,99 dólares e está à venda na Kotula, uma rede de lojas de presentes e engenhocas espalhadas pelos Estados Unidos.
A propaganda da Kotula diz que a enorme taça “é a coisa mais apropriada para uma noite aconchegante”. Agora, quem jurar ter bebido apenas “uma” taça, poderá estar falando a verdade ou fazer o bafômetro explodir e ir em cana (sem duplo sentido).
RESSACA. Depois de uma taça dessas, prepare-se para uma ressaca. Fala-se que um dos remédios é curá-la é com seu próprio veneno, o álcool. Em inglês, existe uma expressão coloquial que explica esse tipo de “tratamento”: hair of the dog, literalmente, “pelo do cachorro”. Isso porque nos tempos de Shakespeare, se uma pessoa fosse mordida por um cão raivoso, hidrófobo, o remédio era colocar um pouco do pelo daquele cão na ferida. Daí que, para ressacas, o “pelo do cachorro” virou metáfora para o remédio da manhã seguinte à bebedeira: um pouco mais de álcool. Claro que não cura, nem da ferida, da hidrofobia ou do porre. Em alguns casos, contudo, pode ajudar.
Tais remédios têm o cativante formato de drinques muito saborosos (revigorantes, alguns), tidos como próprios para ressacas. Vamos a alguns deles:
BLOODY MARY. É um clássico. Primeiro, os ingredientes: vodka ou gim (uma dose ou 30 ml), 150 ml de suco de tomate, um pouco de sal de aipo (sal de mesa misturado com grãos de aipo secos e moídos, utilizado para dar melhor sabor aos grelhados de peixes, carnes, caldos e bloody marys), um salpico de tabasco, outro tanto de pimenta do reino preta, umas cinco gotas de molho inglês, um tantinho de raiz-forte (muita gente prefere usar wasabi ou mostarda preta: uma colher de chá) e uma colher de chá de suco de limão.
Num copo alto, coloque a vodca (ou gim ou tequila) e gelo à vontade. Depois vá colocando os demais ingredientes listados acima. Decore com talos de aipo. É o drinque da manhã seguinte, alimenta e ajuda a dissipar o nevoeiro. Estou sempre preparando um para mim, mas não preciso de ressacas para tomá-los.
SUCO DE PICLES. Pois não é que na Rússia e na Polônia a turma da ressaca prefere suco de picles como “pelo do cachorro”. Suco de picles nada mais é do que aquela salmoura que conserva pepinos, cebolinhas, couves-flor, os produtos mais utilizados como picles.
Acontece que a salmoura daqueles potes é constituída de água, sal, vinagre (ácido acético) e cloreto de cálcio. Funciona como um poderoso isotônico. Já li notícias que essa salmoura foi a “arma secreta” de times de futebol americano, jogando sob um sol de lascar. Garantem que esse suco pode evitar câimbra em atletas. Um fabricante de picles, a norte-americana Golden Pickle, oferece inclusive um isotônico, o “”Pickle Juice Sport”, afirmando que ele possui 15 vezes mais eletrólitos que o Gatorade.
O melhor é beber logo a salmoura e depois comer os picles. E deixar de namorar por umas doze horas.
ME LEVANTA. O título é criação minha; o original é “Harry’s Pick-Me-Up”. Como eu não conheço o Harry e copiei a receita de um livro emprestado (“The Savoy Cocktail Club”), fiquei com esse mesmo, pois é considerado um energizador clássico. Um “levanta defunto”, como dizemos aqui.
Leva dose e meia de conhaque (a marca você escolhe), meia dose de grenadina (normalmente, um xarope de romã, mas pode usar também xarope ou licor de groselha, de framboesa e até mesmo xarope de açúcar); uma colher de sobremesa de limão. Misture tudo num copo alto. Complete com um espumante.
OSTRA DA PRADO. Outra tradução literal de “Prairie Oyster”, outro drinque tradicional para as conseqüências de um porre. Um ovo, uma colher de chá de molho inglês, sal, pimenta do reino e tabasco.
Quebre o ovo e reserve a gema. Junte o milho inglês, o sal a pimenta e o tabasco num copo comum. Beba de um gole só.
Dá bons resultados? Bem, funcionou para James Bond em Thunderball (007 Contra a Chantagem Atômica).
Tamanho não é documento, todo mundo sabe. E o melhor para a ressaca é beber moderadamente. Mas alguns dos remédios acima funcionam muito bem, ora como um aperitivo, ora como um restaurador de forças.
Da Adega
Delícias suíças
. A L’Orangerie, casa de vinhos em Laranjeiras, Rio, está programando uma noite de degustação de delícias suíças – agora mesmo, 4ª. feira, dia 4 de agosto. A noite inclui entrada de batatas assadas ao molho de cebolas, pimentão e gruyere com bouquets de brócolis, devidamente acompanhadas pelo Johannisberg de Chamoson e pelo Petit Arvine du Valais. Haverá mais vinhos para degustar, como o Pinot Noir du Valais e o Domaine Eveche du Valais. No jantar, um Syrah du Valais acompanhará torta de cebolas à moda Schaffhausen, com desfiado de carne e mini legumes. Na sobremesa, um suflê de morangos, um Marsanne Valais. A casa fica na Rua General Glicério, 364. Visite o seu
site.
Prazeres da Mesa em Fortaleza. A segunda edição desse grande evento gastronômico ainda está em Recife, mas se prepara para desembarcar em Fortaleza, onde fica nos dias 4 e 5, no SENAC daquela capital. Na programação, debates sobre a “Identidade da Cozinha Cearense”, aulas de cozinha, confeitaria, panificação e etiqueta, além de degustação de comes e bebes (vinhos em particular). Os restaurantes mais importantes da cidade vão participar.
Saiba mais sobre tudo o que acontecerá em Fortaleza no
site da revista.

25.7.10

Pais e vinhos

A coluna de hoje está um verdadeiro patchwork, emendando dicas que só têm em comum o vinho, mas todas para o Dia dos Pais. Vamos começar com um presente criado por uma especialista em bonecas e utensílios de pano, mestre em retalhos.
Dia dos Pais: 1)Porta-vinho. Quem sabe, seu pai vai gostar de substituir as frágeis sacolas de plástico por um porta-vinhos de pano, acolchoado, mais seguro e elegante? Veja só a criação da Bonecaria Mandú. Se tiver dificuldades em acessar, fale com a própria dona e criadora da bonecaria, a Sueli Mandú, através de e-mail. O atelier fica em Osasco, São Paulo.
Dia dos Pais: 2) Beber sem derramar. Vi a foto de um prato de madeira, com um recorte para colocação de uma taça de vinho. Ou seja: nosso convidado pode comer de pé, que a taça copo fica segura, basta colocá-la nessa abertura do prato: suas haste e base ficarão para baixo e apenas o corpo aparecerá na superfície do prato. E assim evitamos que o vinho seja derramado, manche roupas e tapetes. Tenho uma coleção de seis pratos de madeira, originalmente comprados para queijos. Mandei fazer os recortes num carpinteiro aqui perto (uns 10 cm da borda para o centro do prato e uns três cm de largura) e rapidinho fiquei com pratos próprios para coquetéis. Neles, coloco salgados, queijos, torradas etc. e as taças de vinho, claro. Quem quiser comer sentada (e tiver lugar) é só retirar o copo do entalhe e colocar na mesa. Papai vai achar esperto.
Dia dos Pais: 3) iPhone e vinhos. Seu pai gostaria de se atualizar e ter um smartphone – e, além disso, adora os vinhos, mas não consegue pronunciar Trockenbeerenauslese ou qualquer daqueles nomes de regiões e uvas, tão complicados. Então, a dica é comprar um iPhone e, com ele, um programinha que ensina a articular corretamente mais de 200 termos especializados, de regiões, cepas e vinhos franceses, alemães e italianos. Veja só o que é o Enotria Guide. Custa só 3 dólares. Vai ajudar a você não mais apontar para o cardápio para informar o vinho que deseja.
Dia dos Pais: 4) Flores e vinhos. Você pode também transformar a já corriqueira garrafa de vinho que sempre oferece no Dia dos Pais num presente surpreendente, inesquecível. Que ta combinar uma cesta de flores com um vinho. Temos aqui exemplos de combinam os aromas das flores com o do vinho.

Primeiro arranjo: madressilva, jasmim, rosas vermelhas e ainda
um tanto de tomilho para embelezar ainda mais a cesta.
A madressilva e o jasmim nos trazem aromas florais e de pêssego. O vinho para combinar seria um argentino com a uva branca Torrontés. Dica: Crios de Susana Balbo Torrontès 2009. Encontrei esse vinho, há tempos, no Alipão Vinhos e Cia, em Botafogo.
Veja aqui. A Susana Balbo é enóloga e renomada produtora argentina. Visite o seu site.
Se quiser acrescentar um prato especial para o dia, tente um camarão levemente refogado (sautée), com molho de laranja, suco de limão, uma colher de sopa de azeite e tempero a gosto (sal, alho e pimenta do reino).

Segundo arranjo: ranúnculo, dálias, a linda scabiosa, violetas, folhas de manjericão e de orégano – tudo isso num jarro médio ou numa taça grande de vinho. Os aromas mais predominantes serão de violetas, cereja e morangos (ou, em resumo, de frutinhas vermelhas). É uma soma de aromas que aproximam o arranjo de um Pinot Noir jovem (seus aromas típicos são de frutas vermelhas). Os bons Pinot não são fáceis de encontrar, mas você pode pesquisar os da Borgonha (os melhores, mas caros) ou tentar os bons exemplares espanhóis, portugueses, italianos, norte-americanos (principalmente os do Oregon), chilenos e neozelandeses.
Uma combinação clássica é pato ao molho de amoras.

Ingredientes: uma xícara de amoras, uma cebola roxa das grandes, picada; meia taça de vinho tinto (use o mesmo ou de mesma qualidade do presenteado), duas colheres das de chá de azeite, 4 peitos de pato com pele, sal e pimenta do reino à vontade, meio copo de água, 2 colheres de mel, 3 colheres das de sopa de manteiga, uma colher das de chá de tomilho. Ponha a panela no fogo. Coloque as amoras e as amasse. Em seguida, acrescente as cebolas, o vinho tinto e o azeite. Junte os filés de pato com a pele virada para baixo; espere selar e em seguida desvire os filés. Reserve os filés no molho por 30 minutos, pós o que seque-os e tempere com sal e pimenta, deixando-os numa frigideira grande, virados com a pele para baixo. Cozinhe (fogo alto) por um minuto. Reduza para fogo baixo e cozinhe até que a pele fique bem tostada (uns 6 minutos). Vire os filés e cozinhe até que fiquem ao ponto (mais uns 3 minutos). Deixe descansar por uns 5 minutos.
Limpe a gordura da frigideira e acrescente os filés e junte mais meia taça de vinho. Ferva até que o molho fique reduzido pela metade. Acrescente o que sobrou do molho e cozinhe em fogo moderado. Coloque os filés numa caçarola, livre-se do molho, e acrescente mel e manteiga, tomilho e sal e pimenta a gosto. Corte os filés em tiras diagonais e os transfira para os pratos. Decore com um pouco de vinho tinto em volta das tiras de filé e com o que sobrou de amoras. E pronto.


Feliz Dia dos Pais!
Da Adega
Caçarolas e cremes no inverno
. Mas se, afinal, você resolver convidar o velho para sair, não se esqueça do Festival de Caçarolas e Cremes do Cantaloup. Elas vão aquecer ainda mais o carinho que existe entre vocês. Experimente: tem a de lentilhas com paleta de cordeiro e foie gras, a de frutos do mar, o creme de ervilha com tempurá de salmão e gergelim, o creme de mandioquinha com camarão ao aroma de maracujá. Esse festival vai só até o dia 7 de agosto. Seu eu morasse em São Paulo, não perderia. Iria lá só para lembrar de meu querido pai.
O
Cantaloup fica na Manuel Guedes, 474, Itaim. Seu telefone é (11) 3078-3445.

15.7.10

A bebida do campeão

Da água ao Terere. Um jogador de futebol precisa de líquidos para suportar a verdadeira maratona que faz em campo. São nove quilômetros em média, distâncias que percorre correndo, pulando, driblando, cabeceando, dando carrinhos e bicicletas, trombando, caindo e levantando.
Bebem e comem carboidratos, de preferência para que recebam pelo menos umas cinco mil calorias por dia. Consomem, em condições normal, de 30 a 60 gramas de carboidratos por hora, durante um jogo de noventa minutes, de modo a retardar a fadiga muscular, reidratar-se e a melhorar o seu desempenho.
As políticas praticadas pelas Seleções variam. Ora as opções consideram água e isotônicos (tipo Gatorade, feita de água, sais minerais e carboidratos). Algumas seleções permitem uma ou duas taças de vinho às refeições. O Maradona falava que não só o vinho, mas outro tipo de conforto era permitido em seu time: as mulheres.
Mas, para mim, a seleção Paraguaia fez a diferença. Trouxe para a África do Sul o seu Terere, uma bebida nacional, mas também consumida e fartamente no Brasil e na Argentina.
Trata-se da erva-mate, que o gaúcho usa no seu chimarrão. Mas no Paraguai é consumida com água fria. Já era consumida pelos índios guaranis, antes da invasão espanhola e continua hoje como uma parte importante da cultura do país. E, claro, dos hábitos dos jogadores paraguaios.
É uma bebida muito popular, apesar de não ser alcoólica. E é estimulante (contém cafeína) e, assim, utilizada em lugar do café. O Terere tem ainda uma segunda e importantíssima qualidade. É uma bebida de confraternização. Os paraguaios costumam levar garrafas térmicas (para a água), cuias (como as do chimarrão) e a erva mate. Colocam a era na cuia, juntam água e através de uma “bomba’ (um canudo metálico) a bebem, fazendo passar a cuia para um amigo ou conhecido que esteja próximo. A prática é a mesma no sul brasileiro e na Argentina. É considerada não apenas refrescante, mas também um remédio, bom para dores de cabeça e diarréias.
E foi assim que a seleção paraguaia se hidratou e refrescou na África do Sul.
Andres Iniesta e o vinho. Autor do gol que deu à Espanha o título de campeã mundial de futebol, melhor jogador em campo segundo a FIFA, o meio-campista Andres Iniesta, 26 anos, está perto de conseguir mais um título: o de maior produtor de vinhos finos da região de Castilla La Mancha, onde está investindo nove milhões de euros em vinhedos e numa vinícola, a Bodega Iniesta, na sua cidade natal, Fuentealbilla.
Iniesta saiu de lá muito cedo, aos 13 anos, quando ingressou na escolinha de futebol do Barcelona. De lá pra cá, transformou-se num dos mais técnicos jogadores de futebol do mundo e ajudou o time catalão a ser o primeiro na Liga dos Campeões e no campeonato europeu.
Fuentealbilla tem apenas dois mil habitantes, metade dos quais trabalha na cooperativa de vinhos da cidade. Porém, não se utiliza da tecnologia que Iniesta vai adotar sua vinícola, a Bodega Iniesta, quando estiver pronta. Castilla La Mancha, na região central do país, produz cerca de metade de todo o vinho espanhol. E é o vinho que liga o craque à sua terra natal.
Se Dom Quixote, o protagonista de Cervantes, o fidalgo que perdeu a razão por ler tantos romances de cavalaria, lutava contra moinhos de vento pensando que fossem gigantes, Iniesta sabe que terá de lutar contra a fama e a qualidade dos vinhos da região de La Rioja, gigantes de verdade. O jogador-vinicultor é muito competitivo, como vimos em campo, e está se preparando para esse jogo que não durará uma ou duas horas.
O Sancho Pança de Iniesta é o seu pai. É ele quem cuida dos investimentos de seu filho. A vinícola, quando pronta, deverá produzir 700 mil garrafas de vinhos tinto, branco e rosé por ano. A produção começará já em setembro. Iniesta pretende, já de início, exportar parte de seu vinho para a Inglaterra e Alemanha, onde poderá ser vendido em restaurantes por 40 euros a garrafa.
“Isto aqui é a Liga dos Campeões”, diz ele, comparando o negócio de vinhos com a principal competição do futebol europeu. “Se você não produz o melhor vinho, está morto”, completa.
Ele está certo: a justa fama de grande jogador e de campeão do mundo de seu filho tem de ser aproveitada, uma reputação que certamente ajudará nas vendas, embora saiba que esperará décadas para que o rótulo da sua bodega se estabeleça num mercado apinhado de ofertas.
Ao investir nove milhões de euros no negócio do vinho, Iniesta era simplesmente o meio-de-campo do Barcelona, uma senhor craque, não resta dúvida. Ele não esperou a Copa para abrir o bolso.
De qualquer modo, ser campeão mundial, o homem que fez o gol da vitória da Espanha, será um excelente negócio. Mas ele sabe que será melhor ainda para seus netos.